segunda-feira, 26 de março de 2012

O frio que vem de dentro

Quatro homens ficaram bloqueados numa caverna por uma avalanche de neve. Teriam que esperar até o amanhecer para poderem receber socorro. Cada um deles trazia um pouco de lenha e havia uma pequena fogueira ao redor da qual eles se aqueciam. Se o fogo apagasse, todos morreriam de frio antes que odia clareasse.

Chegou a hora de cada um colocar sua lenha na fogueira. Era a única maneira de sobreviver. O primeiro homem era um rico avarento. Ele estava ali porque esperava receber os juros de uma dívida.

Olhou ao redor e viu um círculo em torno no fogo bruxuleante, um homem da montanha, que trazia sua pobreza no aspecto rude e nas roupas remendadas. Ele fez as contas do valor da sua lenha e enquanto mentalmente sonhava com seu lucro, pensou:

- Eu, dar minha lenha para aquecer um preguiçoso?

O segundo homem era negro. Seus olhos faiscavam de ira e ressentimento. Não havia qualquer sinal de perdão ou mesmo aquela superioridade moral que o sofrimento ensinava. Seu pensamento era muito prático.

- É bem provável que eu precise desta lenha para me defender. Além disso, eu jamais daria minha lenha para salvar aqueles que me oprimem. E guardou suas lenhas.

O terceiro homem era o pobre da montanha. Ele conhecia mais do que os outros os caminhos, os perigos e os segredos da neve. Ele pensou:

- Esta nevasca pode durar vários dias. Vou guardar minha lenha.

O último homem trazia no rosto e nas mãos sinais de uma vida de trabalho. Seu raciocínio era curto e rápido.

- Esta lenha é minha. Custou o meu trabalho. Não darei a ninguém nem mesmo o menor dos meus gravetos.

Com estes pensamentos, os homens permaneceram imóveis. A última brasa da fogueira se cobriu de cinzas e finalmente apagou.

Ao alvorecer, quando os homens do socorro chegaram na caverna encontraram os cadáveres congelados, cada qual segurando um feixe de lenha. Vendo aquele triste quadro, o chefe da equipe disse:

- O frio que os matou não foi o frio de fora, mas o frio de dentro.

Fonte: S.O.S. Dona de Casa / Out/10.
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domingo, 25 de março de 2012

O ar-condicionado

Willis Carrier
Quando o engenheiro norte-americano Willis Carrier inventou o primeiro sistema de ar-condicionado, em 1902, foi dada a largada para uma grande revolução na história da indústria e ciência. Além de transformar o conceito de conforto e bem-estar, o ar condicionado tornou possíveis inúmeros avanços em áreas como saúde, pesquisa, construção civil, transporte e computação.

A história do ar condicionado iniciou no tórrido e úmido verão nova-iorquino de 1902. Uma indústria gráfica enfrentava problemas com suas impressões, pois a umidade excessiva do ar era absorvida pelo papel, resultando em imagens borradas e escuras.

O jovem engenheiro Willis Carrier acreditava que poderia reverter esse problema, por isso desenhou uma máquina que fazia o ar circular por dutos resfriados artificialmente. O processo, que controlava a temperatura e umidade da fábrica, foi o primeiro exemplo de condicionamento mecânico de ar.

Não demorou para que o sucesso da invenção se espalhasse pelo país, sendo a indústria têxtil o primeiro grande mercado para o condicionador de ar. A falta de umidade nas fábricas gerava excessiva eletricidade estática, dificultando a tecelagem das fibras de algodão. O sistema de Carrier controlou a umidade do ar, impulsionando a indústria de tecidos e se difundindo também em outros setores, como fabricação de papel, produtos farmacêuticos e tabaco.

A primeira aplicação residencial do ar-condicionado foi em uma mansão de Minneapolis, em 1914. No mesmo ano, Carrier instalou o primeiro condicionador de ar hospitalar, no Allegheny General Hospital de Pittsburgh. O sistema introduzia umidade extra em um berçário de partos prematuros, ajudando a reduzir a mortalidade causada pela desidratação.

Nos anos 20, o ar-condicionado começou a ser instalado em locais públicos. O aparelho teve seu "debut" em 1922, no Grauman's Metropolitan Theatre em Los Angeles e tornou-se uma peça fundamental para o crescimento da indústria cinematográfica pois, nos meses de verão, a freqüência dos cinemas caía muito, levando ao fechamento de várias salas.

Carrier equipou a Câmara dos Deputados dos EUA em 1928, o Senado Americano em 1929 e os escritórios executivos da Casa Branca em 1930, tornando mais agradável o trabalho no verão quente e úmido de Washington. Os vagões da ferrovia B&O foram os primeiros veículos de passageiros a possuírem condicionadores de ar, em 1930.

Também nos anos 30, Willis Carrier desenvolveu um sistema que viabilizou o ar-condicionado em arranha-céus. A distribuição do ar em alta velocidade através de dutos "Weathermaster", criada em 1939, economizava mais espaço do que os sistemas utilizados na época. Nos anos 50, os modelos residenciais de condicionadores de ar começaram a ser produzidos e comercializados em massa. Nesta época, Willis Carrier faleceu.

Considerado uma das personalidades mais influentes do século XX, o inventor do ar-condicionado nos deixou um importante legado. Sua genialidade mudou o mundo para sempre e abriu caminho para as inúmeras inovações que hoje constituem a vida moderna.

Fonte: www.springer.com.br
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sábado, 24 de março de 2012

Sentença amena

Está aqui no jornal; na "Luta Democrática", para ser mais preciso, um jornal conservador: a gente olha a fotografia, se o cara estiver em pé é o assassino, se estiver deitado, é a vítima. Mas — dizia — a notícia a que me atenho está aqui no jornal e a gente, com um pouco de imaginação, vê a cena.

Aconteceu na 21.a Vara Criminal, onde o juiz Manuel Benedito Lima teve que engolir em seco para manter a dignidade da Justiça quando sua vontade talvez fosse tacar a mão no sem-vergonha que o destino lhe pôs à frente, como réu confesso.

O réu era José Batista de Souza, preso por desacato à autoridade, atentado ao pudor e outros bichos. Bastava olhar para ele e ver que o mais correto seria outros bichas, em vez de outros bichos. Para início de conversa o réu se apresentou de "slack" bem justinho nas coxas e uma blusa "boufant" mais colorida que a Avenida Rio Branco no sábado de Carnaval. E como estava pintada, a ré misteriosa! Cílios postiços, baton, base, todas essas bossas da maquilagem moderna.

O juiz arregalou os olhos e perguntou o nome do réu:

— Meu nome é José Batista de Souza, mas pode me chamar de Carmen Déa — lascou a bicha, fazendo olhar pidão.

Nessa altura o magistrado já deve ter tido vontade de tacar a mão no bicharoca, mas conteve-se.

Seguiram-se as providências de praxe, o juiz ouviu as queixas do Estado contra Carmen Déa, digo, José Batista de Souza e depois sentenciou:

— Um ano e oito meses de cadeia.

A bicha piscou os olhos meio decepcionada e já ia virar as costas, quando o juiz terminou de lascar a sentença:

— ... e além disso, dois anos na Colônia Agrícola...

Aí Carmen Déa não agüentou, deu um gritinho e perguntou:

— Dois anos na Colônia Agrícola, segregada, no meio de todos aqueles presos?

— Justamente — foi a resposta.

E Carmen Déa começou a pular de contente, gritando de alegria:

— Era isso mesmo que eu queria... Adorei milhões. Adorei milhões.
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: GAROTO LINHA DURA - Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1975
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