Americano inventa cada coisa legal, né? Tirante foguete, tudo que americano inventa é legal.
Vejam, por exemplo, a fita durex. Durante toda a história da humanidade o embrulho malfeito foi o horror dos que conduziam objetos debaixo do braço.
Vovô Clorofino — irmão de Tia Zulmira — uma vez passou um vexame no bonde de burro, por causa disso. Entrou, sentou do lado de uma senhora respeitabilíssima que era sua vizinha, e botou o embrulho no colo. Foi chato, o embrulho abriu e apareceram as ceroulas de flanela vermelha, que ele tinha comprado pro inverno.
Se, naquele tempo, já existisse fita durex, Vovô Clorofino não tinha passado pelo dissabor de ter a peça íntima olhada pela dama respeitável, que, segundo se dizia, nunca vira as ceroulas do próprio marido (quando Tia Zulmira conta esta história, Primo Altamirando costuma dizer: "Vai ver o marido não usava.")
Mas, voltemos aos inventos americanos. Agora mesmo eles vêm de inventar escova de dentes musical. Diz que é legal. Trata-se de uma escova que, quando a gente passa nos dentes, ela toca uma musiquinha, para tornar mais ameno o hábito da ablução bucal, se nos permitem o termo. A escova, inclusive, ensina o freguês a escovar os dentes, isto é, só toca a musiquinha se o cara escovar a dentadura no sentido vertical, que é como mandam os odontólogos.
Primo Altamirando, para escovar os dentes é mais duro que o time do Madureira para fazer gols no inimigo. Detesta escovar, Mirinho. Nestes últimos 36 anos, esta tem sido a grande luta de Tia Zulmira: fazer o nefando parente escovar os dentes de manhã.
Sabendo disso, mandamos vir dos Estados Unidos a tal escovinha com música e ontem fomos entregá-la à velha, lá no casarão da Boca do Mato. Explicamos como funcionava e esclarecemos que aquilo era uma esperança: talvez, com música, Mirinho escovasse os dentes:
Tia Zuzu suspirou e explicou que os americanos são práticos demais e, quando inventam as coisas, esquecem que existem pessoas excepcionais. E, num desabafo:
— Escova de dentes com música não vai fazer Mirinho mudar de hábito. Aquele cretino, além de porco, é surdo.
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora.
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