terça-feira, 2 de agosto de 2011

Fauno de tapete

Não sei se já lhes contei de onde é que me veio essa expressão – fauno de tapete. Se não o fiz ainda, posso fazê-lo agora. E, no final, vocês verão que parece, ou melhor, é uma estória tirada das páginas da vida como ela é.

Eis o caso: - Eu tinha meus sete, oito anos e morávamos em Aldeia Campista, na rua Alegre, ao lado da farmácia. Foi numa tarde em que fazia um calor de rachar catedrais. Meu irmão – não recordo se o Mário ou o Milton – entra e vai despejando a novidade: numa vila próxima tinha acontecido um crime hediondo; a sobrinha de doze anos matara o tio que andava beirando os quarenta.

Tomou fôlego e acrescentou: estão dizendo que foi crime passional.

Houve uma nuvem de incredulidade entre os presentes. Meu irmão ignorou-a e continuou falando.

O tio, um pulha nato e vocacional, teria dito à sobrinha que era um vampiro, mas que a amava muito e tal e coisa. Assim, desde a mais tenra idade da criança ele insidiosamente a envolvia e conquistava com agrados, mimos e bom-bons.

Com que pertinácia, com que descaro seus olhos a buscavam obsessivamente. Depois de certo tempo deu de aparecer no quarto dela como se brotasse do breu da noite e das entranhas do silêncio. Aproximou-se, insinuou-se. Primeiro tocava-a quase que por acaso. E foi avançando. Sem pressa. Num dia beijou-a e já no outro, por dentro da camisa da pequena, com as costas da mão percorria o relevo do seio incipiente. Eram torpes carícias de mãos espertas e viajadas, no corpo e na pele diáfana da adolescente impúbere e ingênua. Em resumo, havia seduzido a sobrinha. Sussurrava-lhe aos ouvidos: - Sou louco por ti, sou louco por ti.

Vez por outra a menina pressentia o prêmio de um frívolo afeto nos olhos do tio a despertar-lhe a vaidade antes do desejo.

Como vocês podem ver, o biltre era, de fato, a flor da iniqüidade.

(Agora me lembro:- Era Milton mesmo quem contava o episódio.)

Eu bebia ávido cada sórdido detalhe daquela narrativa. A garota – só hoje e agora é que penso isso – é bem possível que a princípio recuasse crispada e indefesa na sua fragilidade infantil e que um belo dia, por fim, cedesse envergonhada num frêmito de lascívia.

Um pacto fora firmado nesse idílio bizarro entre a canalhice e a castidade. Ele havia dado a ela, já fazia um ano ou mais, uma estaca de pau. Juntos, todas as noites, se esmeravam em apontar e polir a estaca com a ajuda de um canivete. Meticulosa e silenciosamente a estaca se transformava num espeto afiadíssimo.

Repetira mil vezes para a sobrinha que a estaca era a única arma capaz de adormecer para sempre o vampiro que habitava dentro dele. Nenhuma outra arma, – e insistia, nenhuma –  poderia matar um vampiro. Só a estaca de madeira possuía esse dom, esse poder. Dissera-lhe que se um dia os lençóis traíssem o mais leve indício de sangue, o segredo deles estaria descoberto e ele teria que morrer. Ensaiava então cada pormenor dessa previsão funesta. Ensinava-lhe como empunhar a estaca e o local certo em que ela deveria penetrar-lhe o peito para atravessar o coração. O nível de minúcia tinha que ser total e absoluto. A estaca já era então um punhal esguio, finíssimo, letal. Ele, soez, fazia pose e mostrava no próprio peito: é aqui, exatamente aqui, que a estaca deve ser cravada.

Eis a verdade sinistra: - Dizia isso com a pretensão de revelar algum escrúpulo. Mas era só cinismo, ainda que as circunstâncias pudessem vaticinar uma iminente tragédia.

Lembro-me bem que meu irmão fez suspense antes de concluir a narrativa: Naquela noite, depois que o tio deixara a sobrinha e fora para o seu próprio quarto, a menina se fizera mulher. Tivera sua copiosa, abundante primeira menstruação. No meio da madrugada acorda e percebe tudo. Pela manhã todos saberão. Não haverá mais segredo. Estará tudo acabado, será a suprema, a máxima vergonha. É chegada a hora.

Apanha a estaca assassina e caminha até o quarto do tio. Abre a porta sem fazer ruído. Ele dorme com um esgar de sorriso. Ela sabe exatamente onde deve enterrar a estaca e desfere o golpe certeiro e mortal. O homem cai sobre o tapete e nessa queda seu peito esmaga e acaba por engolir o resto da estaca.

Quando os parentes começam a chegar, a menina está imóvel num canto, de cócoras, abraçada às próprias pernas. E não há sequer uma única e escassa lágrima a lhe escorrer pela face.

O tio é um cadáver inerte sobre o tapete ao lado da cama. E quando o corpo é removido vê-se que o sangue impregnou o tecido e caprichosamente se incorporou ao desenho  deixando impressa no tapete a figura do canalha obsceno: o fauno de tapete.
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Nelson Rodrigues (Nelson Falcão Rodrigues), dramaturgo, jornalista e escritor, nasceu na cidade do Recife, PE, em 23/08/1912, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 21/12/1980. Oriundo da capital pernambucana e quinto de quatorze irmãos, Nelson Rodrigues mudou-se para o Rio de Janeiro ainda criança, onde viveria por toda sua vida. Seu pai, o ex-deputado federal e jornalista Mário Rodrigues, perseguido politicamente, resolveu estabelecer-se na então capital federal em julho de 1916, empregando-se no jornal Correio da Manhã, de propriedade de Edmundo Bittencourt.

BB, a eterna musa francesa

Bardot determinou de forma decisiva a imagem da mulher no final dos anos 1950 e início da década de 60. Era uma garota de aspecto natural com um enorme sex appel, misto de leviandade e ingenuidade. Com cabelos loiros despenteados, lábios carnudos e grandes olhos escuros, Brigitte encarnou perfeitamente a mistura fascinante da ninfeta com a femme fatale.

Brigitte Bardot (Brigitte Anne-Marie Bardot), atriz, cantora e ativista, nasceu em Paris, França, em 28/09/1934. Conhecida mundialmente por suas iniciais, BB, é considerada o grande símbolo sexual dos anos 50 e anos 1960. Tornou-se ativista dos direitos animais, após se retirar do mundo do entretenimento e se afastar da vida pública.

Seu pai, Louis Bardot, foi um industrial da alta burguesia francesa. Sua mãe, Anne-Marie, era quatorze anos mais jovem que seu pai e casaram-se em 1933. Ela recebeu influência da mãe nas artes da dança e música. Em 1947, foi aceita no conservatório de dança e música de Paris (Conservatoire National Supérieur de Musique et de Danse de Paris) e cursou as aulas de balé por três anos.

Com o apoio e incentivo da mãe, começou a fazer trabalhos de moda em 1949, aos quinze anos, e em 1950 foi capa da edição de março da revista Elle francesa, trabalho que chamou a atenção do então jovem cineasta Roger Vadim. Vadim mostrou a capa da revista ao cineasta e roteirista Marc Allégret, que convidou Brigitte para um teste para seu filme Les lauriers sont coupés. BB foi escolhida para o papel, mas o filme acabou não sendo realizado. Mesmo assim, esta oportunidade fez com que ela pensasse em se tornar atriz. Mais do que isso, seu encontro com Vadim, que assistiu ao teste, iria influenciar sua carreira e sua vida.

BB tinha apenas 18 anos quando estrelou seu 1o. filme em 1952.

Brigitte estreou no cinema aos 17 anos no filme Le Trou normand (1952) e no mesmo ano, após dois anos de namoro à revelia dos pais, casou-se com Roger Vadim. Em seu segundo filme, Manina, la fille sans voile , suas cenas de biquíni fizeram com que seu pai recorresse à Justiça para impedir que as cenas fossem levadas ao cinema, sem sucesso.

