quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Turismo insólito

Theatro Municipal do Rio de Janeiro
O fascínio por lugares com fama de mal-assombrados tem atraído turistas a passeios que misturam bom humor, história e folclore. Desde 2006, a Secretaria Municipal de Turismo do Recife (PE) realiza, gratuitamente, em noites de lua cheia e de sextas-feiras 13, a trilha “Lendas do Recife”, que recebe até 5 mil pessoas por edição.

O roteiro inclui o rio Capiberibe, onde acredita-se que o fantasma Vira-roupas assusta as lavadeiras, e o Teatro Santa Isabel, onde há quem escute aplausos durante a noite.

Enquanto turistas recebem vela e pergaminho, os guias representam lendas como Perna Cabeluda, que chuta pedestres e Laura Cemitério, conhecida por seduzir os homens que passam em frente ao cemitério Santo Amaro.

“Elaboramos o roteiro para despertar o interesse da população pela história da cidade, onde são presentes lendas e a idéia do macabro”, descreve Renato Barbosa, um dos criadores do passeio.

São Paulo também possui lendas, como a da loira do edifício Martinelli, no Centro, atração do passeio “São Paulo do Outro Mundo”. “Quando lançamos o circuito, em 2000, eram quatro vezes por ano. A procura foi tanta que agora fazemos uma vez por mês, com grupos de 20 a 42 pessoas. Brincamos com histórias de fantasmas, sem sensacionalismo”, afirma o criador Carlos Roberto Silvério.

Para envolver o turista, é entregue um “kit lanche fúnebre”, embrulhado em papel negro e fita rocha, e o ônibus é decorado com teias de aranha, crânios e crisântemos (flores típicas de velórios), e tem música ambiente de vampiros e fantasmas.

Entre os pontos visitados, estão os cemitérios do Araçá e da Consolação, o edifício Joelma, onde 200 pessoas morreram num incêndio; e o bairro da Liberdade, considerado o mais mal-assombrado, pois lá foi construído o primeiro cemitério da cidade.

No Rio de Janeiro, entre 1994 e 2001, havia um passeio pelos lugares mais assustadores da Cidade Maravilhosa, caso do Teatro Municipal, onde há quem tenha visto o poeta Olavo Bilac (1865-1918) declamando o discurso de inauguração, e o Museu Histórico Nacional, que dizem ser palco de debates entre oradores fantasmas.

Fonte: Turismo Cemiterial.
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O inferninho e o Gervásio

O cara que me contou esta história não conhece o Gervásio, nem se lembra quem lhe contou. Eu também não conheço o Gervásio nem quem teria contado a história ao cara que me contou, portanto, conto para vocês, mas vou logo explicando que não estou inventando nada.

Deu-se que o Gervásio tinha uma esposa dessas ditas "amélias", embora gorda e com bastante saúde. Porém, Mme. Gervásio não era de sair de casa, nem de muitas badalações. Um cineminha de vez em quando e ela ficava satisfeita.

Mas deu-se também que o Gervásio fez 25 anos de casado e baixou-lhe um remorso meio chato. Afinal, nunca passeava, a coitada, e, diante do remoer de consciência, resolveu dar uma de bonzinho e, ao chegar em casa, naquele fim de tarde, anunciou:

— Mulher, mete um vestido melhorzinho que a gente vai jantar fora!

A mulher nem acreditou, mas pegou a promessa pelo rabo e foi se empetecar. Vestiu aquele do casamento da sobrinha e se mandou com o Gervásio para Copacabana. O jantar — prometia o Gervásio — seria da maior bacanidade.

Em chegando ao bairro que o Conselheiro Acácio chamaria de "floresta de cimento armado", começou o problema da escolha. O táxi rodava pelo asfalto e o Gervásio ia lembrando: vamos ao Nino's? Ao Bife de Ouro? Ao Chateau? Ao Antonio's? Chalet Suisse? Le Bistrô?

A mulher — talvez por timidez — ia recusando um por um. Até que passaram em frente a um inferninho desses onde o diabo não entra para não ficar com complexo de inferioridade. A mulher olhou o letreiro e disse:

— Vamos jantar aqui.

— Aqui??? — estranhou Gervásio. — Mas isto é um inferninho!

— Não importa — disse a mulher. — Eu sempre tive curiosidade de ver como é um negócio desses por dentro.

O Gervásio ainda escabriou um pouquinho, dizendo que aquilo não era digno dela, mas a mulher ponderou que ele a deixara escolher e, por isso, era ali mesmo que queria jantar. Vocês compreendem, né? Mulher-família tem a maior curiosidade para saber como é que as outras se viram.

