domingo, 4 de setembro de 2011

Vistas da Praia do Buraco

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Mais uma vez visitando o Morro do Careca neste sábado de sol meio tímido. Aqui ocorrem vôos livres e a vista é ótima para fotografar a praia Brava e a praia do Buraco com Balneário Camboriú ao fundo.

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A mulher das bofetadas

Chegou atrasado no emprego. Tirava o paletó, quando o Carvalhinho veio avisar:

— Olha, telefonaram pra ti.

— Homem ou mulher?

— Mulher.

— Deixou recado?

— Não. Disse que telefonava depois. Arregaçando as mangas, bufou:

— OK! OK!

Uns dez minutos depois, estava pondo em ordem uns papéis, quando o telefone bate novamente. O contínuo, que atendeu, berrou:

— Aristides!

Larga o serviço e apanha o telefone. Era uma voz feminina que, a princípio, não identificou. A pessoa perguntava: — “Não me conheces mais?”. Aristides, já impaciente, foi quase grosseiro:

— Quer dizer quem fala? Estou ocupadíssimo e não posso perder tempo.

Há uma pausa e, finalmente, a voz responde:

— Sou Dorinha.

Aristides quase cai para trás, duro.

Dorinha era o seu amor jamais esquecido ou, melhor, a sua dor-de-cotovelo confessa e imortal. Que idade teria ela, no momento? Uns vinte e cinco anos. Tinham se namorado na adolescência. Por um motivo bobo, haviam brigado. E quando Aristides, devorado pela nostalgia, quis voltar, ela já estava apaixonada por um outro, o Gouveia. Durante uns seis meses, Aristides andou pensando, dia após dia, em meter uma bala na cabeça. Acabou renunciando ao suicídio, mas ficou-lhe, para sempre, o sofrimento surdo. Dorinha casara-se com o Gouveia, tinha dois filhos de Gouveia. E sempre que a via, acidentalmente, na rua, Aristides precisava tomar um pileque dantesco. E, súbito, ela telefona, a inesquecível, a insubstituível Dorinha! Ao impacto da surpresa, gagueja:

— Ah, como vai você?

— Bem. E você?

— Navegando.

E, então, Dorinha diz-lhe:

— Preciso muito falar contigo.

— Comigo? E quando?

— Já.

— Pois não. Estou às tuas ordens. — E, na sua ternura sofrida, pergunta: — Tu sabes que mandas em mim, não sabes?

Combinaram o encontro, para daí a vinte minutos, numa sorveteria da rua da Carioca.

Aristides largou o serviço, que estava atrasadíssimo, e correu para o elevador. Daí a dez minutos, estava no local. Encontrou-a mais linda, mais fresca do que nunca. Diante da mulher que nunca deixara de amar, não se conteve. Com o coração disparando, começou:

— Sou todo teu. Nunca deixei de te amar.

Tomando refresco, com canudinho, Dorinha vai falando:

— Eu preciso de um favor teu. Mas quero que prometas que não pensarás mal de mim.

O espanto do rapaz foi uma coisa sincera e profunda:

— Você acha que eu posso fazer má idéia de ti? Oh, Dorinha!

Então, sem desfitá-lo, Dorinha disse:

— Meu marido partiu hoje, ao meio-dia, para São Paulo. De hoje para amanhã, eu sou uma espécie de solteira ou, então, de viúva. De qualquer maneira, uma mulher livre. Pensei em você, que merece toda a minha confiança e... Está compreendendo?

Numa confusão total, balbuciou:

— Mais ou menos.

E ela:

— Para falar português claro: — estou oferecendo a minha tarde. Leva-me!

Deslumbrado, exclama:

— Oh, Dorinha!

Ele pagou, trêmulo, a despesa.

Saem e, lá fora, Dorinha observa:

— Mas não devo me expor. Arranja um interior, sim?

Acontece que Aristides mantinha, de sociedade com um amigo, um apartamento em Botafogo. Cheio de escrúpulos, baixa a voz: — “Eu tenho um lugar, assim, assim, discretíssimo”. Dorinha interrompe: — “Ótimo!”. Tomam um táxi, que ia passando. A caminho de Botafogo, a pequena começa:

— Você, naturalmente, está espantado e querendo uma explicação.

Protesta, veemente:

— Explicação nenhuma! Basta o fato em si! Você está aqui, comigo, a meu lado, e não interessam os motivos, argumentos, nada!

Quando entraram, uns quinze minutos depois, no apartamento, Aristides não sabia o que dizer. Ainda uma vez, Dorinha toma a iniciativa:

— Você não me beija?

Ofereceu-lhe a boca. Aristides experimentou uma espécie de vertigem. O primeiro beijo, depois de tanto tempo, foi uma dessas coisas que marcam para sempre. Em seguida, ele a carrega no colo, como uma noiva de fita de cinema. Uma hora e pouco depois, já a noite entrara no apartamento e Dorinha estava diante do espelho, refazendo a pintura. Aristides veio, por trás, beijar-lhe os ombros nus; e suspira:

— Eu não sabia que gostavas tanto de mim!

Dorinha vira-se, com divertida surpresa:

— Mas eu não gosto de ti.

