sábado, 22 de setembro de 2012

Elizabeth Taylor dos olhos violeta

Elizabeth Taylor (Elizabeth Rosemond Taylor), atriz, conhecida como Liz Taylor, nasceu em Londres, Inglaterra, em 27/02/1932, e faleceu em Los Angeles, California, EUA, em 23/03/2011. Filha dos americanos Francis Leen Taylor (1897–1968) e Sara Viola Rosemond Warmbrodt (1895–1994), que se mudaram para os Estados Unidos em 1939. Começou a carreira cinematográfica aos 10 anos, quando foi pela Universal Pictures, filmando "There's One Born Every Minute". Estreiou na série infanto-juvenil “Lassie”. A partir de então, apaixonou-se pela profissão e assim concretizou o seu maior sonho.

Evoluindo como atriz talentosa e respeitada pela crítica, nos anos 50 filmaria dramas, como "Um lugar ao Sol", com o ator Montgomery Clift; "Assim Caminha a Humanidade", com Rock Hudson, ambos atores homossexuais e dos quais se tornou grande amiga. Nessa década faria ainda "A Última Vez Que Vi Paris", ao lado de Van Johnson e Donna Reed.

Liz, como foi mais conhecida, foi reverenciada como uma das mulheres mais bonitas de todos os tempos; a marca registrada são os traços delicados de seu rosto e seus olhos de cor azul-violeta, uma cor difícil de achar, emoldurados por sobrancelhas desenhadas e espessas, de cor negra. Compulsiva colecionadora de jóias, adorava o brilho de brincos, colares, anéis e pulseiras, além de amar maquiagens, sapatos de grife, bolsas da moda e vestidos caros, mas mesmo sem tudo isso, em trajes simples e sem pintura, ainda assim era considerada de uma beleza muito rara. Os críticos da moda consideravam sua simetria de rosto e corpo ideais, os dois se encaixavam perfeitamente.

Ficou famosa também por ser uma hábil casamenteira, oito ao todo: Seu primeiro casamento foi com Conrad Nicholson Hilton em 1950, mas durou apenas um ano.

O mais famoso casamento foi com o ator britânico Richard Burton, seu 5º marido, notório pelo alcoolismo, com quem se casou duas vezes: De 1964 a 1974; e de 1975 a 1976. Fez duplas com ele em vários filmes nos anos 60, como o antológico "Cleópatra", o dramático "Quem tem medo de Virgínia Woolf?", em que ela ganhou o segundo Oscar, "Os Farsantes" e "A Megera Domada". Vencedora duas vezes do Oscar da Academia para Melhor Atriz, o primeiro em 1960 pelo papel da call-girl de "Disque Butterfield 8". Nessa década, com o reconhecimento do prêmio máximo do cinema mundial, consagrou-se como a mais bem paga atriz do mundo.


Com Michael Wilding, seu segundo marido, com quem foi casada de 1952 a 1957, teve dois filhos: Michael Howard Taylor Wilding, nascido em 1953, e Christopher Edward Taylor Wilding, nascido em 1955.

Com Michael Todd, seu terceiro marido, tendo sido casada com ele por 1 ano, teve uma filha em 1957, chamada Eliza Frances Todd, mas conhecida como Liza. Elizabeth Taylor ficou viúva em 1958, tendo de criar a filha sozinha, o que a fez sofrer pela perda de seu companheiro.

Liz Taylor em "Cleopatra" (1963).
Em 1959 se casou com o melhor amigo de seu marido, Eddie Fisher, com quem viveu até 1964, mas se envolveu com Richard Burton e o casamento terminou. Em 1964 casou-se com Richard e o casal resolveu adotar uma menina alemã, a quem batizaram de Maria Taylor Jenkins.

O casamento com Richard era muito conturbado, cheio de brigas e ciúmes, com indas e vindas, chegando a ficar separados por mais de seis meses. Nos anos 70, assumiu um relacionamento com o embaixador iraniano nos EUA, Ardeshir Zahedi, se divorciando de Burton, com quem já não era mais feliz, já que ele era agressivo, ciumento e bebia demais.

Sentindo que o que viveu com esse embaixador não passou de encontros sem importância para ele, que o próprio não queria ter nada sério, Liz resolveu separar-se dele. Sozinha e desiludida em encontrar um grande amor conheceu um novo homem, John Warner, um político. Foi casada com ele de 1976 a 1982.

Elizabeth Taylor - Janeiro de 1950.
Os anos passaram e ela não quis mais se casar, apenas namorar alguns homens e viver pequenas aventuras, até que conheceu Larry Fortensky. Apaixonou-se pelo caminhoneiro, e o casamento dos dois ocorreu em 1991 e foi realizado no Rancho Neverland, propriedade de seu amigo e cantor Michael Jackson. A separação ocorreu em 1996, por diferenças que ela classificava como irreconciliáveis. Ele foi seu último marido.

Em 1997, a atriz passou por uma delicada cirurgia para remover um tumor do cérebro.

Foi pioneira no desenvolvimento de ações filantrópicas, levantando fundos para as campanhas contra a AIDS a partir dos anos 80, logo após a morte de Rock Hudson. A despeito de ter nascido fora dos EUA, em 2001 recebeu do presidente Bill Clinton a segunda mais importante medalha de reconhecimento a um cidadão norte-americano: a “Presidential Citizens Medal”, oferecida pelos seus vários trabalhos filantrópicos. Nessa época se agravaram seus problemas de saúde, ganhando peso e sendo levada a internações recorrentes em hospitais.

Em 2009, foi submetida a uma cirurgia para substituir uma válvula defeituosa no coração. Ela usava uma cadeira de rodas havia mais de cinco anos para lidar com sua dor crônica na região cardíaca.

Em fevereiro de 2011, apareceram novos sintomas relacionados à sua insuficiência cardíaca. Não agüentando a dor no peito e a falta de ar, foi internada no Centro Médico Cedars-Sinai, em Los Angeles para fazer uma cirurgia emergencial, mas não resistiu, e veio a falecer de parada cardíaca.

Liz morreu na manhã do dia 23 de março, aos 79 anos de idade.

Filmografia

1988 - Il Giovane Toscanini
1987 - Poker Alice (filme feito para a TV)
1986 - Cenas de Mulher (filme feito para a TV)
1985 - Malice in Wonderland (filme feito para a TV)
1983 - Between Friends (filme feito para a TV)
1980 - A Maldição do Espelho
1979 - Winter Kills
1977 - A Little Night Music
1976 - Victory at Entebbe (filme feito para a TV)
1976 - The Blue Bird
Queen of Light/Mother/Witch/Maternal Love
1974 - O Ocaso de uma Vida
1973 - Ash Wednesday
1973 - Night Watch
1973 - Divorce His - Divorce Hers (filme feito para a TV)
1972 - Hammersmith Is Out
1972 - Under Milk Wood
1972 - X, Y e Z
1970 - Jogo de Paixões
1969 - Ana dos Mil Dias
1968 - Secret Ceremony
1968 - O Homem que Veio de Longe
1967 - The Comedians
1967 - O Pecado de Todos Nós
1967 - Doctor Faustus
1967 - A Megera Domada
1966 - Quem Tem Medo de Virginia Woolf?
1965 - Adeus às Ilusões
1963 - Gente Muito Importante
1963 - Cleópatra
1960 - Disque Butterfield 8
1960 - Scent of Mystery
1959 - De Repente, No Último Verão
1958 - Gata em Teto de Zinco Quente
1957 - A Árvore da Vida
1956 - Assim Caminha a Humanidade
1954 - A Última vez que vi Paris
1954 - Beau Brummell
1954 - No Caminho dos Elefantes
1954 - Rapsódia
1953 - The Girl Who Had Everything
1952 - Ivanhoé, o Vingador do Rei
1952 - Love Is Better Than Ever
1951 - Quo Vadis
1951 - Um Lugar ao Sol
1951 - O Netinho do Papai
1950 - O Pai da Noiva
1950 - The Big Hangover
1949 - Traidor
1949 - Quatro Destinos
1948 - Julia Misbehaves
1948 - A Date with Judy
1947 - Cynthia
1947 - Nossa Vida com Papai
1946 - Courage of Lassie
1944 - A Mocidade é Assim Mesmo
1944 - The White Cliffs of Dover
1943 - Jane Eyre
1943 - Lassie Come Home
1942 - There's One Born Every Minute

Fonte: biografia baseada na Wikipédia.
Leia mais...

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Sócrates, o calcanhar mágico

Doutor Sócrates
Tinha todos os defeitos para não vingar no futebol: fumava, bebia cerveja, treinava pouco, não suportava concentrações, tinha o pé pequeno (41) em relação à altura (1,91 m) e estudava Medicina. No entanto, tinha também as qualidades que forjavam os grandes craques. Frieza dentro da área, passes e toques perfeitos, excelente visão de jogo e vocação para marcar gols.

Tanta categoria de um médico só poderia render o apelido de "Doutor". Para compensar a lentidão ao se virar, se valia do toque de calcanhar com uma eficiência nunca alcançada no futebol mundial. "Ele joga melhor de costas do que a maioria de frente", chegou a declarar Pelé. Inteligente e engajado, articulou o movimento que passou à história como “Democracia Corinthiana”, conquistando o Paulistão em 1979, 82 e 83.

Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira (Belém, PA, 19/02/1954 – São Paulo, SP, 04/12/2011), mais conhecido como Sócrates e também referido como Doutor Sócrates, Doutor ou Magrão, recebeu esse nome porque seu pai, que era apaixonado por literatura, estava lendo “A República de Platão” na época de seu nascimento. A família, originária de Messejana, Ceará, vivia em Belém do Pará, mudou-se para Ribeirão Preto, SP, quando o pai, funcionário público federal, foi transferido.

Em Ribeirão Preto, ingressou no colégio dos Irmãos Maristas, onde começa a prática esportiva e se apaixona pelo futebol. Na época torcia pelo Santos. Quando completou doze anos, sua numerosa família já estava completa, com seus cinco irmãos - Sóstenes, Sófocles, Raimundo filho, Raimar e Raí, então com um ano de idade.

Aos dezesseis jogava no time juvenil do Botafogo Futebol Clube de sua cidade. Aos dezessete, ingressou na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, continuava jogando pelo Botafogo. No final de 1973, decide profissionalizar-se como jogador, sem abandonar o curso de medicina, que conclui em 1977, sem interromper sua carreira no futebol.

No Botafogo de Ribeirão Preto foi considerado um fenômeno desde o início, pois quase não treinava em função de frequentar o curso de medicina na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP). No ano de 1977 o Botafogo Futebol Clube contratou o treinador Jorge Vieira, que chegou ao clube dando o recado: "jogador que não treina, não joga". Sócrates achou que não jogaria mais futebol, porém Jorge Vieira, reconhecendo o talento de Sócrates, deu tratamento diferenciado ao jogador. Naquele ano Sócrates foi campeão da Taça Cidade de São Paulo 1977, disputando o título com o São Paulo no Morumbi e artilheiro do campeonato. Ainda pelo Botafogo, também se destacou no Campeonato Brasileiro, marcando um célebre gol de calcanhar contra o Santos na Vila Belmiro. Em 1978, deixou o Botafogo e transferindo-se para o Corinthians.

Sócrates se firmaria no Corinthians em 1978, refazendo a dupla com seu ex-companheiro no Botafogo Geraldão. Mas seus grandes companheiros de ataque nesse time seriam Palhinha e o amigo Casagrande. Sócrates passou a se dedicar mais ao futebol depois que se formou em medicina (1977). Na Seleção Brasileira estrearia em 1979 em um amistoso contra o Paraguai.

Foi uma das estrelas de times famosos em nível nacional e mundial: a Seleção Brasileira de Futebol da Copa do mundo de 1982 e do Corinthians da década de 1980, celebrizado pelo movimento da Democracia Corintiana. Na Copa de 1982 marcou dois gols contra as respeitadas equipes da URSS e Itália, mas isso não bastou para o Brasil se sagrar campeão. Também teve excelente atuação na Copa América de 1983, onde a seleção brasileira foi vice-campeã. Aos 30 anos faz uma rápida e decepcionante passagem pelo Fiorentina da Itália, entre 1984 e 1985.

Na Copa do Mundo de 1986 estaria novamente em ação, mas já fora de forma ideal. Ficaria ainda marcado pelo pênalti desperdiçado contra a França, na decisão que desclassificou o Brasil. Antes de encerrar a carreira (1989), ainda atuaria no Flamengo, no Santos e no Botafogo de Ribeirão Preto.

Logo após encerrar a carreira de jogador, tornou-se técnico do Botafogo. Em 1996, foi também técnico da equipe equatoriana LDU, mas demitiu-se alegando falta de profissionalismo dos jogadores.

