terça-feira, 14 de junho de 2011

O analfabeto e a professora

Foi quando abriram a escolinha para alfabetização de adultos, ali no Catumbi, que a Ioná resolveu cola­borar. Essas coisas funcionam muito na base da boa von­tade, porque alfabetizar adultos, nunca preocupou muito o Governo.

No Brasil, geralmente, quando o camarada che­ga a um posto governamental, acha logo que todos os problemas estão resolvidos, sem perceber que — ao ocu­par o posto - os problemas que ele resolveu foram os dele e não os do País. Mas isto deixa pra lá.

Eu falava no caso da Ioná. Quando inauguraram o curso de alfabetização de adultos no Catumbi, os bene­méritos fundadores andaram catando gente para ensinar, e entre os catados estava um padre, que era muito bonzinho e muito amigo da família da Ioná. O piedoso sacerdo­te sabia que ela tinha um curso de professora tirado na PUC, e só não professorava porque tinha ficado noiva.

Mas depois — isto eu estou contando pra vocês porque todo mundo sabe, portanto não é fofoca não — a Ioná desmanchou o noivado. Ela era uma moça moderna e viu que o casamento não ia dar certo; o noivo era muito qua­drado, embora para certas coisas fosse redondíssimo.

Enfim, a Ioná tinha o curso mas não usava pra nada, e aí o padre perguntou se ela não queria ser também pro­fessora no Curso de Alfabetização de Adultos do Catum­bi. Ela topou a coisa, e as aulas começaram.

No início eram poucos alunos, mas depois houve muito analfabeto interessado, e o curso se tornou bem mais animado. Uns dizem que esse aumento de interesse foi por causa da administração bem feita, outros - mais realistas, talvez - acharam que o aumento de interesse foi por causa da Ioná, que também era muito bem feita.

Professora certinha tava ali. Tamanho universal, sem­pre risonha, corpinho firme, muito afável, e um palmo de rosto que a gente olhando de repente lembrava muito a Cláudia Cardinale. Além disso, ela ensinava mesmo. Seus alunos, para impressioná-la, caprichavam nos estudos, e sua turma tornou-se em pouco tempo a mais adiantada de todas.

Só um aluno era o fim da picada. Sujeito burro e duro de cabeça. Era um rapaz até muito bem apessoado, alto, louro, que trabalhava numa fábrica de tecidos. Chamava-se Rogério, era esforçado, educado, mas não conseguia ler a letra "o" escrita num papel. A turma se adiantando e ele ficando para trás. Ioná tinha pena dele, mas não sabia mais o que fazer, até que uma noite (os cursos eram no­turnos) ela fez ver ao Rogério que assim não podia ser, e ele ficou tão triste que a Ioná sentiu pena e perguntou se ele não queria que ela lhe desse umas aulas particulares.

— Seria bom sim - ele falou. E, então, sempre que terminavam as aulas, aluno e professora seguiam para a casa dela para repassarem os estudos da noite. Era um caso curioso o desse aluno, que se mostrava tão esperto, tão comunicativo, mas que não conseguia vencer as li­ções da cartilha. O livro aberto na frente dele e ele sem saber se foi Eva que viu a uva ou se foi vovô que viu o ovo.

Mas, justiça se faça, com as aulas particulares Rogé­rio melhorou um pouquinho. Não o suficiente para acompanhar o adiantamento da turma, mas — pelo menos — já soletrava mais ou menos.

Nesta altura o CAAC — Curso de Alfabetização de Adultos do Catumbi — já progredira a ponto de se tornar uma escola oficializada, e a Ioná estava tão interessada no Rogério que tinha noite até que ele ficava pra dormir.

Quando chegou o dia das provas e iam lá o inspetor de ensino e outras autoridades pedagógicas, Ioná foi informada do evento e ficou nervosíssima. Disse para o seu aluno favorito que era preciso dar um jeito, que ele ia ser a vergonha da turma, etc. Ele pegou e falou pra ela que pra decorar era bonzinho e, se ela fosse lendo para ele, decoraria tudo.

