sábado, 24 de dezembro de 2011

Sonho de Natal

Sonhou que era um desses Papais-Noéis pendurados entre os edifícios cariocas, à guisa de decoração natalina. Ficara dias e dias naquela posição incômoda, meio ao estilo jaca madura, balançando lá em cima.

Já não se lembra mais quanto tempo ficou balançando entre dois prédios, mas se lembra nitidamente que, no sonho, passados os dias das Festas, apareceu um caminhão e — finalmente — recolheram-no num desses carros da Limpeza Urbana e levaram para um depósito, onde outros Papais-Noéis, iguais a ele, já estavam amontoados pelos cantos.

Atiraram-no também a um canto e ele lá ficou, triste no seu infortúnio. Foi quando um outro Papai-Noel ao seu lado deu um suspiro e falou:

— Que papelão a gente fez, hem irmão?

— Não diga — respondeu ele: — Que coisa! Dois meses pendurados, que nem Judas, em Sábado de Aleluia.

— É... mas o Judas fica um dia só. Depois malham o coitado e o suplício acabou.

Tal tinha sido o vexame, que os outros Papais-Noéis do seu sonho, que eram muitos, espalhados no depósito, concordaram unanimemente que sua sorte foi pior. Cada um lembrava certo detalhe da experiência que acabavam de sofrer. Foi quando ele falou:

— No lugar onde estava pendurado tinha um garoto chato que passava o dia me atirando caroços de feijão pela janela.

— Devia ser um filho de rico, para ter feijão para atirar assim.

Os Papais-Noéis todos sorriram. Só um manteve-se sério e cabisbaixo, vítima de evidentes frustrações. Só falou quando todos já não tinham mais nada a dizer. Pigarreou e lascou:

— Azar maior dei eu, companheiros. Fiquei pendurado em frente à janela de uma pequena que vou te contar. Como era boa! Toda noite ela tirava a roupa com a janela aberta.

— Então não era tão chato o seu lugar — ponderou um dos Papais-Noéis.

— É o que você pensa — atalhou o que contava sua história. — Eu dava um azar desgraçado. Toda noite ela se despia com a janela aberta, mas na hora em que ia ficar pelada, o vento me virava de costas.
_________________________________________________________________
Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora