Quando ela passava, pisando com garbo o asfalto da ruazinha sossegada, deixava a masculinidade local indócil. Mesmo os casados fingiam que vinham à janela para espiar o tempo, ou para jogar fora uma ponta de cigarro, ou para ver se as crianças-estavam-brincando-direitinho. Enfim, quando ela passava marcava ponto.
Também pudera! Mulher certinha estava ali. Aquilo era mulher para banquete de quatrocentos talheres. Bonita, sadia, corpo tamanho universal. Era de vê-la, irmãos, era de vê-la.
Trabalhar não trabalhava. Bastava olhar para ver o ócio a se derramar de seu olhar, pidão. Corria à boca pequena que era sustentada por um coronel.
Como toda mulher vaidosa e ociosa, tinha um cachorrinho. À noitinha costumava sair com seu cachorrinho, para passeá-lo um pouco. Aliás, minto... não era um cachorrinho: era uma cadelinha. Dessas ridiculamente poodles. Um dia, Mirinho estava atrás da persiana, olhando-a como sempre, quando ouviu ela dizer para uma doméstica que chamara a cadelinha de "um amor":
— É raça pura.
— Já cruzou? — perguntou a doméstica, numa curiosidade um tanto ou quanto grossa.
— Com esses vira-latas aqui da rua? Deus me livre! — e a boa fez cara de nojo, mesmo assim continuando uma gracinha. E acrescentou: — Esta só cruza com cão da mesma raça.
Mirinho ouviu, anotou e, quando conseguiu uma mesada mais gorda pouquinha coisa da sempre benemerente Tia Zulmira, comprou um cachorrinho poodle. Na tardinha seguinte, quando o pirão-da-redondeza deu a sua voltinha para passear a cadelinha, Mirinho entreabriu a porta e disse para o cachorrinho:
— Vai, Conquistador (Mirinho botou o nome no cachorrinho de "Conquistador" por motivos óbvios).
O cachorrinho saiu e foi direto fazer amizade de cachorro com a cadelinha. A dona da cadelinha achou Conquistador um amor. Levantou-o nos braços, deu beijinho no focinho e estava curiosa sobre sua procedência, quando Mirinho apareceu na calçada, fingindo-se preocupado, olhando em torno.
Nesse dia voltou com Conquistador debaixo do braço, mas conversou um pouquinho com a boa.
No segundo dia soltou Conquistador quando a boa já estava retornando ao lar. No terceiro, depois que ela já tinha entrado em casa. Enfim, do quinto ou sexto dia em diante, Conquistador já era íntimo da residência da moça. E Mirinho também.
Como, minha senhora? O coronel dela? Ah... o coronel já estava queimando óleo 40. Só vinha uma vez por semana.
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Também pudera! Mulher certinha estava ali. Aquilo era mulher para banquete de quatrocentos talheres. Bonita, sadia, corpo tamanho universal. Era de vê-la, irmãos, era de vê-la.
Trabalhar não trabalhava. Bastava olhar para ver o ócio a se derramar de seu olhar, pidão. Corria à boca pequena que era sustentada por um coronel.
Como toda mulher vaidosa e ociosa, tinha um cachorrinho. À noitinha costumava sair com seu cachorrinho, para passeá-lo um pouco. Aliás, minto... não era um cachorrinho: era uma cadelinha. Dessas ridiculamente poodles. Um dia, Mirinho estava atrás da persiana, olhando-a como sempre, quando ouviu ela dizer para uma doméstica que chamara a cadelinha de "um amor":
— É raça pura.
— Já cruzou? — perguntou a doméstica, numa curiosidade um tanto ou quanto grossa.
— Com esses vira-latas aqui da rua? Deus me livre! — e a boa fez cara de nojo, mesmo assim continuando uma gracinha. E acrescentou: — Esta só cruza com cão da mesma raça.
Mirinho ouviu, anotou e, quando conseguiu uma mesada mais gorda pouquinha coisa da sempre benemerente Tia Zulmira, comprou um cachorrinho poodle. Na tardinha seguinte, quando o pirão-da-redondeza deu a sua voltinha para passear a cadelinha, Mirinho entreabriu a porta e disse para o cachorrinho:
— Vai, Conquistador (Mirinho botou o nome no cachorrinho de "Conquistador" por motivos óbvios).
O cachorrinho saiu e foi direto fazer amizade de cachorro com a cadelinha. A dona da cadelinha achou Conquistador um amor. Levantou-o nos braços, deu beijinho no focinho e estava curiosa sobre sua procedência, quando Mirinho apareceu na calçada, fingindo-se preocupado, olhando em torno.
Nesse dia voltou com Conquistador debaixo do braço, mas conversou um pouquinho com a boa.
No segundo dia soltou Conquistador quando a boa já estava retornando ao lar. No terceiro, depois que ela já tinha entrado em casa. Enfim, do quinto ou sexto dia em diante, Conquistador já era íntimo da residência da moça. E Mirinho também.
Como, minha senhora? O coronel dela? Ah... o coronel já estava queimando óleo 40. Só vinha uma vez por semana.
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora