Isto mesmo, foi num clube da Guanabara, desses que cultivam a chamada segregação racial.
De repente o Conselho Deliberativo foi obrigado a se reunir em sessão especial por causa de um bode que deu num dos eventos sociais da agremiação.
Alguns conselheiros já sabiam vagamente do que se tratava, mas a maioria estava por fora, boiando no assunto. É que a grave ocorrência se dera em circunstâncias mais ou menos veladas.
Todavia, clube vocês sabem como é: um antro de fofocas que eu vou te contar. Num instante começaram os boatos, os blá-blá-blás regulamentares.
Afinal, reunidos os senhores conselheiros, foi explicado que, durante uma reunião dançante, um sócio tinha bolacheado a namorada, num cantinho discreto do salão. A coisa, no entanto, se esparramara pela sede. Ora, em clube de gente metida a diferente, aquilo era insuportável. Imaginem: um sócio exemplando a namorada numa dependência social.
Discutiu-se a matéria ad nauseam — como dizem os latinistas enjoados — mas aí um dos conselheiros garantiu que a coisa não fora bem assim. Um sócio tinha, realmente, baixado a manopla numa mulher, mas não era namorada, era esposa.
Ora, isto agravava o caso. Um homem que não sabia respeitar a própria "patroa" (em clube usa-se muito chamar a mulher de "patroa", assim como no Lioris eles chamam de "domadora"), era indigno do quadro social.
Discutiu-se a matéria outra vez e aí outro conselheiro afirmou que tinham visto e lhe contado que o sócio dera uma bolacha, de fato, mas fora numa bicharoca, e não numa mulher. Gravíssimo, pois!
Discutiu-se a matéria e o Conselho Deliberativo já ia deliberar, quando um dos membros viu-se na obrigação de contar tudo, garantindo aos seus coleguinhas que era pior ainda. Não fora um sócio, mas um diretor que batera na bicharoca.
Espanto geral! Mas que vexame! Sim, era, pior, porém: duas bicharocas é que tinham se esbofeteado por causa de um diretor.
A discussão — nesta altura — já era velada, tudo falando baixinho.
E aí o presidente do Egrégio Conselho Deliberativo foi obrigado a suspender a sessão e aconselhar a todos que não falassem mais nisso, pois acabava de ser informado ao ouvido, por um conselheiro discreto, que não foi o caso de duas bicharocas brigando por causa de um diretor, e sim dois diretores brigando por causa de uma bicharoca.
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora.
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