terça-feira, 31 de maio de 2011

Mitu no menu

Se o distinto aí tivesse ido a Liverpool, durante a lamentada Copa do Mundo, ficaria espantado com o grande número de patrícios desembarcados no movimentado porto inglês.

Dizem até que lá chegou um navio da Cos­teira, cheio de torcedor apaixonado, dois dias depois de a seleção brasileira ter ido pra cucuia. Dizem também que o navio voltou de marcha à ré - mas isto eu não afirmo, apenas comento de ouvir dizer.

O que eu vi mesmo foi muito brasileiro se virando pra poder dormir. Lembro-me de uma tarde, em que saímos do Press Center" - eu e o coleguinha Achilles Chirol, que não me deixa mentir. A gente ia saindo e conver­sando em português, porque era muito pedante ficar ali gastando inglês entre si, quando se aproximaram três su­jeitos meio ressabiados. Um deles virou-se para o colegui­nha e perguntou:

— Os senhores são brasileiros?

Nós éramos (e ainda somos). O cara então quis saber se naquele prédio de onde saíamos tinha poltronas no corredor. O Achilles disse que tinha e os três ficaram muito contentes. Entreolharam-se e um deles propôs:

— Vamos entrar aí, turma. Assim a gente dorme um pouquinho nas poltronas.

To contando o caso, para vocês sentirem o drama de quem faz do futebol uma paixão capaz de levar um coita­do a atravessar um oceano para ir dormir em banco de jardim, numa cidade onde chove de duas em duas horas, e onde o verão é tão extenso que — no ano passado — caiu num domingo.

A sorte desses dignos representantes da plebe ignara que foram parar em Liverpool era a quantidade de brasi­leiros presentes. No idioma pátrio eles conseguiam pedir uma ajudazinha e iam maneirando. Mas, depois que o Bra­sil foi eliminado e os jornalistas tiveram que partir para outras cidades, onde prosseguiria o campeonato mundi­al, eles ficaram na maior bananosa, e quem não conse­guiu passagem de volta nos primeiros aviões passou até fome.

Foi o caso do homem que comia mitu!

Deu-se que, uma tarde, descia um grupo de jornalis­tas a principal avenida de Liverpool (cujo nome eu esque­ci, porque de Liverpool não estou querendo me lembrar de nada), quando apareceu o homem que comia mitu. Eu estava no grupo e vi quando ele se aproximou. Disse que era brasileiro, que não falava nem "yes" de inglês, e per­guntou se não podia almoçar com a gente. Vimos logo que ele estava pedindo benção a mendigo e chamando cachorro de dindinho. Quem lhe pagaria o almoço seria mesmo o grupo, mas como éramos vários nesse grupo, concordamos em levá-lo. Saía barato e era menos um nor­destino com fome (o nossa-amizade era pernambucano).

No restaurante, cada um pediu seu prato. O penúlti­mo a escolher pediu costeletas de carneiro com legumes, e o último, como quisesse a mesma coisa, disse, em in­glês, para o garçom:

— Me too!

Quando vieram os pratos o fominha olhou para as costeletas, depois olhou pro garçom e — como ouvira a pedida — apontou para o prato e disse:

-Mitu!

Ora, "mitu" pode ser "me too", e o garçom trouxe o mesmo prato para ele também.

Depois soubemos que o distinto dava o golpe em tudo que era brasileiro que entrava em restaurante. Pedia para almoçar junto e era o último a pedir: — Mitu! — e o garçom trazia.

Mas aí o Brasil entrou bem, os brasileiros se manda­ram e ele ficou lá. Consta que, depois de muita luta, arran­jou uns "shillings" e entrou num restaurante. Quando o garçom se aproximou, fez a pedida:

- Mitu!

O garçom não entendeu nada. Parece que, depois que os brasileiros foram embora... o mitu acabou.
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Por: Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).

