quarta-feira, 19 de outubro de 2011

A anciã que entrou numa fria

Gosto de ler jornal impresso com plasma sangüíneo. Não sou um leitor-vampiro. O que me diverte não é a notícia, porque não tenho carteirinha de necrófilo; o que me diverte é a redação da notícia, a maneira pela qual ela é abordada nesses jornais que, se a gente apertar, dá hemorragia.

Agora mesmo estava aqui a folhear um deles. Na página 4, lá em cima, à esquerda de quem lê, há uma coluna de ocorrências. E logo a primeira notícia vem sob a manchete: "Quis ver anciã nua e apanhou".

Ora, por mais ocupado que eu esteja, uma nota com este título eu não deixo pra lá de jeito nenhum.

E li. A coisa passou-se num desses conjuntos residenciais — autênticas cabeças-de-porco, construídas pelos institutos de previdência para enganar contribuinte — onde o pau come de cinco em cinco minutos, entre vizinhos de parede e meia. Sai tanta briga nesse tipo de residência para coitado que, não faz muito tempo, eu participava de um show no qual o conjunto regional brigava tanto que eu o apelidei de Conjunto Residencial do IAPI. Mas isto deixa pra lá.

Voltemos à anciã nua que abalou Ramos. Sim, porque foi em Ramos, aprazível subúrbio leopoldinense, onde cabrito pasta deitado para não pegar rebarba de tiroteio. O bandido da história chama-se Matias Afonso — solteiro, 28 anos, morador na Rua A, n.° 5.

Quando o cara mora em rua que não tem nome, é porque o apartamento dele é desses em que o morador abre a porta e entra com cuidado para não cair pela janela da frente.

Pois muito bem: Matias Afonso foi parar no Hospital Getúlio Vargas, vítima de um panelicídio. Palavra de honra! Não estou inventando nada. Está aqui no jornal: "No hospital, onde os médicos constataram uma lesão que pode levá-lo à cegueira, Afonso contou que Joana de Jesus, viúva com 71 anos, residente na Rua A, n.° 4 — vizinha, pois, do dito Matias —, agredira-o com uma panela, furiosamente".

Mas é aqui que the pig twists if's tail — como diz Lyndon Johnson, quando tenta explicar a batalha campal do Vietname.

Por que teria uma velha de 71 anos agredido um rapaz de 28? Alguma coisa ele fez de muito grave, porque, nessa idade, a pessoa geralmente já não agüenta levantar uma panela, quanto mais fazer dela um porrete de gladiador.

E o rapaz fez mesmo; cometeu uma temeridade que eu vou te contar. Outra vez transcrevo do órgão da imprensa sanguinária: "Porque olhava para o quarto onde a anciã trocava de roupa, Matias Afonso foi agredido, na madrugada de ontem, a golpes de panela, sofrendo contusões e escoriações na cabeça, estando ameaçado de perder a visão".

Convenhamos que perder a visão porque espiava uma velha de 71 anos inteiramente pelada é duro, é um bocado duro. Mas — pelo jeito — a vítima do panelicídio gostava. Senão vejamos: "Matias confessou que via Joana de Jesus despir-se, diariamente, por uma fresta da janela. Ontem, não se contendo, pulou a janela e foi repelido com uma panela".

Esta é a história que o jornal — como tudo que é noticiário policial — termina enfaticamente com o tradicional: "o comissário do dia tomou conhecimento do fato".

O comissário pode ter tomado conhecimento, mas nós queremos mais, é ou não é? Em não sendo policial, a gente tem uma curiosidade maior pelas ocorrências deste tipo. Basta reler o que foi contado para se ver que um dos dois personagens está mentindo, ou melhor, pode não estar mentindo, mas está omitindo. Se um rapaz de 28 anos apanhou de uma velha de 71, levando tanta panelada na cabeça, é porque — enquanto ela batia — ele tentava segurar outra coisa que não era a panela, do contrário teria se defendido melhor. O que estaria Afonso tentando segurar enquanto a septuagenária baixava-lhe paneladas na cuca?

Tirem vocês a conclusão.

Para Primo Altamirando a solução do mistério é outra. O jornal não conta que o cara via a velha pelada todo dia? — pergunta Mirinho. E ele mesmo responde:

— Diz sim. E se era todo dia, dificilmente a velha ignorava o fato. Portanto, para mim, esse tal de Afonso apanhou porque, ao pular dentro do quarto, a velha não quis deixar ele sair.

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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora.
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Anthony Perkins

Anthony Perkins, ator, nasceu em Nova Iorque, EUA, em 4/4/1932, e faleceu em Los Angeles, EUA, em 12/9/1992. Era filho de um famoso ator da Broadway Osgood Perkins, que atuou em Scarface, clássico de 1932 - ano em que Anthony nasceu - e que morreu quando ele tinha apenas cinco anos. Foi criado pela mãe, que ele mesmo definiu uma vez como "muito possessiva e bastante problemática".

Subiu ao palco pela primeira vez aos 14 anos e estreou no cinema em 1953 no filme Papai Não Quer, dirigido por George Cukor.

Em 1956 foi indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante pelo papel em Sublime Tentação de William Wyler.

Entrou para a galeria dos grandes nomes de Hollywood ao interpretar Norman Bates  - um assassino em série da obra Psycho (Psicose), de Alfred Hitchcock -, em 1960. Muitos críticos acharam na época que ele merecia ter ganho o Oscar por sua magnífica interpretação, mas não chegou nem a ser indicado ao famoso prêmio. O filme teve duas continuações, uma em 1983 e outra em 1986.

Entre 1962 e 1971, Perkins desenvolveu uma bela carreira na Europa, tendo oportunidade de atuar sob a direção de cineastas do porte de Claude Chabrol, André Cayate, René Clement, Anatole Litvak, Jules Dassin, Orson Welles, Edouard Molinaro, entre outros.

De volta aos Estados Unidos, continuou sua brilhante carreira. Dando continuidade ao famoso Psicose, de Hitchcock, Perkins estrelou em 1983, Psicose II, de Richard Franklin; em 1986, Psicose III, por ele próprio dirigido, e em 1990, para a televisão, Psicose IV - O Começo, de Mick Garris.

Em 1973, co-escreveu o roteiro de O Fim de Sheila, juntamente com Stephen Sondheim, tendo sido agraciado com o Prêmio Edgar Allan Poe. Em 1974, apareceu na Broadway ao lado de Mia Farrow, na peça Romantic Comedy, de Bernard Slade.

Perkins era bissexual, tendo tido casos com o ator Tab Hunter, com o bailarino Rudolf Nureyev e com o dançarino-coreógrafo Grover Dale, com quem teve um relacionamento de seis anos, antes de se casar com Berry Berenson. De sua união com Berry, teve dois filhos: Osgood, que seguiu a carreira de ator, e Elvis Perkins, que se tornou músico. Ele afirmou, certa vez, ter sido exclusivamente homossexual até próximo de seus 40 anos, quando conheceu a atriz Victoria Principal.

Diagnosticado com AIDS em 1989, manteve sua doença em segredo e continuou a trabalhar até o fim. No ano de sua morte, inclusive, participou de dois filmes, sendo um para a TV.

Fontes: 70 Anos de Cinema; Wikipedia.
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As feiticeiras de Salem


"É uma certeza que o demônio apresenta-se por vezes na forma de pessoas não apenas inocentes, mas também muito virtuosas." (Rev. John Richards, século XV)

Faz três séculos que o vilarejo de Salem, na colônia americana da Nova Inglaterra, foi tomado de assalto por uma onda de intolerância e de fanatismo religioso, vitimando quase vinte pessoas. Esse infeliz incidente, e a caça às feiticeiras que então se desencadeou, serviu como um alerta para que os princípios de liberdade religiosa fossem assegurados na história dos Estados Unidos.

Mister Parris, o pobre reverendo de Salem, estava exasperado. Betty, a sua única filha de apenas nove anos, acometida por uma série de estranhos espasmos, jogou-se petrificada sobre o leito, negando-se a comer. Naquela perdida cidadezinha, ao norte de Boston, não existiam muitos recursos além de um velho médico que por lá se perdera. Chamado para diagnosticar a doença, atestou para o aterrado pai que a menina estava era enfeitiçada e que nada lhes restava a fazer além de uma boa e sincera reza. A conclusão do doutor correu de boca em boca e em pouco tempo os pacatos habitantes do pequeno porto tomaram conhecimento de que Satanás resolvera coabitar com eles.

Simultaneamente outras garotas, as amiguinhas de Betty, começaram a apresentar sintomas semelhantes aos da filha do clérigo. Rolavam pelo chão, imprecavam, salivavam, grunhiam e latiam. Foi um pandemônio. Pressionado a tomar medidas, Parris resolveu chamar um exorcista, um caçador de feiticeiras, que prontamente começou sua investigação.

No século XVII, poucos punham em dúvida a existência de bruxas ou de feiticeiras porque uma das máximas daqueles tempos é de que "é uma política do Diabo persuadir-nos que não há nenhum Diabo".

Inquiridas por Cotton Mather, que iria se revelar uma espécie de Torquemada americano, as garotas contaram que o que havia desencadeado aquela desordem toda fora uns rituais de vodu que elas viram Tituba fazer. Essa era uma escrava negra que viera das Índias Ocidentais, e que iniciara algumas delas no conhecimento da magia negra. Durante o último longo inverno da Nova Inglaterra, ela apresentara várias vezes os feitiços para uma platéia de garotas impressionáveis.

Educadas no estreito moralismo calvinista e no ódio ao sexo que o puritanismo devota, aquele cerimonial animista deve ter despertado as fantasias eróticas nelas. Provavelmente culpadas por terem cedido à libido ou apavoradas por sonhos eróticos, as garotas entraram em choque histérico. Seja como for o caso, merecia ser ouvido num tribunal. Toda a Salem se fez então presente no salão comunitário.

Quando colocadas num tribunal especial, presidido pelo juiz S. Sewall, e inquiridas pelos juízes Corwin e Hathorne, as meninas começaram a apontar indistintamente para várias pessoas que estavam na sala apenas como curiosas. O depoimento mais sensacional foi o da escrava Tituba, que não só confessou suas estranhas práticas como afirmou que várias outras pessoas da comunidade também o faziam.

A partir daquele momento, a cidadezinha que já estava sob forte tensão se transformou. Um comportamento obsessivo tomou conta dos moradores. Uma onda de acusações devastou o lugarejo. Vizinhos se denunciavam, maridos suspeitavam das suas mulheres e vice-versa, amigos de longa data viravam inimigos.

Praticamente ninguém escapou de passar por suspeito, de ser um possível agente do demônio. Não demorou para que mais de 300 pessoas fossem acusadas de práticas infames. O tribunal que entrou em função em junho de 1692 somente parou em outubro. Resultou que dezenove pessoas foram enforcadas.

Fontes: História - Mundo - As Feiticeiras de Salem; Wikipedia.
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