Claro que a Ioná não levou muita fé no arranjo, mas como era o único, aceitou. Na noite das provas o Rogério esteve brilhante e parecia mesmo que decorara aquilo tudo. Ela ficou orgulhosíssima e, mais tarde, já em casa, enquanto desabotoava o vestido, perguntou:

— Puxa, como é que você conseguiu decorar aquilo tudo, querido, tendo trabalhado na fábrica o dia inteiro?

— Eu não trabalhei não. Eu telefonei para o meu pai e disse que não ia.

— O quê ??? Seu pai é o presidente da fábrica?

— E eu sou o vice.

Ela ficou besta: - Quer dizer que você já sabia ler... escrever...

— Desde os cinco anos, neguinha!
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Por: Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).

Fonte: FEBEAPÁ 1: primeiro festival de besteira que assola o país / Stanislaw Ponte Preta; prefácio e ilustração de Jaguar. — 12. ed. —  Rio de Janeiro; Civilização Brasileira, 1996.
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segunda-feira, 13 de junho de 2011

Como surgiu o biquini

Michelini Bernardini
Em 1946, Louis Réard fez pela moda praia uma verdadeira bomba atômica quando “batizou” uma peça de roupa de banho de “biquíni”, nome inspirado no Atol de Bikini, localizado no Oceano Pacífico.

Os testes da bomba atômica foram realizados cinco dias antes. Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, era o grande acontecimento na época, e acabou sendo inspiração para o nome das invenções do engenheiro francês que cuidava do atelier de sua mãe.

Réard se inspirou no local de teste das bombas, o atol de Bikini, no sul do Pacífico, para batizar sua invenção, menor ainda do que a de Heim (por isso acabou se dando melhor e o biquíni estourou no mundo da moda como uma bomba atômica).

Pela origem latina do nome, parece não ter tido escolha mais perfeita para o nome: BI significa “dois” e KINI quer dizer “polegadas quadradas de Lycra”.

A sua idéia era tão desafiante que quando apareceu apenas poucas mulheres tiveram coragem de se exibir usando o biquíni. Quem teve de divulgar a nova sensação foi Micheline Bernardini, dançarina do Cassino do Paris (acostumada a se apresentar em panos mínimos nos musicais noturnos da casa).

Brigitte Bardot em Saint Tropez.
Em 1956, a francesa Brigitte Bardot imortalizou o traje no filme “E Deus Criou a Mulher”, ao usar um modelo xadrez vichy adornado com babadinhos.

O biquíni sofreu proibições em várias partes do mundo e inclusive no Brasil. O tempo foi passando, o biquíni diminuindo de tamanho e nos anos 1960 surge uma peça denominada “engana mamãe”, que de frente parecia um maiô, com uma espécie de tira no meio ligando as duas partes, e, por trás, um perfeito biquíni.

Mas foi no início dos 1970, que um novo modelo de biquíni brasileiro, ainda menor, surgiu para mudar o cenário e conquistar o mundo - a famosa tanga.


Fonte: http://kvinnas.fashionblog.com.br/2/#
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domingo, 12 de junho de 2011

Não sou uma qualquer!

Ela notou que ele estava meio bronqueado por causa das respostas monossilábicas que dava às suas per­guntas. Conhecia-o muito bem. Quando ele ficava emburrado para falar é porque estava com minhoca na cuca.

— Que é que há, meu bem? Você está meio chateado! Ele não respondeu logo. Meteu um suspensezinho legal, puxando uma tragada forte do cigarro. Depois ca­minhou até o armário da sala, tirou uma garrafa de uísque e deu aquele gole prolongado no mais belo e ultrapassa­do estilo Humphrey Bogart. Depois sentou-se na poltro­na, cruzou as pernas e disse:

— ... É andaram me buzinando aí umas coisas.