Entre 1952 e parte de 1956 ela fez dezessete filmes, nenhum de grande sucesso, dramas românticos ou históricos, sendo três filmes em inglês, entre eles Helena de Tróia, mas foi o grande centro de atenção da mídia presente ao Festival de Cannes de 1953. Vadim não estava contente com isso e achava que Bigitte estava sendo subestimada pela indústria. A nouvelle vague francesa, inspirada no neo-realismo italiano, estava começando a crescer internacionalmente e ele, acreditando que Bardot poderia estrelar filmes de arte nessa linha, a escalou para o papel principal de seu novo filme, E Deus Criou a Mulher (1956), com a então jovem sensação masculina do cinema francês, Jean-Louis Trintignant. O filme, sobre uma adolescente amoral numa pequena e respeitável cidade do litoral, fez um grande sucesso - e causou grande escândalo - mundial, transformando BB num sex-symbol, com suas cenas de nudez correndo as telas de cinema de todo o mundo.

Na moralista Hollywood dos anos 1950, onde o maior símbolo sexual, Marilyn Monroe, no máximo havia aparecido nas telas de maiô, seu perfil erótico a transformou numa aposta arriscada para os estúdios, e isso, além de seu sotaque e seu inglês limitado, a impediram de fazer uma grande carreira no cinema dos Estados Unidos. De qualquer modo, ela se tornou a mais famosa atriz européia nos Estados Unidos e permanecer na França beneficiou sua imagem.

Durante a década de 1960, quando a Europa, principalmente Londres e Paris, começou a ser o novo centro irradiador de moda e comportamento e Hollywood saiu por um tempo da luz dos holofotes, ela acabou eleita a deusa sexual da década. Verdadeiro ou falso, nesta época se dizia que Brigitte Bardot era mais importante para a balança comercial francesa que as exportações da indústria automobilística do pais.

Bardot se divorciou de Vadim em 1957 e dois anos depois casou-se com o ator Jacques Charrier, que lhe deu seu único filho, Nicolas-Jacques Charrier, e com quem estrelou Babette vai à Guerra (1959). Seu casamento foi alvo constante dos paparazzi e houve choques e mudanças no rumo de sua carreira. Seus filmes se tornaram mais substanciais, mas isto trouxe uma grande pressão tornando dúbio o seu status de celebridade do cinema, pois ao mesmo tempo em que tinha aclamação da crítica na França, continuava sendo a bombshell glamourosa para o resto do mundo.

Em 1962, filmou com Louis Malle e Marcello Mastroianni Vida Privada, um filme quase autobiográfico sobre uma celebridade do cinema sem vida pessoal, graças a perseguição constante da imprensa. Pouco depois deste filme , BB retirou-se da vida agitada das metrópoles európéias para uma vida de semi-reclusão, mudando-se para uma mansão (La Madrague) em Saint Tropez, no sudoeste da França.

Em 1963 ela estrelou o aclamado filme de Jean-Luc Godard, O Desprezo, e pelo resto da década seu mito de ícone sexual foi alimentado por filmes como Histórias Extraordinárias, com Alain Delon, Viva Maria! com Jeanne Moreau e As Noviças, com Annie Girardot, entre outros e vários musicais de televisão e gravações de discos produzidos por Sacha Distel e Serge Gainsbourg.

Em 1973, pouco antes de completar quarenta anos, Brigitte anunciou que estava encerrando sua carreira. Após mais de cinquenta filmes e de gravar dezenas de discos, ela recolheu-se a La Madrague definitivamente, escolheu usar a fama pessoal para defender os direitos animais e tornou-se vegetariana. Em 1977 atraiu atenção mundial para sua causa ao denunciar in-loco o massacre de bebês-foca no norte do Canadá.

Em 1986, ergueu uma fundação, Fondation Brigitte-Bardot, declarada de utilidade pública pelo governo francês em 1992, e que em 1995 nomeou o Dalai Lama como seu membro honorário. Entre 1989 e 1992, BB também apresentou na TV francesa uma série chamada S.O.S. Animaux, co-patrocinada por sua fundação. Entre outras causas, ela atuou e liderou campanhas contra a caça das baleias, as experiências em laboratório com animais, pela proibição de brigas autorizadas entre cães e contra o uso de casacos de pele.

Entusiasta e apoiadora da política de Charles de Gaulle nos anos 1960, principalmente no tocante à independência da Argélia, nos anos 1990 entretanto, suas posições políticas e sociais, sobre a imigração árabe e a homossexualidade, lhe causaram diversos processos e lhe custaram muito da popularidade conquistada no cinema e em seu ativismo pró-animais, sendo uma personalidade hoje antipatizada pela nova geração dos franceses. Seu livro autobiográfico de 1996, grande sucesso de vendas na França, trazia diversas referências e críticas principalmente ao Islamismo.