Fonte: FEBEAPÁ 1: primeiro festival de besteira que assola o país / Stanislaw Ponte Preta; prefácio e ilustração de Jaguar. — 12. ed. — Rio de Janeiro; Civilização Brasileira, 1996.
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domingo, 29 de maio de 2011

Parapente

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Parapente de 28/5/2011 quando eu sofria na subida do Morro da Rainha

O parapente, numa definição geral e divertida, é um instrumento inflável, que possibilita seres humanos voarem, além de avião ou pensamentos, numa linha de esporte radical. É semelhante a um pára-quedas, em que são suspensos por linhas o piloto e um possível corajoso passageiro. Admiro e tenho grande respeito pelos corajosos praticantes. 

Costuma-se denominar para-motor o parapente no qual um motor é empregado para propelir o piloto. O vôo de parapente (conhecido em alguns países como paragliding) é uma modalidade de vôo livre que pode ser praticado tanto para recreação quanto para competição. Pode ser descrito como um híbrido entre a asa delta e o pára-quedas.

Diferentemente do pára-quedas, o parapente oferece um vôo dinâmico, onde o piloto pode controlar sua ascendência e direção, dependendo das condições meteorológicas como velocidade do vento e também a incidência solar sobre determinada superfície que gera correntes de ar ascendentes (termais) e descendentes.

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Essa foto é do dia 6 de maio de 2011, na Praia do Buraco

A história do parapente começa em 1965 com a velasa (sailwing em inglês) criada por Dave Barish que chamou de slope soaring (vôo de talude) a prática de vôo com esta vela. Paralelamente Domina Jalbert inventa um pára-quedas cujo velame é composto por células, para gerar efeito asa. Este pára-quedas com dorso e intra-dorso, separados pelas células, foi o ancestral dos atuais pára-quedas, parapentes e kites (as velas do kitesurf). 

Desde então passaram a evoluir separadamente e atualmente a diferença mais importante entre pára-quedas e parapente é em relação ao chamado L/D (em inglês, Lift and Drag), ou coeficiente de planeio, que significa a distância horizontal que se pode atingir quando se parte de uma certa altura. 

Por exemplo: com um parapente de L/D 7, se a decolagem é feita de uma altura de 1 km, atinge-se 7 km de distância horizontal. 

Nos parapentes básicos atuais os L/Ds são superiores a 9, equipamentos de competição já possuem L/D maior que 11, já os L/Ds dos pára-quedas são muito inferiores a este valor. Na verdade, tenho que entrevistar um amante deste esporte tão radical...

Fontes: Wikipédia; O morro do Careca; Minhas fotos.
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Um predestinado

Os dois estavam na esquina, paquerando as mulheres que passavam. Era uma esquina de Copacabana e passava mulher às pampas. E os dois ali, numa abstenção dolorosa. Em se tratando de mulher, estavam mais atrasados que o interior de Mato Grosso. Quando passava uma mais bonitinha pouquinha coisa, um catucava o outro com o cotovelo e dizia, quase babando: — Olha que coisinha!

O catucado concordava e iam ambos virando a cabeça devagarinho, à medida que a boa ia passando. Daquele jeito não iam apanhar ninguém: no máximo, um torcicolo. Também, eu vou te contar, eram ambos tesos de fazer pena. Duros que só nádega de estátua.

Fizeram-se amigos casualmente. Os dois tinham vindo do interior para "fazer" o Rio. Um de um Estado do Sul, outro de um Estado do Norte. Copacabana era uma fascinação; por isso moravam em vaga de apartamento.

Uma dessas velhotas, que lutam com as maiores dificuldades e alugam quarto para rapaz respeitador e de boa família, alugou a cama da esquerda para um deles, o que veio do Norte e trabalhava num banco, agência de Copacabana, é lógico. Um mês depois chegou o do Sul, leu o anúncio no jornal: "...para rapaz de respeito. Alugo quarto com café da manhã".

