segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Um miserável

Apanhou uma gripe danada. Contorcia-se nos acessos de tosse. E ela própria chamava o marido:

— Vem cá, Belmiro, vem cá.

Ele largava o jornal e vinha. A mulher pedia:

— Escuta só.

E, de fato, os brônquios de Zuleica só faltavam assoviar. Ela própria, no fim de cada crise, gemia:

— Acho que apanhei algum golpe de ar.

E Belmiro:

— Vou te levar ao médico.

— Médico pra quê, homem de Deus? Sossega!

Tinha pavor de médicos, acusava-os de exploradores e dizia a todo mundo: “O meu dinheiro é que eles não levam!”. Argumentava, fazia contas. Belmiro ganhava pouco, uma miséria; e o dinheiro que ela fazia com a costura não dava para nada. Discutia com o marido e era irredutível:

— Imagine se a gente for gastar dinheiro com médico e remédio.

Mas a gripe não a largava. Estava com febre há uma porção de dias, a respiração curta e suores frios noturnos. O pior de tudo, porém, era a tosse, que estalava os pulmões e a asfixiava. Parecia até coqueluche. Tentou um xarope, que lhe recomen¬daram. Não sentiu, porém, melhora nenhuma. De noite, acordava e sentava-se na cama para tossir. No seu desespero, chorava:

— Eu morro, meu Deus do céu! Morro!

O PULMÃO

Houve quem sugerisse:

— Por que a senhora não tira uma radiografia?

— E o dinheiro, criatura?

— Tire daquelas pequenininhas!

Zuleica era teimosa, sempre fora teimosa. Preferia morrer a entregar os pontos. Mas uma noite, depois de um acesso feroz, sentiu gosto de sangue na boca. Numa desconfiança, acendeu a luz, passou a língua no lençol e viu a saliva rósea no pano. Ela, que fingia não dar importância à doença, tachando-a de “resfriado bobo”, tomou-se de um medo súbito e selvagem. Lembrou-se de sua tia, irmã de sua mãe, que morrera doente do peito em Campos do Jordão. Sacudiu o marido, que dormia ao lado, aos gritos de:

— Sangue! Sangue!

Não dormiu mais, com a idéia fixa de tuberculose. E o gosto de sangue continuava. Já estava de lenço na cama. Qualquer coisinha, acendia a luz, e encostava a língua no lenço para ver a mancha cor-de-rosa. No dia seguinte, pela manhã, decidiu:

— Vamos ao doutor Borborema, agora mesmo.

O marido ainda fez a objeção:

— O doutor Borborema?! Aquele boboca? Mas ele é um errado, minha filha!

— Outro, não! Quero o doutor Borborema!

Belmiro, enfiando-se nos lençóis, fez o comentário:

— Amarra-se o burro à vontade do dono!

Ora, o dr. Borborema era um velhinho bastante gagá e de eficiência ultraproblemática. Não curava ninguém, o diabo do homem; e, sem dúvida, a sua maior virtude consistia nas caronas, o abatimento que conseguiam os clientes menos favorecidos. Dava consultas num consultório onde a imundície campeava íngreme; dizia-se até que foram encontrados, lá, não sei se escorpiões ou lacraias. No caminho, Belmiro, resmungando:

— Um zebu, esse doutor Borborema!

E ela, pirracenta:

— Deixa, não faz mal!

Dentro do consultório miserável, o velhinho forrou as costas de Zuleica com uma toalha e fez ausculta. Como um médico do tempo de Dom João Charuto, com o ouvido nas costas da doente, comandou:

— Diga trinta e três.

E ela:

— Trinta e três.

— Agora tussa.

Tossiu várias vezes. E a tosse provocada acabou se tornando involuntária e irresistível; contorcia-se, esteve em risco de se asfixiar. Na parede estava emoldurado o seguinte dístico: “Enquanto no doente há vida, há esperança”. Belmiro, impressionado, perguntou:

— Então, doutor?

O velhinho já estava redigindo a receita, com a sua caneta-tinteiro. Sem deixar de escrever, deu sua opinião:

— Isso passa! Isso passa!

Belmiro, com a pulga atrás da orelha, insistiu:

— Nada no pulmão?

— Nada.

E o rapaz:

— O senhor me tirou um peso, doutor.

O médico ainda veio levá-los até a porta. Além de não cobrar nada, ou cobrar pouco, era gentil, educadíssimo.

Com uma dentadura dupla, móvel, ele a deslocava continuamente, a título de distração e vício.

A TRAGÉDIA

Zuleica voltou pior. E agora era ela quem, numa reviravolta inexplicável, malhava o dr. Borborema:

— Um burro! Não entende nada!

— Não foi você quem escolheu, ora essa?

E a moça, cravando as unhas no braço do marido:

— Eu vou morrer, Belmiro! Vou morrer!

— Oh, deixa de bobagem! Morrer coisa nenhuma! Parece criança!

Mas ela se entregava de corpo e alma à idéia fixa. E isso era mais que um presságio, era uma convicção, uma certeza inapelável. Sentou-se na cadeira de balanço na sala, e lá ficou horas a fio, numa meditação sem fim.

Quando o marido falou em aviar a receita, opôs-se:

— Não quero!

— Não queres por quê? Tem cada uma!

Baixou a voz numa obsessão:

— Porque é jogar dinheiro fora. Porque eu sei que vou morrer...

Belmiro ainda ligou para uma novela, que ambos ouviam. Ela, na sua tristeza de condenada, pensou que não poderia seguir as novelas, que escutava em horas diferentes. Nessa noite, não conseguiu dormir. Primeiro, por causa da tosse amaldiçoada; depois, porque queria pensar muito nesse mundo, que em breve ia deixar. E, na vigília, imaginou várias coisas, inclusive o próprio enterro. Queria que fosse muito bonito, de maneira a impressionar a rua inteira, sobretudo uma vizinha com quem se indispusera. Pena que os enterros modernos não fossem como os antigos, em que os carros fúnebres eram puxados por cavalos brancos empenachados. Súbito, ocorreu-lhe o problema: — e o dinheiro? Onde, como e quando Belmiro poderia conseguir o dinheiro para o enterro de luxo? Até o sol raiar, ela não pensou senão nos meios de que ele poderia lançar mão para os funerais. Queria que eles fossem espetaculares o bastante para humilhar a tal vizinha. E tanto pensou que, descobrindo uma solução, acordou Belmiro. Ele, com um sono danado, virou-se, agressivo, malcriado. Mas quando a ouviu falar em morte, controlou-se. Então, doce, persuasiva, Zuleica disse-lhe que queria um enterro bonito. Mas como sabia que ele não tinha dinheiro, ela sugeria que recorresse a Humberto. O marido pulou da cama:

— Mas eu nem conheço esse cara! Um sujeito metido a besta, só porque tem dinheiro!

E ela:

— Quando ele souber que é para mim, que é para meu enterro, te dá, Belmiro, paga tudo! Te juro pela minha salvação!

Só então Belmiro teve a suspeita:

— Mas vem cá! Dá dinheiro por quê? Hein? Por quê? O que que esse palhaço é teu?

Não sei se Zuleica diria ou não. Mas quando ia abrir a boca teve uma violentíssima hemoptise. Diante do sangue, que vinha em golfadas medonhas, dissolveram-se os ciúmes de Belmiro. Ele gritou; acudiram os vizinhos. Deram injeção, cálcio, puseram saco de gelo, mas quem disse que o sangue estancava? Nas hemoptises sucessivas, Zuleica só pensava na vizinha antipática e, mais do que nunca, desejou deslumbrá-la com um grande enterro. Olhava para o marido como se dissesse: “Quero um enterro de luxo!”. Se pudesse falar teria ampliado seu pedido para uma missa de sétimo dia, com violino, canto e não sei quantos coroinhas. Acabou não resistindo; fez um esforço supremo e sussurrou:

— Um enterro... bonito... missa, missa e...

Já suas unhas estavam roxas, e esse esforço a matou mais depressa. Diante da morte, Belmiro caiu numa crise violentíssima e teve que ser arrastado à força do quarto. Meia hora depois, na sala, enquanto cá no quarto se vestia a morta, ele pensava em Humberto. Era evidente que... Um vizinho interrompeu o curso de suas reflexões oferecendo-se para tratar do enterro. Sobressaltou-se:

— Obrigado, fulano. Mas eu mesmo trato disso.

OS FUNERAIS

Foi bem estranho o que aconteceu. Humberto, que Belmiro mal conhecia de vista, recebeu-o com certo espanto e, pelo que o outro pôde deduzir, com certo pânico. Ao receber, porém, a notícia da morte da Zuleica, teve, ali mesmo, na frente do marido espantado, quase que uma crise de loucura. E dizia com eloqüência justamente:

— Coitadinha! Coitadinha!