Em 1999, atendendo a um convite de um antigo companheiro de seleção, Leandro, foi técnico da equipe carioca Cabofriense.

Fora do futebol, Sócrates sempre manteve uma ativa participação política, tanto em assuntos relacionados ao bem-estar dos jogadores quanto aos temas correntes do país. Na década de 1980, participou da campanha Diretas Já (1983- 1984) e foi um dos principais idealizadores do movimento Democracia Corintiana (1982- 1984), que reivindicava para os jogadores mais liberdade e mais influência nas decisões administrativas do clube. Era articulista da revista "Carta Capital" e do jornal "Agora São Paulo" e comentarista esportivo do programa "Cartão Verde" da TV Cultura.

Em agosto de 2011, foi internado na UTI do Hospital Albert Einstein devido a uma hemorragia digestiva alta causada por hipertensão portal. Após essa primeira internação, admitiu que tinha problemas de alcoolismo.

Após uma segunda internação em setembro, em dezembro de 2011, seria internado mais uma vez devido a uma suposta intoxicação alimentar, que acabou por se transformar em um grave quadro de choque séptico em razão de sua condição de saúde já debilitada. Sócrates faleceu às 4:30 da manhã de 4 de dezembro de 2011, em decorrência do choque séptico.

Sócrates foi sepultado no dia 4 de dezembro de 2011, no cemitério Bom Pastor, na cidade de Ribeirão Preto que, logo após o falecimento, decretou luto oficial.

Fontes: Revista Placar; Wikipédia.
Leia mais...

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O calabar de batina

Gravura holandesa mostrando o cerco a Olinda de Pernambuco em 1630.

Foi o Brasil, no mundo colonial ibérico, a única região onde repercutiram as lutas religiosas travadas na Europa da segunda parte do século 16 à primeira do século 17. É esse um dos aspectos mais importantes das tentativas de fixação de franceses, ingleses e holandeses em vários pontos de nosso país. Pontos ainda não estudados convenientemente.

Até hoje, a nossos historiadores, preocupados tão-somente com as razões políticas ou com os fatores econômicos da pirataria e conquista daqueles povos contra os domínios ultramarinos dos portugueses, escapou aquela feição, nitidamente definida de alargamento também da esfera de influência protestante no universo.

A reforma luterana determinara, na Europa, a famosa guerra dos Trinta Anos, a que pôs termo, provisoriamente, a paz de Vestfália, celebrada em Münster, cujo tratado adrede feito nada mais foi que a sementeira de agitações e lutas que vieram até o tempo da revolução francesa, por sua vez preparadora doutras lutas e doutras agitações. Depois de Lutero, Calvino formou partidários na Suíça, Flandres e França. A nova seita protestante dividiu a catolicíssima nação em huguenotes e papistas.

A Espanha imperial e católica assumiu a liderança da contra-reforma. Daí suas intervenções na política francesa desde o século 16, suas guerras em Países Baixos contra os gueux calvinistas e seu longo duelo marítimo com a Inglaterra. Como nação também fundamentalmente católica, Portugal teve de sofrer ataques que se intensificaram em suas colônias da África, América e Ásia, sobretudo após sua queda sob o domínio espanhol.

A heresia calvinista procurou firmar pé no Brasil com o estabelecimento de Villegaignon na baía de Guanabara. Os fundamentos religiosos dessa tentativa são evidentes, pois discussões violentas em matéria de crença separaram os colonizadores da França Antártica, e o episódio de João de Bolés nos demonstra a tentativa de propaganda protestante entre os silvícolas, com destruição conseqüente da catequese jesuítica.

Na conquista de Pernambuco e terras adjacentes pelos holandeses, quase um século depois, é também claro o elemento religioso. Os hereges perseguiram os católicos em Recife e alhures, os passam a fio de espada como no engenho Cunhaú ou tentaram a propaganda calvinista no seio da indiada, além de serem apoiados sempre pela numerosa judiaria daquele tempo em terra brasileiras.

No bastidor dessa luta de religião no Brasil, há episódios interessantíssimos, que nos dão informes curiosos sobre caracteres e ações de indivíduos nela participantes, bem como até onde podia ir, na época, o sentido religioso da vida. O do jesuíta Manuel ou Francisco Morais, pois se não sabe bem seu nome de batismo, é dos mais elucidativos. No auto-de-fé realizado a 7 de abril de 1642, em Lisboa, pela Santa Inquisição, foi queimado em efígie.

