Chega no sábado, seu Galdino não quer vender sapato. Quer é encher a cara, grande amigo da cachaça é o distinto.
Pode chegar freguês à vontade que ele não vende bulhufas, mesmo durante o horário comercial sabatino, isto é, de 8 ao meio-dia. Até aí — diga-se em favor da verdade — Seu Galdino fica só na sede, aguardando a hora. Mesmo assim não vende.
Se chega freguês ele até finge que não vê. Aliás, não chega freguês nenhum, pois todo mundo lá manja a mania do sapateiro.
Mas chega garoto chato, pra gozar o velho. Chega e pede:
— Seu Galdino, tem sapato preto tamanho 35? O velho olha e resmunga: — Não tem sapato nenhum, seu besta. Essas caixas estão todas cheias de... e larga o palavrão que francês tanto gosta de usar.
Mas é depois de meio-dia que Seu Galdino começa. Fecha a loja e chama um garoto que trabalha para ele: — Meu filho, vá na venda do Fulgêncio e me traz uma garrafa de cachaça. Mas leve esta caixa de sapato vazia e bote a garrafa dentro. Não convém esse povo falador ver a cachaça, senão vai dizer que eu sou bêbedo e não é verdade. Eu não sou bêbedo, eu só bebo um pouquinho, pra distrair.
O menino pega o dinheiro, pega a caixa de sapato vazia e vai no botequim, trazendo, em seguida, a cachaça pedida e escondida. Seu Galdino vai lá pra dentro e brinca fácil pelo gargalo. Quando dá negócio de duas, três horas, ele chama o menino de novo, dá dinheiro e manda buscar mais uma.
O garoto pergunta se é pra trazer na caixa, mas Seu Galdino diz que não: — É dar muita importância a essa gente faladeira. Traz embrulhada num pedaço de jornal e basta.
O menino vai, compra, embrulha e manda, ou melhor, traz. Seu Galdino some lá pra dentro. Aí quando vai baixando a tardinha, Seu Galdino vem lá de dentro cambaleando, com um monte de dinheiro amassado na mão e diz:
— Meu filho, vai na venda do Fulgêncio e me compra duas garrafas logo de uma vez. E não embrulha não. Vem pela rua batendo uma na outra e se alguém perguntar, diz que é pra mim, porque vagabundo nenhum tem nada com isso e eu não devo um vintém a essa cambada.
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Pode chegar freguês à vontade que ele não vende bulhufas, mesmo durante o horário comercial sabatino, isto é, de 8 ao meio-dia. Até aí — diga-se em favor da verdade — Seu Galdino fica só na sede, aguardando a hora. Mesmo assim não vende.
Se chega freguês ele até finge que não vê. Aliás, não chega freguês nenhum, pois todo mundo lá manja a mania do sapateiro.
Mas chega garoto chato, pra gozar o velho. Chega e pede:
— Seu Galdino, tem sapato preto tamanho 35? O velho olha e resmunga: — Não tem sapato nenhum, seu besta. Essas caixas estão todas cheias de... e larga o palavrão que francês tanto gosta de usar.
Mas é depois de meio-dia que Seu Galdino começa. Fecha a loja e chama um garoto que trabalha para ele: — Meu filho, vá na venda do Fulgêncio e me traz uma garrafa de cachaça. Mas leve esta caixa de sapato vazia e bote a garrafa dentro. Não convém esse povo falador ver a cachaça, senão vai dizer que eu sou bêbedo e não é verdade. Eu não sou bêbedo, eu só bebo um pouquinho, pra distrair.
O menino pega o dinheiro, pega a caixa de sapato vazia e vai no botequim, trazendo, em seguida, a cachaça pedida e escondida. Seu Galdino vai lá pra dentro e brinca fácil pelo gargalo. Quando dá negócio de duas, três horas, ele chama o menino de novo, dá dinheiro e manda buscar mais uma.
O garoto pergunta se é pra trazer na caixa, mas Seu Galdino diz que não: — É dar muita importância a essa gente faladeira. Traz embrulhada num pedaço de jornal e basta.
O menino vai, compra, embrulha e manda, ou melhor, traz. Seu Galdino some lá pra dentro. Aí quando vai baixando a tardinha, Seu Galdino vem lá de dentro cambaleando, com um monte de dinheiro amassado na mão e diz:
— Meu filho, vai na venda do Fulgêncio e me compra duas garrafas logo de uma vez. E não embrulha não. Vem pela rua batendo uma na outra e se alguém perguntar, diz que é pra mim, porque vagabundo nenhum tem nada com isso e eu não devo um vintém a essa cambada.
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora.