A jovem senhora estava colocando as suas meias fumê, vestindo-se para ir a um jantar, quando ouviu um barulho na sala. Distraída, assim mesmo como se encontrava, nos trajos mais íntimos, foi até lá ver o que era. Foi aí que deu com o homem sentado no sofá.
Ela arregalou os olhos de espanto, ficou embatucada, olhando para o homem, mas este nem ao menos se preocupou com o seu susto. Continuou sentado no sofá. Ela — logo que teve forças — correu para o quarto, trancou a porta e telefonou para a amiga:
— Fulana, tem um homem aqui na sala, sentado no sofá.
— Não é seu pai? — perguntou a amiga, que ainda não sentira o drama.
— Se for papai é pior — ela exclamou nervosíssima.
— Por quê?
— Porque papai já morreu.
Só então a amiga percebeu o drama que ela vivia. Meu Deus, e se fosse um ladrão: — Tinha cara de ladrão? — perguntou a amiga.
Não, não tinha. Parecia um senhor numa sala de espera de escritório. A amiga concordou que certos ladrões sabem disfarçar-se muito bem. Mas teve um plano.
— Desliga o telefone que eu ligo para aí de novo. Você não atende, entendeu? Deixa que ele atenda lá na sala. Quando ele atender eu digo a ele para ir embora.
Era um plano dos mais mixurucas, conforme os leitores podem concluir, mas foi tentado. O telefone tocou, tocou e nada de o homem se mancar e atender, lá na sala. Vendo que a amiga ia ficar tocando em vão, madama atendeu, no quarto.
— Ele foi embora? — quis saber a amiga.
Madama não sabia, mas bolou outro plano:
— Eu vou destrancar a porta do quarto e ver. Mas, pelo amor de Deus, ligue de novo e dê quinze chamadas, se eu não atender até a décima-quinta, você chame a Polícia, porque o homem deve ter-me atacado.
Desligou o fone a tremer de medo e caminhou resoluta para a porta. Meteu a mão na chave e virou suavemente. Depois que a porta abriu, meteu a cara e espiou. Ué... não havia mais homem nenhum no sofá. Tomou coragem e caminhou pela sala. Chegou a dar um gritinho de espanto, quando o telefone recomeçou a tocar. Mas devia ser a amiga. Pôs-se a percorrer o apartamento todo. Nada do homem. Tinha ido embora. O telefone continuava tocando:
— Meu Deus! — pensou ela: — Eu não contei as batidas. Se chegar a quinze, Fulana desliga e chama a Polícia.
Deu um salto e atendeu. A amiga aflita explicou que dera dezoito chamadas para estar certa de que ela tinha morrido.
— Não morri — disse Madama: — O homem sumiu.
— Ora essa! — exclamou a outra, um tanto decepcionada.
E as duas conversaram um pouquinho, ainda prenhes de nervosismo, sobre o homem misterioso. Só então Madama se lembrou de que estava de calcinhas e meias fumê.
— Chi... tenho que acabar de me vestir — e desligou.
Já estava quase pronta, quando se lembrou de que deixara o batom na sala. Caminhou até lá, e ao transpor a porta olhou casualmente para o sofá. Deu um berro. Havia um homem sentado.
— Mas o que é isso, meu bem — estranhou o homem, num pulo.
Ai... felizmente o homem era seu marido. Madama, já agora num misto de nervosa e encabulada, contou tudo que acontecera. O marido ouviu tudo calado e tranqüilo, só não gostando do pedaço em que sua mulher entrou na sala de calcinhas e meias fumê, para ser vista pelo homem.
— E por que ele estava sentado aí? — perguntou ela, necessitada de uma explicação para o drama que vivera.
— Simples, meu bem. Você já não ouviu dizer que aí no andar de baixo há um apartamento suspeito de uma senhora que mantém um "rendez-vous"? Então... o camarada entrou aqui pensando que fosse o apartamento de baixo.
— Mas como é que ele não se espantou quando me viu de calcinhas, com estas meias?
— Ora, minha filha... se há uma coisa que não espanta é ver uma mulher passar nestes trajos, numa sala de "rendez-vous".
A mulher ficou a pensar um pouquinho. De fato, o marido tinha razão. Levantou-se, apanhou o batom e se pintou. Depois saíram, foram ao tal jantar e só de madrugada, ao voltar do banheiro sem maquilagem, com o marido já deitado para dormir, é que fez a derradeira pergunta, que a vinha intrigando desde o ocorrido:
— Meu bem...
— Hummmm... — gemeu o marido, tonto de sono.
— Mas por que o homem foi embora sem dizer nada?
— Porque, quando você se trancou no quarto só de calcinhas e meias, ele pensou que você estivesse com algum freguês e achou que não valia a pena esperar.
Fez-se silêncio e instantes depois Madama começou a chorar. O marido levantou a cabeça do travesseiro e perguntou intrigado:
— Uai... você está chorando por quê?