O que teria feito o padre pra tão dura pena, embora fosse sacerdos in aeternum? Passou do lado dos pernambucanos, que defendiam o Brasil luso-católico ao dos holandeses, que representavam a conquista herege. E, como se isso não bastasse, sem trepidar, lançando a batina às urtigas, abjurou o catolicismo, se declarando calvinista e se casou com uma holandesa sectária desse credo. Grande e grave foi esse escândalo em nossa vida colonial.

Tão, grande e tão grave que repercutiu na própria existência, em nossas plagas, da ordem Inaciana, pois que o invocaram pra justificar a falta de confiança na mesma que alegavam todos quantos tinham interesse na escravização dos índios, que ela tenazmente combatia, a fim da pôr fora de seus arraiais. Não esqueçamos de que, um século e pico antes do marquês de Pombal, deste lado do Atlântico, especialmente no Maranhão e em São Paulo, se propugnou e efetuou a expulsão dos jesuítas. Em São Luís contra eles tenazmente lutou Manuel Bequimão.

No volume 1, páginas 684 e 685, de Cronologia paulista, de J. J. Ribeiro, se encontra, firmado por 124 homens bons de São Paulo, entre os quais Amador Bueno da Ribeira, o Aclamado, o que não quis ser rei, Domingos Jorge Velho, governador do gentio de cabelo corrido, herói de Palmares, um dos grandes generais do sertão, e todos os procuradores das vilas das capitanias de São Vicente e Santo Amaro, notável documento que declara ter sido a expulsão dos jesuítas de São Vicente, no mesmo ano, baseada no grande crime de padre Morais, da capitania de Pernambuco.

Leiamos nesse papel o trecho que mais nos importa:" ...e juntamente constando que um padre de sua mesma ordem, religioso professor, sacerdote e pregador, que governavam as aldeias dos índios de Pernambuco, por nome padre Francisco Morais, ao qual constituíram capitão e governo dos mesmos índios na guerra de Pernambuco contra os holandeses, se rebelou e lançou com o inimigo levantando guerra contra os nossos, assim ele com os mesmos índios, nos fazendo notável dano e morte, de que procedeu a total ruína de Pernambuco por serem os índios muitos em quantidade, e por remate se fez apóstata e foi casar em Holanda, e tem os ditos reverendos padres tanta mão com estes índios que se pode temer o risco de nossas vidas...".

Aqui os escravizadores da bugrada se sangraram em saúde, aproveitando a negregada traição e apostasia de padre Morais pra lançar caluniosa e vil suspeita sobre toda a companhia de Jesus, apontada sibilinamente como capaz de usar os índios contra os colonizadores lusos, como o fizera o infeliz sacerdote. Pra isso exageram a importância de seu ato injustificável, lhe atribuindo a total ruína de Pernambuco. Na opinião desses caçadores de escravo de São Paulo, fora padre Morais um verdadeiro Calabar de batina.

Grande e negra a traição, gravíssima a apostasia, mas nem uma nem outra de molde a causar essa total ruína ou a transformar em flamengo-herege o Brasil luso-católico. Na verdade, como chefe de várias aldeias de índios mansos ou em vias de redução, adotar o calvinismo e levar todos esses íncolas ao grêmio calvinista foi obra tão maléfica que custa a crer a tenha praticado um jesuíta. 

É o caso de recordar a lição camoniana de que, mesmo entre os portugueses, alguns traidores houve algumas vezes. Também entre os jesuítas. Não foi esse, infelizmente, o primeiro e único exemplo. Outros, embora raríssimos e distanciadíssimos, lhe sucederiam na viagem do tempo.

À gravidade do crime do Calabar de batina correspondeu a pena inquisitorial: Morte da fogueira do auto da fé lisboeta, em efígie, porque o novo calvinista se refugiara em Países Baixos, fora do alcance da justiça que o perseguia.

Gustavo Barroso
______________________________________________________________________
Fonte: "Segredos e revelações da história do Brasil", Gustavo Barroso - Edições O Cruzeiro - 2ª edição - Agosto de 1961.
Leia mais...