Ainda chorava quando soube dos últimos desejos da morta: o enterro caro e a missa.

Declarou que fazia questão de arcar com todas as despesas. Belmiro, com o máximo de discrição, disse:

— Vou saber quanto é, e volto já.

Na Santa Casa, a seu pedido, deram o orçamento de dois enterros: o mais caro e o mais barato. O primeiro fazia um total de quinze contos. Belmiro encomendou o mais barato, com grande espanto do agente funerário. Voltou ao escritório de Humberto, de quem recebeu os quinze contos e mais três para a compra de uma coroa monumental. No dia seguinte pela manhã saía, da casa de Belmiro, o coche fúnebre, quase de indigente. A vizinha, que não se dava com Zuleica, estava na janela quando passou o enterro. Na volta do cemitério, o viúvo já pensava na missa. Felizmente, Humberto não aparecera, por naturais escrúpulos. E, assim, Belmiro pôde procurá-lo, dias após, no escritório. Trouxe dinheiro para uma missa com três padres, cinco coroinhas, canto, violino etc. etc.
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A coroa de orquídeas e outros contos de A vida como ela é... / Nelson Rodrigues; seleção de Ruy Castro. — São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
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domingo, 18 de setembro de 2011

O Diabo

Guardo na memória essa tarde como nenhuma outra. Acredito ser a única que o tempo não conseguiu apagar. A única recordação igual ao fato.

Ele me vinha seguindo há muito tempo e eu nunca fugi dele. Estava mais ansioso de falar-me que eu de ouvi-lo.

Esse dia apresentou-se soberano, vermelho. Surpreendeu-me à saída de casa, dizendo:

- Não olhe para trás, siga caminhando como se nada houvesse acontecido. Somente você pode ver-me e perceberá que os outros vêem seus gestos, não os meus. Chegou o grande dia e aqui estou para levá-lo.

- Pensei que fôssemos discuti-lo antes - murmurei com dissimulação - necessito mais tempo.

- O prazo vence com o pôr-do-sol. Serei sua sombra nesta última hora.

- Você decidirá.

- Isso significa que posso não aceitar?

- Sim, - soltou uma gargalhada escura, cavernosa - mas terá que suportar as conseqüências...

- Você não me dá opção. Confesso não entender por que me escolheu, logo eu, um homem comum, normal...

- De maneira alguma - interrompeu, - você é o escolhido perfeito para ser meu sucessor do novo século.

- Sou sua antítese. Que tem isso de perfeito para você?

- Não se faça de espertalhão tratando de ganhar tempo. Reconheço que sua resistência é um dos aspectos que o faz mais interessante. Veja, vou conceder-lhe esses últimos minutos, mas não esgote minha paciência. Venha, ali há um banco, bem embaixo dessa árvore.

A capa vermelha sibilou no ar e apontou o banco da praça solitária. Um gesto teatral e mordaz que desprezei do fundo dessa estranha tranqüilidade que me invadia. A pequena trégua fortalecia minha oposição.

Acomodou-se, abrindo os braços em cruz sobre o espaldar, com ar de quem quer abarcar o mundo. Tratei de sentar-me no outro extremo, como se isso me afastasse de seu alcance.

- Observa o entardecer, - continuou - essas nuvens sangrentas, vá acostumando-se a sua paisagem futura, às eternas chamas de meu reino?

- Não o imaginava poeta,você tem algo de sensibilidade...

- Não tente ser irônico, sabe que sou imune a essas alfinetadas.

- Como eu às suas...

- Esse é o ponto! Um ser humano incorruptível, o maior atrativo ante meus olhos. Você é meu desafio. O formidável domínio que tem sobre sua consciência, a firme resistência a minhas influências, como não haveria de escolhê-lo?

- Isso é contraditório. Posso fazer de seu inferno um paraíso.

- Que não perca a onipotência, não sabe o que diz. Uma vez que me substituir você será completamente eu. Pensará e agirá como eu, reinará no inferno e na terra, gozará da tortura sobre mortos e vivos, encarregar-se-á da perdição de todo habitante do planeta. Esse há de ser seu destino durante um século completo, ao fim do qual escolherá seu sucessor. Sempre foi assim e sempre continuará sendo.

- A menos que me negue...