— A meu respeito? — e ela espalmou a mão sobre o cobiçado busto.

Novo silêncio, e a distinta, muito preocupada, levan­tou-se de onde estava e foi se aninhar no colo dele. Fez vozinha de criança:

— Meu queridinho, conta pra ela, vá! Deve ser mais uma fofoca dessa gente, mas é melhor você contar logo pra ela, sabe? Assim a gente tira logo as dúvidas. Não gosto de ver o meu querido zangado não - e começou a enfi­ar os dedos esguios e bem tratados pelos cabelos dele.

O cara suspirou, todo despenteado, e foi soltando o que tinham contado pra ele. Tinha sido na noite de apre­sentação do Charles Aznavour, no Copacabana Palace, a mais recente badalação de grã-fino com renda para ex­cepcionais. Agora a moda é esta: tudo o que é festa de grã-fino é para dar renda para excepcionais, pois ninguém é mais excepcional do que um grã-fino.

Ela tinha ido à tal apresentação do cantor francês e fizera muito sucesso. A Léa Maria deu até uma nota no Caderno B, dizendo que ela estava um show. De fato (enquanto ele falava ela ia se recordando), o seu vestido opart, com mini-saia, foi um sucesso. Era daquela saia que, quando a mulher senta, a saia some e aparece o que a saia tinha obrigação de fazer sumir. Um fenômeno da eleva­ção dos costumes — como diz a veneranda Tia Zulmira.

— Me disseram que você flertou a noite toda — o cara falou.

Ela esticou-se, ainda sentada em suas pernas. Outra vez a mão espalmada sobre o cobiçado busto:

- Eu ???

Ele ratificou. Ela mesma. Tinham contado pra ele que ela dançara de rosto colado com um tal de Collatini.

— Cola aonde? — perguntou ela.

— Collatini.

Ela ficou indignada. De fato, os Collatini, de São Pau­lo, estavam na mesa dela, mas isto era uma infâmia. Imagi­nem, logo quem? O Collatini, aquele velhote. De maneira nenhuma. De mais a mais, a Bequinha, mulher do Collati­ni, era sua amiga de infância. Essa gente é assim mesmo. Quando não tem nada para comentar sobre uma mulher... inventa. Dela eles não podiam dizer nada, tá bem? Absolutamente nada.

Nunca deu margem para falatório nenhum. Pelo contrário: procurava se portar em público — aliás, procurava se portar em qualquer lugar, ora esta! - com a máxima dignidade, justamente por isso. Porque sabia que essa gente de sociedade é fogo; não pode ver uma mulher bonita fora da panelinha desses cretinos, que começa logo a tentar descobrir coisas, para fazer dos outros gente igual a eles. É isto mesmo: falam só para justificar a vida que levam, esses amorais. Mas com ela não.

— Comigo não — repetia indignada: — Eu não sou uma qualquer!

Ele, impressionado com a reação dela, puxou-a para o seu regaço. Deu-lhe mais um beijo e falou baixinho que sabia disso, sabia que ela não era uma qualquer.

Pouco depois ela se levantava do colo dele, ia até o banheiro: ajeitou-se, pintou-se e de lá mesmo perguntou:

— Meu be-em! Que horas são?

— Quase seis! — respondeu o cara.

Ela veio espavorida lá de dentro, deu-lhe um beiji­nho rápido, apanhou uns embrulhinhos de compras que deixara sobre a mesa, quando chegara, e despediu-se:

— Tchau, querido! Deixa eu correr se não meu mari­do me mata!

E foi embora.

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Por:  Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).

Fonte: FEBEAPÁ 1: primeiro festival de besteira que assola o país / Stanislaw Ponte Preta; prefácio e ilustração de Jaguar. — 12. ed. — Rio de Janeiro; Civilização Brasileira, 1996.
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