A frase, cheia de sinceridade, é atribuída ao Padre Olímpio de Melo, que acumula as funções de Ministro de Deus e do Tribunal de Contas. Consta que o piedoso sacerdote é que disse isto, uma vez: "Uma mulher bem administrada vale mais que uma paróquia".
Eu nunca tive paróquia, mas — modéstia à parte — vinha com uma mulher. Vinha no meu modesto carrinho ali pela Praia de Botafogo, com uma mocinha dessas que, quando passam, a conversa dos homens vai diminuindo, vai diminuindo e depois que a moça passa fica tudo calado, pensando besteira.
Pois era uma mocinha assim que vinha comigo ali pela Praia de Botafogo e, quando entramos na Rua São Clemente, rumo ao Jardim Botânico, o pneu do carro furou. Também o desgraçado estava mais careca do que o Marechal Mendes de Morais. Fazia muito sol, irmãos. Este mês de março, aqui no Rio, eu vou te contar, está queimando a pele até do Monsueto.
E eu ali, de pneu furado, com o asfalto da Rua S. Clemente um bocado inclemente, a derreter quente sob os meus borzeguins. Mudar pneu de carro numa hora dessas é de lascar. E foi então que, olhando para a mocinha, solidária comigo na tristeza do imprevisto, eu me lembrei da frase do Padre Olímpio: uma mulher bem administrada vale mais que uma paróquia.
Combinei o golpe com ela, a mocinha topou e eu fui sentar num café em frente, para tomar uma cerveja. Ela saltou do carro, abaixou-se junto à roda de pneu furado e ficou olhando pra dita, desconsolada. Logo parou um carro e saltou um rapaz. Olhou a roda, falou qualquer coisa com ela e eu vi — lá do café — ela concordando com ele, num gesto.
O rapaz tirou o paletó e estava abrindo a mala do carro para retirar o macaco, quando dois outros rapazes, ambos altos e espadaúdos, atravessaram a rua, falaram também com a mocinha e começaram a ajudar o que chegara primeiro. O pneu sobressalente ainda não tinha sido retirado da mala para substituir o furado, e já havia mais um cavalheiro solícito, ajudando.
Para encurtar a conversa, enquanto eu bebi a cervejinha, cinco rapazes muito bonzinhos, todos sorridentes e solícitos, mudaram o pneu do carro, puseram o que estava furado na mala, ajeitaram as ferramentas e ainda indicaram à mocinha onde ficava o borracheiro mais próximo. Ela agradeceu muito, fez menção de entrar no carro e eu então paguei a cerveja, vim também, sentei na direção e fomos embora.
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: GAROTO LINHA DURA - Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1975
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