Maria
Lino era italiana e se chamava Maria Del Negri. Chegou aqui com 14
anos, como dançarina do Alcazar Lyrique. Entrou para a história do
teatro musical brasileiro como coreógrafa, considerada uma das maiores
expoentes do maxixe – a dança proibida.
Ela estreou no teatro de revista no final do século XIX. Um dos seus primeiros sucessos foi na revista Abacaxi (1893), de Moreira Sampaio e Vicente Reis, no Teatro Apolo (RJ).
Essa revista satirizava Barata
Ribeiro, o primeiro prefeito do Rio de Janeiro (1891-1894) e tinha
grandes atores no elenco como Brandão (o popularíssimo), Rose Villiot,
João Colás e Matilde Nunes.
Fez várias outras revistas, mas a
sua inscrição definitiva como vedete e na história do teatro de revista
se deve mesmo ao maxixe (a dança erótica). Não foi apenas pelos seus
dotes artísticos que ficou em evidência. Sua beleza impressionava. Era
elegante, sensual e provocadora, ao mesmo tempo. Logo no início de sua
carreira, teve um caloroso relacionamento com um rico e influente
fazendeiro paulista que, para satisfazer a amada, cobria-lhe de joias e
roupas caríssimas.
Mas, no finalzinho do século
XIX, Maria abriu mão de todo aquele luxo e dinheiro. Desmanchou o
compromisso com o fazendeiro para namorar o grande ator Machado Careca.
Conhecido por sua feiúra. Careca se apaixonou perdidamente pela jovem
vedete. No espetáculo Zizinha Maxixe (1897), a dupla se tornou célebre por lançar o tango brasileiro Gaúcho também conhecido como Corta-Jaca, composição de Chiquinha Gonzaga:
Ai, ai, que bom cortar jaca! Ah!
Sim, meu bem ataca
Corta-jaca assim, assim, assim!
Corta, meu benzinho, assim, assim!
Este passo tem feitiço, tal ouriço
Faz qualquer homem coió
Não há velho carrancudo, nem sisudo
Que não caia em trololó, trololó!
Sim, meu bem ataca
Corta-jaca assim, assim, assim!
Corta, meu benzinho, assim, assim!
Este passo tem feitiço, tal ouriço
Faz qualquer homem coió
Não há velho carrancudo, nem sisudo
Que não caia em trololó, trololó!
Em cena, Maria Lino e Machado
(que mais tarde escreveu os versos da canção) conquistaram o público
divulgando a nova dança sensual, o ritmo que, em pouco tempo, ganhou os
salões de dança da cidade para horror da sociedade conservadora que
considerou o ritmo como chulo, grosseiro e selvagem. Alheia às más
línguas, a dupla saía dos teatros e apresentava a dança lasciva também
em chopes berrantes, salões e cafés-concertos do Rio de Janeiro.
Enquanto o maxixe conquistava os
cariocas, Maria Lino dava continuidade à sua carreira no teatro de
revista. Já fazia números de alegoria e começava a estrelar números de
cortina. Atuou, já como vedete destacada em espetáculos do grande Arthur
Azevedo, como O Jagunço (1898) e Gavroche (1899).
Com o nome consolidado na
revista, Maria Lino fez incursões, também, no teatro dramático, como
ingênua. Mas foi no musical que apostou todas as fichas de sua carreira.
A dupla com Machado Careca
continuava a se apresentar nas Revistas. O maxixe estava na ordem do dia
dos salões cariocas, e ganharia novo fôlego em 1906, quando estreou O Maxixe, de Bastos Tigres que, definitivamente, imortalizou o ritmo. Maria fazia a apoteose do espetáculo, lançando Vem Cá, Mulata. Foi um enorme sucesso, que consagrou não só o tango brasileiro, como também a musa desse estilo musical: Maria Lino.
Com o enorme prestígio alcançado
como coreógrafa e representante do maxixe, recebeu proposta para uma
temporada em Paris. Viajou e largou o apaixonado Machado Careca para
trás.
Na França, Maria Lino encontrou
um novo parceiro, Duque (um ex-dentista que preferia dançar).
Apresentaram-se dançando maxixe, é claro, em casas noturnas e cabarés
tradicionais de Paris. Foi um sucesso histórico. A dança caiu no gosto
dos franceses que passaram a chamar de tango bresilien. Maria Lino ganhou o título de La reine du tango.
A temporada francesa se estendeu
a várias outras cidades europeias, divulgando, sempre com sucesso, o
nosso sensualíssimo maxixe.O regresso ao Brasil aconteceu em 1914. Maria
Lino retornava diferente: mudara o nome artístico (agora Maria Lina).
Maria era mulher despojada e
muito à frente de seu tempo. Era livre, tinha vida amorosa movimentada,
não se prendia a ninguém. Não media esforços para conseguir o que
queria. Era determinada e, de certa forma, despudorada. Um de seus muito
apaixonados chegou a dizer: Era uma demônia. Possuía olheiras
lânguidas, que traíam uma vida de vícios inconfessáveis.
Mas Maria não se conformou em
ficar eternamente conhecida como dançarina de maxixe. Como a idade
começava a pesar, lançou-se como autora teatral. Talvez, sua inspiração
viesse de Cinira Polônio.
Em outubro de 1915, estreou o espetáculo Ouro sobre Azul,
no Teatro Recreio, alardeando em todos os jornais sua estreia como
autora teatral. Além de assinar o texto, Maria também era a estrela da
revista originalíssima, feérica, moderna. Foi elogiada pela crítica
teatral. A peça fez um grande sucesso e elevou, ainda mais, o nome de
Maria Lino (ou Lina). Há boatos de que a peça foi escrita por um
revistógrafo experiente, em troca de favores amorosos. Mas histórias de
alcova não são confiáveis. E esta suposta fofoca tem acentuado sabor
machista.
A carreira de Maria Lino (ou
Lina) seguiu até a década de 1920, quando diminuiu o ritmo de suas
atividades. A dança se transformou em tema para teoria: ela dava
entrevistas e fazia palestras sobre o maxixe: sua origem e
desenvolvimento.
A partir dos anos 1930, passou a
trabalhar como atriz em companhias de comédia. Uma das últimas
companhias em que atuou foi a de Renato Vianna.
Maria Lino também fez cinema. Já bastante envelhecida, participou do filme Maridinho de Luxo
(1938), da Cinédia, no papel de sogra do maridinho, o comediante
Mesquitinha. Anos depois, faleceu, com idade bastante avançada.
Fonte: As Grandes Vedetes do Brasil - de Neyde Veneziano.
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