Hoje casada com um ex-conselheiro do Partido Nacional de Jean-Marie Le Pen, representante da extrema-direita francesa, entre 1997 e 2003 ela foi processada por diversas entidades muçulmanas, devido a suas críticas aos imigrantes islamitas do país, ao crescimento do número de mesquitas, ao sacrifício de animais usado em vários de seus rituais e foi acusada de racismo e suposto incitamento anti-racial contra imigrantes, chegando a ser condenada a pagar 5.000 euros de multas em corte.

Por comentários recebidos como insultuosos aos homossexuais, feitos em seu livro de 2003, A Scream in the Silence, que também trata da 'islamização' da França, foi processada por entidades de defesa de minorias.

Em junho de 2008, BB foi pela quinta vez condenada num processo de incitação ao racismo por um tribunal de Paris, sendo obrigada a pagar 15 mil euros de multa. Os protestos de Bardot tem a ver com os rituais muçulmanos de sacrifício de animais, durante a tradicional festa Eid ul-Adha, realizada pelos imigrantes de países islâmicos que vivem no país.

Em Outubro de 2010 foi anunciado na imprensa que Brigitte Bardot pretende candidatar-se à presidência francesa nas eleições de 2012, liderando um grupo ecologista. O jornal Le Parisien, acrescenta que a atriz recebeu a proposta de ser a cara da Alianza Ecologista Independente, uma formação verde dirigida por Antoine Waechter, um conhecido ecologista.

Além de ser a responsável pela popularização de Saint Tropez, na França, ao se mudar para lá no começo dos anos 1960, no verão de 1964 Brigitte Bardot também mudou a vida de uma pequena cidade do litoral do Rio de Janeiro chamada Armação dos Búzios, onde ficou hospedada em suas visitas pelo Brasil, na companhia do namorado Bob Zaguri, um playboy e produtor marroquino que viveu muitos anos no Brasil. Depois da visita de BB, acompanhada diariamente pela imprensa e recheada de fotografias, Búzios foi 'descoberta', virou município e tornou-se um dos pontos mais sofisticados e procurados do verão brasileiro, inclusive por estrangeiros.

Em sua homenagem , a Prefeitura local criou a Orla Bardot, na Praia da Armação, e instalou ali uma estátua de bronze da atriz em tamanho natural. O único cinema do sofisticado balneário leva o nome da atriz. Em sua biografia, ela deixou registrado que os períodos passados na região foram as épocas mais lindas de sua vida. Em 2008 foi filmado o curta-metragem Maria Ninguém sobre a ida de Brigitte Bardot ao Balneário de Búzios, com Fernanda Lima interpretando BB.

Ela é reconhecida por ter popularizado o biquíni usando-o em seus primeiros filmes, nas aparições em Cannes e em dezenas de fotos de revistas.

BB era idolatrada por John Lennon e Paul McCartney, que fizeram planos de fazer um filme dos Beatles junto com ela, nunca realizado, na linha de Os Reis do Iê-Iê-Iê... As primeiras esposas dos dois, Cynthia Lennon e Jane Asher, usavam seus cabelos inspirados na cor e no corte do usado por BB. Ela e Lennon encontraram-se num hotel uma vez em 1968, apresentados pelo agente de imprensa dos Beatles. Segundo ele contou mais tarde em memória, nenhum dos dois impressionou o outro: 'Eu estava numa viagem de ácido e ela estava de saída'.

Em 1970, o escultor francês Alain Gourdon usou Brigitte como modelo para o busto de Marianne, o emblema nacional da França.

Bob Dylan dedicou a ela, como consta nos créditos de seu primeiro disco, a primeira música que compôs na vida. Além disso, seu nome consta em dezenas de músicas feitas por artistas tão diversos como Elton John, Billy Joel, Red Hot Chili Peppers, The Who, Caetano Veloso e Tom Zé, entre outros.



Fontes: Wikipedia - A enciclopédia livre; Terra Famosos.

