Dom jabuti seguia uma vez, distraído, preocupado com os seus negócios, filosofando nas coisas desta vida, por um caminho no meio do mato, quando esbarrou com uma velha e enorme anta, enforcada num laço, que caçadores haviam amarrado. Mais que depressa principiou a roer a corda que prendia o pescoço do bicho, e depois de esconder a corda num buraco, começou a gritar:
— Acode, gente!... acode depressa!...
Dona onça, que passeava na ocasião, foi ver por que motivo tanto gritava o jabuti.
— Que é isso? interrogou.
— Estou chamando gente para vir comer a anta que acabei de caçar agora mesmo.
— Queres que eu parta a anta? Propôs a comadre onça
— Quero sim. Dividirás a metade para mim e a outra para ti, disse ele.
— Então, vai apanhar lenha, para assarmos a carne da anta.
Quando o jabuti voltou, apenas encontrou o couro da anta, e disse:
— Deixa estar, onça velhaca, hás de me pagar algum dia esse desaforo que me fizeste.
Saído dali, andou por muitos dias seguidos. Ia pelo caminho pensando como se vingar da onça, quando se encontrou com um bando de macacos, em cima de uma bananeira, comendo bananas.
— Olá, compadre macaco, atira uma banana para mim, disse o jabuti.
— Por que não sobes? Não és tão prosa, jabuti?
— Vim de muito longe, estou cansado.
— Pois o que posso fazer é ir buscar-te daí de baixo cá para cima, disse um dos micos.
— Pois então, vem.
O macaco desceu, pôs em cima o jabuti, que ali ficou dois dias, por não poder descer.
No terceiro, apareceu uma onça, a mesma que se tinha encontrado com ele perto da anta.
— Olá, jabuti, como subiste nesta babaneira?
— Muito bem, onça.
A onça, que estava com fome, disse:
— Ó, jabuti, desce cá para baixo.
— Só se me aparares na boca, onça. Não quero me machucar, pulando daqui no chão.
A onça abriu a boca e o jabuti deu um pulo, mesmo na goela do bicho, que morreu imediatamente.
Então o jabuti saiu gritando:
— Matei uma onça, meus parentes, vão ver debaixo das bananeiras!...
Uma outra onça que passava, ouviu-o e perguntou:
— Jabuti, que estás dizendo?
— Não é nada, onça, é cá uma cantiga que sei.
E foi procurando um buraco para se esconder.
Assim que encontrou uma furna, parou e disse:
— Onça, sabes o que estava cantando? É isto: matei uma onça. Vá ver em baixo das bananeiras.
A onça correu para pegá-lo, mas o jabuti meteu-se pelo buraco, onde a onça também introduziu a pata, segurando-o por uma das pernas.
— Onça, pensas que apanhaste a minha perna, mas enganaste, apenas seguraste uma raiz.
A onça largou a perna do jabuti que tinha nas garras, e retirou o braço do buraco.
— Ó sua tola, foi a minha perna que seguraste mesmo. Agora vai ver a tua parenta embaixo das bananeiras.
A onça ainda cavou um bocado, para ver se apanhava o jabuti, mas este já estava longe, porque a furna onde entrara era muito funda.
Desde esse dia, a onça anda à procura do jabuti para se vingar, mas até hoje ainda não o encontrou.
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- Pimentel, Figueiredo. Histórias da avozinha. Rio de Janeiro; Belo Horizonte, Livraria Garnier, 1994, p.179-181 (Biblioteca de autores célebres da literatura infantil, 3).
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