Atônito, pergunta:

— E isso que aconteceu entre nós? Não conta?

A pequena está de pé:

— Era a explicação que eu queria te dar e que tu recusaste. O meu marido, ontem, discutiu comigo e me deu uma bofetada. Estou aqui por causa da bofetada. Mas amo o meu marido e só meu marido.

Ele insiste, desesperado:

— Quer dizer que não vamos continuar?

Responde:

— Depende. Se meu marido me bater outra vez, já sabe: — eu telefono pra ti.

Sem uma palavra, na maior humilhação de sua vida, deixou-a partir.

Mas quando a porta fechou-se atrás da pequena, ele caiu, de joelhos, no meio do quarto, mergulhou o rosto nas mãos e soluçou como uma criança.

Durante uma semana, ele foi o ser mais humilhado e mais ofendido da Terra.

Dizia de si para si: — “A cínica! A cínica!”. E pior é que era incapaz de sentir atração por qualquer outra mulher. Uns quinze dias depois, ele atende o telefone: — era ela. Perguntava, alegremente:

— Vamos lá, outra vez?

Foram. E, no apartamento, ela suspira:

— Imagina, deu-me outra bofetada.

Encontraram-se outras vezes, sempre em função de novas bofetadas. Até que, uma tarde, entre um beijo e outro, ela exclama:

— Os homens são muito burros!

— Por quê?

E Dorinha:

— Tu não percebeste que não houve bofetada nenhuma? Que meu marido não me esbofeteou nunca? E que eu te amo, te amo e te amo?
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A coroa de orquídeas e outros contos de A vida como ela é... / Nelson Rodrigues; seleção de Ruy Castro. — São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
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Giovanni Bocaccio

Giovanni Bocaccio nasceu em Paris (1313) e morreu em Certaldo, Toscana(1375). Filho de um comerciante, Boccaccio não se dedicou ao comércio como era o real desejo de seu pai. Preferiu cultivar o talento literário, que se manifestou desde muito cedo. Com isso produziu uma obra que lhe garante lugar entre os maiores nomes do início da literatura italiana, ao lado de Dante e de Petrarca.

Após os primeiros estudos em Florença, Boccaccio foi enviado a Nápoles para completar sua formação na sucursal dos Bardi, banqueiros para os quais trabalhava seu pai, que insistia em fazê-lo trabalhar no comércio.

Aos 18 anos, consegue autorização para abandonar os estudos comerciais, mas o pai impõe-lhe uma nova escolha: direito canônico. Boccaccio aceita o mal menor, e lança-se à literatura com afinco, estudando escritores franceses em tradução italiana, poemas franceses no original e, principalmente, escritores latinos.

Em Nápoles, é introduzido na corte por um amigo e conhece Maria DAquino (ou Giovanna, não se sabe ao certo), que celebraria em suas obras sob o nome de Fiametta. Ao contrário de Dante, seu amor é profundamente sensual; colocando à distância a imagem da mulher idealizada segundo a tradição da lírica medieval. É dessa época sua primeira obra importante: o Filostrato, autêntico relato da paixão sensual.

Terminado seu romance com Fiametta (1339), inicia-se uma fase infeliz para Boccaccio, não só pelas desventuras amorosas, mas pela pobreza que se segue: os grandes bancos florentinos, entre os quais os dos Bardi, haviam sofrido grande golpe, devido a um empréstimo cedido ao rei inglês não reembolsado. Boccaccio perde sua posição social, deixa de freqüentar a corte de Nápoles e passa a morar em um bairro modesto. É quando começa a conhecer o mundo das ruas.

Retorna a Florença em 1341, onde publica Visão Amorosa, elegia em prosa. Entre 1344 e 1346, escreve Ninfale Fiesolano, lenda construída segundo o modelo do escritor latino Ovídio, onde a inspiração da Antiguidade é suplantada pelo tratamento moderno do assunto.

A peste que assola a Europa, chegando a Florença em 1348, dá a Boccaccio o quadro para sua obra mais importante: Decamerão,escrito enre 1348 e 1353. O livro se compõe de cem novelas que refletem a crise das concepções do mundo religioso. Para fugir à peste, dez jovens refugiam-se por dez dias num local solitário, narrando histórias de amor - eis o enredo da obra de Boccaccio.

A idéia central do Decamerão é a de que a natureza dita ao homem as regras fundamentais de sua conduta. Sufocar os sentimentos é desvirtuar a própria vida.Reafirmando a ruptura com os princípios morais e tradições literárias da Idade Média, que defendiam o valor da vida supraterrena e do amor espiritual, insiste na exaltação da beleza e do amor terrenos.

O Decamerão fez de Boccaccio o primeiro grande realista da literatura universal. Em 1355 escreve Corbaccio, sua última obra em dialeto toscano. A partir daí, utilizará somente o latim. Escreveu ainda Mulheres Célebres (1362), uma série de 104 biografias de mulheres conhecidas por seus vícios e virtudes. Pretendia ainda publicar as conferências que realizou sobre Dante: Os Comentários sobre a Divina Comédia. Mas a morte abateu-o, impedindo a conclusão do livro.

Fonte: http://contosassombrosos.blogspot.com
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