sexta-feira, 4 de julho de 2014

Perito vendedor de vaga em liquidação

De repente ficou sem emprego. Tinha nove anos de casa. O patrão era desses muito bonzinhos, que preferem indenizar e botar no olho da rua, baseado na Lei, enfim... essas bossas. O que eu sei é que ficou desempregado e me conta as virações em que tem se metido para arrumar, enquanto a situação estiver assim, mais pra urubu do que pra colibri.

— Com o dinheirinho da indenização, meu caro Stan... já quebrei galho às pampas. Ninguém tem erva viva, meu querido. Tá tudo with the face and the rage.

Ele fala muito bem inglês e, por isso, returning to the cold cow, gosta de traduzir para a língua de Robert Field as expressões do nosso idioma. Mas deixa isso pra lá e prossigamos com o raciocínio lá dele.

— Tá tudo duro, Stan... com o dinheirinho da indenização, vendi meu carro, por cinco milhões a prazo e, no dia seguinte, fui lá na agência onde vendera e comprei por três milhões à vista. Eles aceitaram logo.

— Mas como é possível! Em menos de 24h ficaram devendo a você dois milhões de cruzeiros, à-toa?

— Claro... É aí que the pork twist the tall. A bagunça é tão grande que ninguém se importa de dever. Todo mundo quer é segurar no dinheiro vivo para sentir no tato que ele ainda existe.

— Sim... mas vem cá...  Não há de ser só com isso que você consegue se sustentar.

— Ora, claro que não. Stan, por favor, put the horse out of the rain... Há outras maneiras da gente ir se aguentando. Eu acabo de descobrir uma excelente colocação para mim.

— Emprego público?

— De certa forma sim, já que a colocação é na via pública. Eu sou “Perito Vendedor de Vaga”.

— ???

— Pois é. Chego à porta de uma loja, de madrugada, e fico parado em frente. Vai logo formando uma fila atrás de mim, pensando que no dia seguinte haverá “queima geral”, "grande liquidação”, essas besteiras que eles inventam para enganar a plebe ignara. Ai, quando chega de manhã e a loja vai abrir, eu grito: “Quem quer comprar a minha vaga?”. Aparece logo uma porção de gente querendo comprar. Outro dia, à porta do tal de “Ponto Frio” vendi a vaga por cem contos.


Fonte: Jornal "Última Hora", de 01/04/1965 — Coluna de Stanislaw Ponte Preta.

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