Todos nós temos na vida / Um caso... / Uma loura... / Você, você
também tem. / Uma loura é um frasco de perfume / Que evapora... / É o
aroma.../ De uma pétala de flor. / Espuma fervilhante de champanhe /
Numa taça muito branca de cristal / É um sonho... / Um poema...
(Uma loura - samba-canção, 1951 - Hervé Cordovil - Intérprete: Dick Farney)
segunda-feira, 12 de maio de 2014
Espuma fervilhante de champanhe
De como Mirinho quebrou o galho
O abominável primo Altamirando tinha um encontro marcado com uma
pioneira social aí, dessas que prevaricam com certa regularidade. O
ignóbil parente conhecera a distinta dama do nosso “society” noutro dia,
quando o marido estava em São Paulo, fazendo um negócio imobiliário.
Com aquela conversa que lhe é peculiar, Mirinho trouxe a dama para o seu
plantel e vinha vivendo um romance legalzinho com ela.
Toda noite faziam programa juntos. Ora era uma dançadinha num dos
inferninhos da Zona Sul, ora era um jantar mais caprichado nesses
botecos de nome francês, ora era um discreto cineminha. Depois Mirinho
ia com ela pra casa dela, que a dama reside só com seu distraído marido
que, além de distraído, estava em São Paulo.
Não é pra me gambá não — como diz Ibrahim — mas o primo estava levando
um vidão; não somente porque a dona é boa às pampas, como também vinha
financiando os programas. Ora: mulher sem despesa é o ideal de Mirinho
Durante esses dias aí da crise, ele passou numa tranquilidade invejável.
Mas, eis que, ontem, o marido voltou. Mirinho telefonou na hora do
almoço, para ver se pegava a gordura de graça, mas a dona falou baixinho
ao telefone, com ar de conspiradora:
— Depois eu te falo, bem. Ele voltou — e desligou o aparelho.
A tarde, Mirinho tornou a ligar:
— Escuta, queridinha, eu te apanho aí às 7 e vamos jantar juntinhos, tá?
— Mas querido — ponderou ela — Eu não posso. Meu marido voltou.
— Ali isto não tem importância — garantiu o primo. — Ele vai dormir fora de casa.
A mulher deve ter arregalado os olhos do lado de lá da linha, porque perguntou, visivelmente intrigada:
— Como é que você sabe que ele vai dormir fora de casa?
— Nada não. É que eu telefonei para um cara meu cumpincha, que trabalha na Polícia, e disse pra ele que teu marido é comunista.
Fonte: Jornal "Última Hora", de 10/04/1964 — Coluna de Stanislaw Ponte Preta / Desenho: Jaguar.