- Cabeça dura...Quando se convencerá que sou absolutamente necessário para o mundo? Pensa um pouco: sem o mal, que seria do bem? Sem a feiúra, existiria a beleza? Que sentido teriam a lealdade, a humildade, a sinceridade e toda esse moralismo sem a presença da traição, a altivez, a mentira, tudo enfim que eu represento? Pode olhá-lo deste modo. Estou oferecendo-lhe o reinado do equilíbrio, nada menos!...

- Um falso equilíbrio, dirá você. Sempre soube fazer bem seu trabalho, inclinando a balança para a sua conveniência.

- Porque sou inteligente e sagaz quando se trata de meu dever. Igual a você.
Esboçou um sorriso em meia lua, enorme e salivoso como um talho de melancia.

- Você esqueceu de acrescentar sem escrúpulos, diferentemente de mim - acrescentei mais pesaroso que temeroso - você ameaçou-me com a morte em suas formas mais horríveis e todos haveremos de morrer um dia, ignoramos se será contemplando um entardecer como este ou despedaçados sob a metralhadora da guerra, se nos iremos apagando de velhice ou carcomidos pela doença mais atroz. Não compreendo que perco negando-me.

Pela primeira vez me encorajava a enfrentá-lo. Minha atitude o exasperava, os olhos eram duas brasas, o semblante um sulco escuro e feroz. Mostrou os dentes:
- Talvez isto ajude sua decisão...

Bastou aquele seu gesto no ar e uma dor aguda instalou-se em minha nuca. Senti-me desvertebrado como um frango a quem torcem o pescoço. Quando meus olhos pareciam querer saltar das órbitas, a dor me abandonou de repente. Eu não havia deixado de olhá-lo.

- Como se atreve a desafiar-me fuzilou, furioso.

- Não tenho outra saída.

- Poderíamos fazer um pacto.

- Que você romperia sem dúvida. Jamais pactuaria com você.

- Agora é você que não me deixa opção.

Minha atitude exacerbou sua raiva e era óbvio que não teria piedade comigo. Iniciou então uma sessão de torturas infernais. Ignoro como consegui que se detivesse em cada uma de suas intenções, minha vista parecia perfurá-lo e ele renunciava à beira do fracasso. Contemplava-me atônito sem resignar-se à derrota.

- Ou talvez isto...ou isto - prosseguira.

O sol era apenas uma linha no poente. As primeiras sombras protegiam a cena da vista de possíveis curiosos. Veriam, surpresos, os movimentos epiléticos de um homem solitário revolvendo-se em um banco de madeira. A noite atiçava a paciência do diabo.
Foi quando apareceu esse gato vagabundo de aspecto mais que lamentável. De um salto trepou no banco miando sua fome e desamparo. Bastou esse instante de distração para que o demônio empalidecesse na penumbra. O tempo havia expirado. Acariciei o pelo do animal e, ao meu contacto, pareceu reluzir em negrura. Seus olhos, dois fusos amarelos, refulgiram e esfregou sua cabeça contra minha coxa.

- Vou chamá-lo Feri, - disse-lhe quase exausto ao tempo em que me erguia do assento, - não me engano, eu sei quem você é. Dependerá de mim o resto de meus dias, depois...só Deus sabe...

Da imagem vermelha não ficaram rastros.

Empreendi, manquitolando, o regresso à minha casa, o gato atrás de mim.

Passaram-se muitos anos desde essa tarde. Enquanto meu corpo se encurva e minha memória fraqueja, Feri parece cada dia mais jovem. A cada amigo que me visita devo mentir e dizer que, se bem conserva o nome, este felino enegrecido que dorme aos pés de minha cama é neto ou bisneto daquele Feri que recolhi na praça uma tarde que o tempo não conseguiu apagar..
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Conto de Ileana Schnitzler
Tradução de Sérgio de Agostino
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Necronomicon

Breve, porém completo resumo da história deste livro, de seu autor, de diversas traduções e edições desde sua redação (no ano de 730) até os dias atuais.

Edição comemorativa a cargo de Wilson H. Shepherd, The Rebel Press, Oakman, Alabama.

O título original era “Al-Azif”. Azif era o termo utilizado pelos árabes para designar o ruído noturno (produzido pelos insetos) que, supunha-se, era o murmúrio dos demônios. Escrito por Abdul Al Hazred (figura acima), um poeta louco de Sana, fugido no Iêmen, na época dos califas Olmeias, pelo ano de 700.

