sábado, 26 de novembro de 2011

Vida e morte do Malazarte

Dizem que Malazarte era o diabo. Pois não era e tanto não era que um dia, depois que Pedro Malazarte deu pousada a Jesus Cristo, este como sempre acompanhado de Pedro — São Pedro, o chaveiro — concedeu-lhe, em paga, o direito de fazer três pedidos.

— Quero — pediu prontamente Malazarte — que quem subir nessa figueira (apontou para uma figueira no quintal) não possa descer sem que eu mande.

— Concedido.

— Quero...

— Pede o reino do céu. — Aconselhou São Pedro.

— Quero — disse o outro sem fazer caso da interrupção — que quem entrar no meu surrão não possa sair sem minha ordem.

— Concedido.

— E quero...

— ... o reino do céu. — Insinuou São Pedro.

— Que reino do céu, o quê?! Deixe de ser bobo! Quero que ninguém possa por a mão no meu boné. Só eu.

— Concedido.

Somente depois que eles partiram lembrou-se que não tinha pedido nada.

— Não há de ser nada.

Chamou o diabo, pediu-lhe dinheiro e prometeu-lhe a alma, em troca.

— Daqui a dez anos pode vir me buscar.

Daí a dez anos, o diabo apareceu.

— Vou fazer o meu testamento. Você, se quiser, pode subir naquela figueira e ir comendo uns figos enquanto me espera.

O diabo assim fez e, quando quis descer da árvore, não pôde.

Esforçou-se, ameaçou, pediu, e, por fim. Pedto soltou-o com a condição de lhe deixar mestre satanás mais vinte anos de vida. Daí a vinte anos o diabo voltou. Pedro disse:

— Meu surrão está pronto. Quer me ajudar a amarrá-lo?

O diabo foi ajudar, mas quando estava bem perto, Pedro o empurrou para dentro. Por mais que esperneasse, não conseguiu sair. Então Pedro disse:

— Você pode ir embora, mas está desfeito o nosso trato. Nunca mais me ponha os pés aqui.

O diabo deu o fora. E Pedro acabou indo para o céu, por artes do bonezinho. Foi assim: Morreu. Apareceu no céu e São Pedro bateu-lhe com a porta na cara. "Você não quis pedir o reino do céu, agora aqui você não entra".

— Está bem — resignou-se Malazarte. — Então vou para o inferno.

Foi ao inferno e o diabo não o quis lá. Voltou ao céu e pediu a São Pedro que, já que não era possível entrar que o deixasse ficar sentado à porta. São Pedro encolheu os ombros.

— Se é só isso...

Pedro ficou. Não demorou muito aproveitou-se de uma distração do santo chaveiro e atirou o bonezinho para dentro. Acontece que ninguém podia pegar no bonezinho. E acontece também que quem entra no céu não pode mais sair — pormenor típico de várias histórias populares do tipo desta. E, assim, o Malazarte entrou para pegar o boné e ficou no paraíso.

(Vale do Paraíba, 1940, informante idosa, analfabeta.)

A mesma história é conhecida na Espanha. Foi recolhida uma variante em Rio Tuerto, Santander, por Aurélio M. Espinosa, que a registrou em "Cuentos populares españoles". Nossa versão, a personagem central é, em vez do Malazarte, Juan Soldão...

Decalcado no mesmo lema, o que demonstra a sua difusão na França foi o conto Federico, de Prosper Merimée.

Vim a saber do fim — por assim dizer — finalíssimo — do Malazarte, isto é, como Deus se arranjou com ele no céu, alguns anos mais tarde de um caipira mentiroso da alta sorocabana.

— Quando ele entrou no céu, por obra e arte do tal bonezinho mágico, cujo poder lhe foi conferido por Jesus, em suas andanças pelo mundo, Deus Nosso Senhor, pai de todos falou:

— Não quero que você fique aqui dentro, virando a cabeça de tudo quanto é santo. Já chega a Pedro que você enganou.

Arranjou um montão de trigo e deixou o Malazartes a um canto, contando os grãos, para que ele não tenha tempo de conversar com mais ninguém.

Há uma outra lenda que justifica medida do Todo-Poderoso. Segundo referem alguns dentro da tradição oral do Vale do Paraíba, Pedro sentou-se às portas do paraíso e manhosamente puxou prosa com São Pedro:

— Escute aqui, velhinho...

São Pedro encrespou tempestuosamente as sobracelhas.

— Escute aqui, faz tempo que o senhor é chaveiro?

— Desde que subi ao céu, com Jesus Cristo, meu mestre.

— Seu cargo é vitalício?

— É o que?

— Seu cargo é permanente? O senhor foi nomeado para toda a eternidade?

— Decerto. — Respondeu o velho chaveiro, impondo orgulho.

— E como é que o senhor sabe disso?

— Ora, o Senhor me disse.

— E se ele mudar de opinião?

— Não mudará.

— Mas se mudar? Tudo pode acontecer.

O velho coçou a cabeça.

Malazarte insistiu:

— O senhor não tem nenhum documento, nenhum contrato, que garanta seus direitos? O senhor tem só um entendimento de boca? E se um dia o senhor se desentender com o Mestre? E se ele resolver pôr um chaveiro mais moço, no seu lugar?

— É mesmo.

São Pedro trancou cauteloso a porta e foi para dentro. Procurou Jesus e perguntou-lhe:

— Senhor, eu sou chaveiro, para a eternidade?

— Naturalmente.

— O senhor não acha melhor... o senhor não vê... eu não tinha pensado nisso... o senhor compreende... minha posição... o senhor não acha...

— Que é isso, Pedro? Desembuche de uma vez.

— O senhor não acha bom nós dois assinarmos um contrato?

Cristo franziu a testa e ordenou:

— Traga o Malazarte aqui, que ele vai ficar contando areia, para não ficar enchendo a sua cabeça e a de todos os meus santos.

Parece que a origem da tarefa de contar grãos e contar areia é peninsular. Constantino Cabal — Mitologia ibérica — cita o caso de um trasgo de mãos furadas. Puseram-no a contar grãos de linhaça e ele não pôde, por causa das mãos furadas. Leite de Vasconcelos dá em Tradições populares de Portugal, notícia de um curioso fradinho de mão furada, que entra pelo buraco da fechadura e dá pesadelos. A antiga lenda peninsular do duende de mãos furadas se bifurca com a mudança de continente. Um ramo encontrando-se com a do saci dá o diabinho de mãos furadas. O outro encontra Pedro Malazarte e origina a lenda que afirma: Pedro Malazarte está no céu contando trigo.

Fonte: Guimarães, Ruth. "Vida e morte do Malazarte". Revista do Globo. Rio de Janeiro, 26 de julho de 1949.
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sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Teleco, o inimigo dos goleiros

Ídolo no Corinthians entre 1934 e 1944, o centroavante Teleco se intitulava o inimigo número um dos goleiros, apesar de ser irmão do guarda-metas King, que jogou no São Paulo na década de 40. Mas não havia verdade maior, como prova sua incrível marca de 243 gols em 234 jogos, mais de um tento por partida.

Artilheiro que chutava com os dois pés e excelente cabeceador, Teleco, cujo verdadeiro nome era Uriel Fernandes, também ficou conhecido por seus gols de virada e por sua raça. Na decisão paulista de 1937 contra o Palestra, Teleco fez questão de jogar mesmo machucado. Entrou e marcou o gol da vitória.

Uriel Fernandes nasceu em  Curitiba (PR), no dia 12 de novembro de 1913, e recebeu o apelido de Teleco de sua avó. Antes de chegar ao Corinthians, fazia parte do ataque do Britânia Sport Club, um dos clubes que deu origem ao Paraná Clube (o Paraná surgiu após a fusão entre o EC Pinheiros e o Colorado EC – por sua vez, o Colorado surgiu após a junção entre Atlético Ferroviário, Palestra Itália FC e Britânia SC).

Defendeu o alvinegro de 1934 a 1944 e tem a maior média de gols pelo Corinthians, registrada desde a fundação do clube. Com 251 gols em 246 jogos, o ex-centroavante atingiu média superior a um gol por partida, marca não superada até hoje no clube e maior até que a do Pelé, que fez 1281 gols em 1375 jogos – média de 0,93 gols por partida.

O maior artilheiro (pelo total de gols), no entanto, é Cláudio Christovam de Pinho com 306 gols. Ficando atrás também de Baltazar, "o Cabecinha de Ouro", em total de gols, Teleco é o terceiro maior artilheiro da história do timão. Encabeçou a lista de artilheiros do Campeonato Paulista em 1935 e 1936, ambos com nove gols, 1937 com quinze, 1939 com 32 e 1941 com 26.

Teleco morreu em Osasco (SP), no dia 22 de julho de 2000. Até 2006, ele continuava sendo o jogador que mais vezes conseguiu ser artilheiro vestindo a camisa do timão.

Títulos

Corinthians - Campeonato Paulista: 1937, 1938, 1939, 1941

Fontes: Revista Placar; Por Onde Anda?
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Pérolas

A pérola é o resultado de uma reação natural da ostra contra invasores externos, como certos parasitas que procuram reproduzir-se em seu interior.

Para isso, esses organismos perfuram a concha e se alojam no manto, uma fina camada de tecido que protege as vísceras da ostra.

Ao defender-se do intruso, ela o ataca com uma substância segregada pelo manto, chamada nácar ou madrepérola, composta de 90% de um material calcário - a aragonita (CaCO3) -, 6% de material orgânico (conqueolina, o principal componente da parte externa da concha) e 4% de água. Depositada sobre o invasor em camadas concêntricas, essa substância cristaliza-se rapidamente, isolando o perigo e formando uma pequena bolota rígida.

As pérolas perfeitamente esféricas só se formam quando o parasita é totalmente recoberto pelo manto, o que faz com que a secreção de nácar seja distribuída de maneira uniforme. "Mas o mais comum é a pérola ficar grudada na concha, como uma espécie de verruga.

Por isso, as esféricas são tão valiosas", diz o biólogo Luís Ricardo Simone, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (USP). O tempo médio de maturação de uma pérola é de três anos. Como a ostra já se defende muito bem de invasores com sua concha, o fenômeno é raro, acontecendo, na natureza, em apenas um em cada 10.000 animais.

No início do século XX, os japoneses inventaram uma forma simples de acelerar o processo, introduzindo na ostra uma pequena bola de madrepérola, retirada de uma concha, com cerca de três quartos do tamanho final desejado. O resultado é tão bom que, mesmo para um especialista, é difícil distinguir a pérola natural da cultivada. Substâncias presentes na água também podem ser incorporadas à pérola, por isso sua cor varia de acordo com o ambiente, gerando as mais diversas tonalidades. A pérola é a única gema de origem animal.

Até o século XVII, não existia tecnologia para polir pedras preciosas como rubis e esmeraldas, por isso as pérolas eram um dos maiores símbolos de riqueza e poder, usadas como adorno nas mais valiosas jóias da época.

A cor da pérola varia conforme as condições ambientais e a saúde da ostra: as mais comuns são rosa, creme, branca, cinza e preta. As formas da pérola dependem do formato do invasor e do local onde ele se instala. As esféricas são as mais raras e, conseqüentemente, mais valiosas.

Fonte: Mundo Estranho.
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