O Flamengo de 1911

O "team" do Flamengo naquele ano de 1911.
Corria o ano de 1911. Vejam vocês: - 1911! O bigode do kaiser estava, então, em plena vigência; Mata-Hari, com um seio só, ateava paixões e suicídios; e as mulheres, aqui e alhures, usavam umas ancas imensas e intransportáveis. Aliás, diga-se de passagem: - é impossível não ter uma funda nostalgia dos quadris anteriores à Primeira Grande Guerra. Uma menina de catorze anos para atravessar uma porta tinha que se pôr de perfil.

Convenhamos: - grande época! grande época! Pois bem. Foi em 1911, tempo dos cabelos compridos e dos espartilhos, das valsas em primeira audição e do busto unilateral de Mata-Hari, que nasceu o Flamengo. Em tempo retifico: - nasceu a seção terrestre do Flamengo. De fato, o clube de regatas já existia, já começava a tecer a sua camoniana tradição náutica.

Em 1911, aconteceu uma briga no Fluminense. Discute daqui, dali, e é possível que tenha havido tapa, nome feio, o diabo. Conclusão: - cindiu-se o Fluminense e a dissidência, ainda esbravejante, ainda ululante, foi fundar, no Flamengo de regatas, o Flamengo de futebol.

Naquele tempo tudo era diferente. Por exemplo: - a torcida tinha uma ênfase, uma grandiloqüência de ópera. E acontecia esta coisa sublime: - quando havia um gol, as mulheres rolavam em ataques. Eis o que empobrece liricamente o futebol atual: - a inexistência do histerismo feminino. Difícil, muito difícil, achar-se uma torcedora histérica. Por sua vez, os homens torciam como espanhóis de anedota. E os jogadores? Ah, os jogadores! A bola tinha uma importância relativa ou nula. Quantas vezes o craque esquecia a pelota e saía em frente, ceifando, dizimando, assassinando canelas, rins, tórax e baços adversários? Hoje, o homem está muito desvirilizado e já não aceita a ferocidade dos velhos tempos. Mas raciocinemos: - em 1911, ninguém bebia um copo d’água sem paixão.

Passou-se. E o Flamengo joga, hoje, com a mesma alma de 1911. Admite, é claro, as convenções disciplinares que o futebol moderno exige. Mas o comportamento interior, a gana, a garra, o élan são perfeitamente inatuais. Essa fixação no tempo explica a tremenda força rubro-negra. Note-se: - não se trata de um fenômeno apenas do jogador. Mas do torcedor também. Aliás, time e torcida completam-se numa integração definitiva. O adepto de qualquer outro clube recebe um gol, uma derrota, com uma tristeza maior ou menor, que não afeta as raízes do ser. O torcedor rubro-negro, não. Se entra um gol adversário, ele se crispa, ele arqueja, ele vidra os olhos, ele agoniza, ele sangra como um césar apunhalado.

Também é de 1911, da mentalidade anterior à Primeira Grande Guerra, o amor às cores do clube. Para qualquer um, a camisa vale tanto quanto uma gravata. Não para o Flamengo. Para o Flamengo, a camisa é tudo. Já tem acontecido várias vezes o seguinte: - quando o time não dá nada, a camisa é içada, desfraldada, por invisíveis mãos. Adversários, juízes, bandeirinhas tremem então, intimidados, acovardados, batidos.

Há de chegar talvez o dia em que o Flamengo não precisará de jogadores, nem de técnicos, nem de nada. Bastará a camisa, aberta no arco. E, diante do furor impotente do adversário, a camisa rubro-negra será uma bastilha inexpugnável.”
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Nelson Rodrigues (Nelson Falcão Rodrigues), dramaturgo, jornalista e escritor, nasceu na cidade do Recife, PE, em 23/08/1912, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 21/12/1980. Oriundo da capital pernambucana e quinto de quatorze irmãos, Nelson Rodrigues mudou-se para o Rio de Janeiro ainda criança, onde viveria por toda sua vida. Seu pai, o ex-deputado federal e jornalista Mário Rodrigues, perseguido politicamente, resolveu estabelecer-se na então capital federal em julho de 1916, empregando-se no jornal Correio da Manhã, de propriedade de Edmundo Bittencourt.