Visita as ruínas da Babilônia, e os subterrâneos secretos de Mênfis, e passa dez anos sozinho no grande deserto que se estende ao sul da Arábia, o Roba el-Khaliyeh, o “Espaço vital” dos antigos e o Dahna, “O deserto Rubro” dos árabes modernos. Afirma-se que este deserto é habitado por espíritos malignos e por monstros tenebrosos. Os que afirmam haver penetrado em suas regiões contam coisas estranhas e sobrenaturais.

Durante os últimos anos de sua vida, Al Hazred viveu em Damasco, onde escreveu o “Necrononicon” (Al-Azif), por onde circulam terríveis e contraditórios boatos sobre a sua morte ou desaparecimento em 738. O seu biógrafo do Séc. XII, Ibn-Khalikan, conta que Al Hazred foi assassinado por um monstro invisível em pleno dia, sendo devorado na presença de um número expressivo de testemunhas aterrorizadas.

Contam-se ainda muitas coisas acerca de sua loucura. Ele alegava ter visto a famosa Ilrem, a Cidade dos Pilaree, e ter encontrado, sob as ruínas de uma cidade perdida do deserto, oos anais secretos de uma raça mais antiga que a humanidade. Ele não participava da fé mulçumana, pois adorava umas desconhecidas entidades chamadas Yog-Sothoth y Cthulhu.

No ano de 950, o “Azif”, que havia circulado secretamente entre os filósofos da época, foi ocultamente traduzido pelo grego Theodorus Philetas, de Constantinopla, sob o título “Necronomicon”. Durante um século, e por arte de sua influência, ocorreram certos fatos terríveis, razão pela qual o livro foi proibido e queimado pelo patriarca Michael. Desde então, não temos mais que vagas referências ao livro, mas em 1228, Olaus Wormius encontrou uma tradução para o latim que foi impressa duas vezes, sendo uma no Séc. XV, em letras negras (com toda segurança na Alemanha) e outra no Séc. XVII (provavelmente na Espanha).

Estas traduções não trazem qualquer esclarecimento, de tal forma que somente pela tipografia é que se supõe a data e o local de impressão. A obra, tanto em sua versão grega quanto na latina, foi proibida em 1232 pelo Papa Gregório IX, pouco depois que a tradução latina havia se convertido em um poderoso foco de atenção.

A edição árabe original se perdeu na época de Wormius, conforme foi dito no prefácio (há vagas alusões sobre a existência de uma cópia secreta encontrada em São Francisco, no início do século, mas que desapareceu no grande incêndio). Não há rastro da versão grega, impressa na Itália, entre 1500 e 1550, depois do incêndio ocorrido na biblioteca de uma certa personagem de Salem, em 1692.

Igualmente, existia uma tradução do doutor Dee, jamais impressa, baseada no manuscrito original. Os textos latinos ainda subsistem; um, (do Séc. XV) está guardado no Museu Britânico; outro (do Séc. XVII), se acha na Biblioteca Nacional de Paris. Uma edição do Séc. XVII encontra-se acautelada na biblioteca de Wiedener de Harvard e outra na Biblioteca da Universidade de Miskatonic, en Arkham; há mais uma na biblioteca da Universidade de Buenos Aires.

É possível que existam outras cópias mantidas em segredo; há rumores persistentes de que uma cópia do Séc. XV foi parar na coleção de um célebre milionário americano. Outro rumor assegura que uma cópia do texto grego do Séc. XVI é propriedade da família Pickman de Salem, mas é quase certo que esta cópia desapareceu, ao mesmo tempo que o artista R. U. Pickman, em 1926.

A obra está veementemente proibida pelas autoridades e por todas as organizações legais inglesas. Sua leitura pode atrair conseqüências nefastas. Acredita-se que R. W. Chambers se baseou neste livro em sua obra “O rei amarelo.”


Cronologia

-Al-Azif é escrito em Damasco en el 730, por Abdul Al-Hazred.
-Traducão grega com o l título de Necronomicón, por Theodorus Philetas, em 950.
-O patriarca Michael o proíbe no ano de 1050 (texto grego). O árabe se perdera.
-Em 1228, Olaus traduz o l texto grego para o latim.
-As edições latina e grega são destruídas por Gregório IX em 1232.
-Em 14... (?), aparece una edição em caracteres góticos na Alemanha.
-Em 15... (?), o texto grego é impresso na Itália.
-Em 16... (?), aparece a tradução espanhola do texto latino.

por H. P. Lovecraft
Tradução de J. Jaegger
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