— Porque você achou... — disse ela entre soluços — ... que o homem foi embora porque achou que não valia a pena esperar.
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Ela arregalou os olhos de espanto, ficou embatucada, olhando para o homem, mas este nem ao menos se preocupou com o seu susto. Continuou sentado no sofá. Ela — logo que teve forças — correu para o quarto, trancou a porta e telefonou para a amiga:
— Fulana, tem um homem aqui na sala, sentado no sofá.
— Não é seu pai? — perguntou a amiga, que ainda não sentira o drama.
— Se for papai é pior — ela exclamou nervosíssima.
— Por quê?
— Porque papai já morreu.
Só então a amiga percebeu o drama que ela vivia. Meu Deus, e se fosse um ladrão: — Tinha cara de ladrão? — perguntou a amiga.
Não, não tinha. Parecia um senhor numa sala de espera de escritório. A amiga concordou que certos ladrões sabem disfarçar-se muito bem. Mas teve um plano.
— Desliga o telefone que eu ligo para aí de novo. Você não atende, entendeu? Deixa que ele atenda lá na sala. Quando ele atender eu digo a ele para ir embora.
Era um plano dos mais mixurucas, conforme os leitores podem concluir, mas foi tentado. O telefone tocou, tocou e nada de o homem se mancar e atender, lá na sala. Vendo que a amiga ia ficar tocando em vão, madama atendeu, no quarto.
— Ele foi embora? — quis saber a amiga.
Madama não sabia, mas bolou outro plano:
— Eu vou destrancar a porta do quarto e ver. Mas, pelo amor de Deus, ligue de novo e dê quinze chamadas, se eu não atender até a décima-quinta, você chame a Polícia, porque o homem deve ter-me atacado.
Desligou o fone a tremer de medo e caminhou resoluta para a porta. Meteu a mão na chave e virou suavemente. Depois que a porta abriu, meteu a cara e espiou. Ué... não havia mais homem nenhum no sofá. Tomou coragem e caminhou pela sala. Chegou a dar um gritinho de espanto, quando o telefone recomeçou a tocar. Mas devia ser a amiga. Pôs-se a percorrer o apartamento todo. Nada do homem. Tinha ido embora. O telefone continuava tocando:
— Meu Deus! — pensou ela: — Eu não contei as batidas. Se chegar a quinze, Fulana desliga e chama a Polícia.
Deu um salto e atendeu. A amiga aflita explicou que dera dezoito chamadas para estar certa de que ela tinha morrido.
— Não morri — disse Madama: — O homem sumiu.
— Ora essa! — exclamou a outra, um tanto decepcionada.
E as duas conversaram um pouquinho, ainda prenhes de nervosismo, sobre o homem misterioso. Só então Madama se lembrou de que estava de calcinhas e meias fumê.
— Chi... tenho que acabar de me vestir — e desligou.
Já estava quase pronta, quando se lembrou de que deixara o batom na sala. Caminhou até lá, e ao transpor a porta olhou casualmente para o sofá. Deu um berro. Havia um homem sentado.
— Mas o que é isso, meu bem — estranhou o homem, num pulo.
Ai... felizmente o homem era seu marido. Madama, já agora num misto de nervosa e encabulada, contou tudo que acontecera. O marido ouviu tudo calado e tranqüilo, só não gostando do pedaço em que sua mulher entrou na sala de calcinhas e meias fumê, para ser vista pelo homem.
— E por que ele estava sentado aí? — perguntou ela, necessitada de uma explicação para o drama que vivera.
— Simples, meu bem. Você já não ouviu dizer que aí no andar de baixo há um apartamento suspeito de uma senhora que mantém um "rendez-vous"? Então... o camarada entrou aqui pensando que fosse o apartamento de baixo.
— Mas como é que ele não se espantou quando me viu de calcinhas, com estas meias?
— Ora, minha filha... se há uma coisa que não espanta é ver uma mulher passar nestes trajos, numa sala de "rendez-vous".
A mulher ficou a pensar um pouquinho. De fato, o marido tinha razão. Levantou-se, apanhou o batom e se pintou. Depois saíram, foram ao tal jantar e só de madrugada, ao voltar do banheiro sem maquilagem, com o marido já deitado para dormir, é que fez a derradeira pergunta, que a vinha intrigando desde o ocorrido:
— Meu bem...
— Hummmm... — gemeu o marido, tonto de sono.
— Mas por que o homem foi embora sem dizer nada?
— Porque, quando você se trancou no quarto só de calcinhas e meias, ele pensou que você estivesse com algum freguês e achou que não valia a pena esperar.
Fez-se silêncio e instantes depois Madama começou a chorar. O marido levantou a cabeça do travesseiro e perguntou intrigado:
— Uai... você está chorando por quê?
— Porque você achou... — disse ela entre soluços — ... que o homem foi embora porque achou que não valia a pena esperar.
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora