terça-feira, 7 de março de 2006

Memórias de um não folião

Eu abomino carnaval. A minha idéia de inferno? Ter que assistir eternamente a desfiles de escolas de samba na avenida. Se alguém quiser me torturar e arrancar meus segredos mais íntimos, é fácil. Basta me amarrar e me fazer ouvir por alguns minutos um CD de samba enredo. Depois de umas três daquelas músicas repetitivas e insuportáveis, eu confesso minha participação no esquema do mensalão, reconheço minha culpa na conspiração para matar Kennedy e admito que ajudei nos atentados de 11 de setembro.

Minha aversão pelo carnaval começa pelos carros alegóricos. Onde os comentaristas da Globo vêem beleza e criatividade, eu enxergo apenas mau gosto e breguice. Nada mais kitsch do que a águia da Portela.

Os temas escolhidos pelos carnavalescos são sempre originais e imprevisíveis. Quantas vezes você já viu alguma escola de samba mostrando o sofrimento dos negros no Brasil? As belezas naturais do país também estão sempre lá, assim como homenagens constrangedoras a personagens históricos. Neste ano, duas escolas falam de Santos Dumont. Mas há também as que preferem ousar. Uma escola de São Paulo, por exemplo, decidiu tratar dos 250 anos de nascimento do Mozart. Pobre Wolfgang. Nem Salieri pensaria numa vingança tão horrível. (…)

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Escrivã da delegacia da mulher

O único requisito era teclar rápido e ser mulher. Ninguém disse nada sobre discrição, mas eu era. A vítima podia narrar o que fosse, eu não me abalava. Ia teclando.

A história sempre começava bem:

- Ele tentou me matar.

Daí, caía no choro. Eu digitava: "choro" e cruzava os braços. Quando a vítima voltava a falar, eu voltava. Vinham os detalhes. A história padrão era homem bêbado que chega em casa nervoso e bate sem motivo. "Mais choro".

Até aí era sempre igual. Eu cruzava os braços, abria uma revista e esperava. Então vinha o motivo. Variavam entre: "ele acha que sou vagabunda", "ele acha que escondo dinheiro dele", "ele acha que vou fugir com as crianças".

A delegada pressionava mais um pouco e então sim, eu vibrava a cada toque. "Esperei ele dormir na rede, peguei linha e agulha e costurei ele lá dentro. Daí peguei a faca de cozinha e fui embalando o Zé. Conforme a rede vinha eu mexia a faca um pouquinho pra cá ou pra lá."

Quarenta e nove facadas. Deixava o expediente deprimida. Como escritora, jamais seria capaz de imaginar algo assim.

Fonte: 73 Subempregos
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