Saíram do táxi e, já na entrada, o porteiro do inferninho saiu-se com um "Boa noite, Dr. Gervásio" marotíssimo. Felizmente a mulher não ouviu. O pior foi lá dentro, o maitre d'hotel abriu-se no maior sorriso e perguntou:

— Dr. Gervásio, a mesa de sempre? — e foi logo se encaminhando para a mesa de pista.

Gervásio enfiou o macuco no embornal e agüentou as pontas, ainda crédulo na inocência da mulher. Deu uma olhada para ela, assim como quem não quer nada, e não percebeu maiores complicações. Mas a insistência dos serviçais de inferninho é comovedora. Já estava o garçom ali ao pé do casal, perguntando:

—A senhorita deseja o quê? — e, para Gervásio: — Para o senhor o uísque de sempre, não, Dr. Gervásio?

A mulher abriu a boca pela primeira vez, para dizer:

— O Gervásio hoje não vai beber. Só vai jantar.

— Perfeito — concordou o garçom. — Neste caso, o seu franguinho desossado, não é mesmo?

O Gervásio nem reagiu. Limitou-se a balançar a cabeça, num aceno afirmativo. E, depois, foi uma dureza engolir aquele frango que parecia feito de palha e matéria plástica. O ambiente foi ficando muito mais para urubu do que para colibri, principalmente depois que o pianista veio à mesa e perguntou se o Dr. Gervásio não queria dançar com sua dama "aquele samba" reboladinho".

Daí para o fim, a única atitude daquele marido que fazia 25 anos de casado e comemorava o evento foi pagar a conta e sair de fininho. Na saída, o porteiro meteu outro "Boa noite, Dr. Gervásio", e abriu a porta do primeiro táxi estacionado em frente.

Foi a dupla entrar na viatura e o motorista, numa solicitude de quem está acostumado a gorjetas gordas, querer saber:

— Para o hotel da Barra, doutor?

Aí ela engrossou de vez: — Seu moleque, seu vagabundo! Então é por isso que você se "esforça" tanto, fazendo extras, não é mesmo? Responde, palhaço!

O Gervásio quis tomar uma atitude digna, mas o motorista encostou o carro, que ainda não tinha andado cem metros, e lascou:

— Dr. Gervásio, não faça cerimônia: o senhor querendo eu dou umas bolachas nessa vagabunda, que ela se aquieta logo.

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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora.
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Foi num clube aí

Isto mesmo, foi num clube da Guanabara, desses que cultivam a chamada segregação racial.

De repente o Conselho Deliberativo foi obrigado a se reunir em sessão especial por causa de um bode que deu num dos eventos sociais da agremiação.

Alguns conselheiros já sabiam vagamente do que se tratava, mas a maioria estava por fora, boiando no assunto. É que a grave ocorrência se dera em circunstâncias mais ou menos veladas.

Todavia, clube vocês sabem como é: um antro de fofocas que eu vou te contar. Num instante começaram os boatos, os blá-blá-blás regulamentares.

Afinal, reunidos os senhores conselheiros, foi explicado que, durante uma reunião dançante, um sócio tinha bolacheado a namorada, num cantinho discreto do salão. A coisa, no entanto, se esparramara pela sede. Ora, em clube de gente metida a diferente, aquilo era insuportável. Imaginem: um sócio exemplando a namorada numa dependência social.

Discutiu-se a matéria ad nauseam — como dizem os latinistas enjoados — mas aí um dos conselheiros garantiu que a coisa não fora bem assim. Um sócio tinha, realmente, baixado a manopla numa mulher, mas não era namorada, era esposa.

Ora, isto agravava o caso. Um homem que não sabia respeitar a própria "patroa" (em clube usa-se muito chamar a mulher de "patroa", assim como no Lioris eles chamam de "domadora"), era indigno do quadro social.

Discutiu-se a matéria outra vez e aí outro conselheiro afirmou que tinham visto e lhe contado que o sócio dera uma bolacha, de fato, mas fora numa bicharoca, e não numa mulher. Gravíssimo, pois!

Discutiu-se a matéria e o Conselho Deliberativo já ia deliberar, quando um dos membros viu-se na obrigação de contar tudo, garantindo aos seus coleguinhas que era pior ainda. Não fora um sócio, mas um diretor que batera na bicharoca.

Espanto geral! Mas que vexame! Sim, era, pior, porém: duas bicharocas é que tinham se esbofeteado por causa de um diretor.

A discussão — nesta altura — já era velada, tudo falando baixinho.

E aí o presidente do Egrégio Conselho Deliberativo foi obrigado a suspender a sessão e aconselhar a todos que não falassem mais nisso, pois acabava de ser informado ao ouvido, por um conselheiro discreto, que não foi o caso de duas bicharocas brigando por causa de um diretor, e sim dois diretores brigando por causa de uma bicharoca.

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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora.
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