— Ao menos o café da manhã eu garanto - pensou, e ficou com a vaga, cama da direita. A solidariedade da pobreza os fez amigos.

Um tinha 27 anos e o outro eu não sei, mas era mais ou menos da mesma idade. A necessidade do amor, da ternura feminina, de um carinho enternecedor, fazia do quarto um ambiente irrespirável. Por isso, de noite saíam, comiam uma besteirinha ali mesmo, debaixo do prédio, num restaurante anônimo, mas que poderia perfeitamente chamar-se "As Mil e Uma Moscas", e depois ficavam numa esquina de movimento, vendo passar mulher.

A intenção não era apenas ver passar. Havia sempre a esperança de que uma olhasse e desse bola. Neste caso o contemplado saía atrás e atropelava a caça, metia uma conversa. Mas bola mesmo só recebiam das profissionais. No começo chegaram a confundir, e um deles entrou na maior gelada. Pensou que estivesse agradando, foi em fren¬te, e depois, na hora de pagar, teve que deixar o relógio na cabeceira da piranha.

Isto não acontecia mais. Estavam com muita prática; só que não conseguiam atropelar bulhufas. Era desesperador; há meses que estavam invictos e um deles estava pensando justamente nesse recorde, quando passou um carro conversível com uma loura bacanérrima. A loura sorriu para o cara gordinho que dirigia, passou o braço pelo seu pescoço e sapecou-lhe um beijo na bochecha.

Os dois se entreolharam, enquanto o carro sumia: — Viste que covardia? — perguntou um.

- Vi — gemeu o outro.

- E viste o cara que estava com ela?

- Parecia uma foca. E nós dois aqui. Dois boas-pintas.

— ...boas-pintas mas tesos — lembrou o que achara covardia um sujeito tão feio com uma mulher tão legal.

Voltaram para o quarto numa fossa de fazer inveja a Franz Kafka. No dia seguinte, o que trabalhava num banco (o outro era comerciário e descontava para o IAPC, coitadinho) estava em sua cama, fazendo hora para o jantar no "As Mil e Uma Moscas", quando o companheiro chegou. Entrou no quarto, deu um boa noite alegre e começou a cantarolar, enquanto desembrulhava umas compras. Mostrou:

— Olha só. Comprei uma calça que é o fino, uma camisa italiana bárbara e este mocassim aqui que só falta falar.

— Quem te deu a dica? — perguntou o amigo, deslumbrado.

— Que dica?

— De que o mundo vai acabar?

— Não é nada disso, velhinho. Hoje, no trabalho, eu estive pensando. Só quem apanha mulher é dinheiro. As minhas economias que vão para o diabo. Você não viu ontem? Mulher, quando vê homem gastando, a gente nem precisa atropelar. Elas é que atropelam a gente, morou? O papai aqui vai mudar de tática. Vou mandar brasa. O Frank Sinatra, por exemplo...

— Que qui tem o Sinatra?

— As mulheres vivem atropelando ele. É claro: elas sabem que o homem ganha os tubos.

— Mas você não ganha.

— Mas vou fingir, ora essa! — meteu as roupas novas, penteou-se no caprichado e se mandou. Antes de sair, ainda disse pro outro: — To com um palpite, meu camarada. Hoje elas é que vão me atropelar.

O que trabalhava no banco não teve ânimo de acompanhar o amigo. Ficou onde estava, deitado na cama da esquerda. Foi aí que ouviu a freada. Correu para a janela.

O outro estava estatelado no asfalto. Um carro se afastava rápido do local, com uma loura na direção. Como era do Norte, pensou assim:

— Virge! Num é que os pensamento dele deu certo, esse menino?

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Por: Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).

Fonte: FEBEAPÁ 1: primeiro festival de besteira que assola o país / Stanislaw Ponte Preta; prefácio e ilustração de Jaguar. — 12. ed. — Rio de Janeiro; Civilização Brasileira, 1996.
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