quarta-feira, 25 de maio de 2011

O padre e o busto

Foi na esquina das Ruas Leopoldo Miguez e Ba­rão de Ipanema. A flor dos Ponte Preta mora pertinho e sua janela dá para o lado da Igreja de São Paulo Apóstolo, que fica justamente num dos quatro cantos da menciona­da esquina. Explicado o cenário, vamos à cena.

Passa muita mulher jeitosinha pelo local, vindo ou indo para a praia, banhar-se nas águas azuis do Atlântico Sul. Claro, passa também muito xaveco, muita gorda, muita magricela, mas quem for membro do SNP (Serviço Nacional de Paquera) e tiver um pouco de paciência vê passar cada certinha de fazer deputado largar Brasília.

Era assim a mocinha que vinha vindo. Ela caminhava pela Barão de Ipanema, no sentido contrário às outrora alvas areias de Copacabana. Tinha dado o seu mergulhinho, sem dúvida, e vinha com seus curtos cabelos pin­gando e a pele toda molhada e brilhante do óleo que pu­sera para se proteger do sol.

Eu disse que ela vinha caminhando? Besteira. Ela vi­nha era flutuando rente ao chão, balançando legal os seus pedaços mais encantadores. Uma sandalinha sumária, um pano colorido a que chamam "pareô" envolvendo-lhe a cintura, mas numa parte remota, a ponto de deixar-lhe o umbigo de fora e, daí pra cima, de atrapalhar a visão havia somente a parte superior do biquíni, um sutiã tão mixuruca que mais parecia uma gravatinha borboleta pregada ao busto. Trazia na mão direita uma cesta de palha com seus teréns de maquiagem e sob o braço esquerdo uma esteirinha enrolada.

E lá ia ela indiferente ao ronco dos homens que cru­zavam o seu caminho, até que chegou na esquina e parou no meio-fio, observando o trânsito. Foi aí que apareceu o padre. Para falar a verdade eu não vi de que lado veio o padre e vocês vão me perdoar o detalhe, mas é que, com aquilo tudo de mulher atravessando a rua, como é que eu ia observar padre, não é mesmo?

O que eu sei é que, de repente, ficaram os dois lado a lado. O Padre e a Moça. Eu até que me lembrei do poe­ma de Carlos Drummond de Andrade, sobre esse tema; poema que vem de ser transformado num belo filme com a Helena Inês. Só que, no poema, o padre fica encantado pela moça e, ali na esquina, o padre era velhusco e gordo e estava era indignado com a exposição dos encantos da moça. Seu olhar de censura envolveu a bonitinha de alto a baixo, parando nos olhos, no pescoço, nos ombros, no busto, no umbigo, enfim, parando por ali tudo. E não se limitou à inspeção o piedoso sacerdote. Da minha janela eu ouvi quando ele chamou a certinha de sem-vergonha:

— Isto é uma falta de pudor. Suas carnes serão quei­madas pelas chamas eternas do Inferno — ele gritou.

Ela reagiu. Encolheu-se um pouco, mas reagiu:

— O senhor não tem nada com isso.

— Engana-se — retrucou o padre. — Tenho sim. Todos nós temos — e olhou em volta, buscando parceirada, mas — pelo jeito — estava todo mundo contra. O padre resolveu dar-se ao trabalho da catequese. Já tinha gente às pam­pas. Ele pigarreou e lascou: — São moças sem pudor, rapa­zes sem os freios da educação, que estão botando o mun­do a perder.

E tome de blablablá. A moça, irritada com o ataque, titubeou um pouco no meio-fio e procurou abrir cami­nho para se mandar dali. Uma mulher mulata e barriguda tentou impedir, mas a mocinha tinha as suas mumunhas. Deu um empurrão na mulata e foi saindo. E o padre lá:

— É por isso que a mocidade de hoje conhece me­lhor o busto de Gina Lolobrigida ou Sofia Loren (o padre era um bocado cinematográfico) do que os bons princípi­os. Deve ter achado a imagem boa, porque repetiu:

— A mocidade conhece melhor o busto das atrizes do que os bons princípios.

A mocinha já ia lá longe, mas ainda assim tinha um advogado de defesa que, virando-se para o padre, ponde­rou:

— Seu padre, os bons princípios não têm decote e o busto das atrizes tem. Vai ver que é por isso.

Risada da turba ignara. O padre queimou-se. Saiu pi­sando duro, a turba foi se diluindo, em pouco tempo na esquina estavam a carrocinha de sorvete, a banca de jornaleiro, um ou outro passante.

De dentro da igreja vinha o som do órgão, suave, suave!

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Por: Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).

Fonte: FEBEAPÁ 1: primeiro festival de besteira que assola o país / Stanislaw Ponte Preta; prefácio e ilustração de Jaguar. — 12. ed. — Rio de Janeiro; Civilização Brasileira, 1996.
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terça-feira, 24 de maio de 2011

Inverno normal para Santa Catarina


A previsão para o trimestre junho, julho e agosto é de chuva entre normal e abaixo da média climatológica para Santa Catarina, de acordo com a Epagri/Ciram. Nas regiões oeste e meio oeste, nos meses de junho e julho, a previsão é de chuva abaixo da média lembrando que este já é um período que chove menos no estado.

Outro fator marcante para o trimestre é que a distribuição da chuva deve ser irregular no tempo e no espaço, e não se descarta a ocorrência de alguns períodos prolongados sem chuva.

A condição de temporal com ventania e granizo diminui no outono/inverno, mas eventos extremos podem ocorrer em qualquer época do ano, por vezes com acumulados significativos de chuva em curto espaço de tempo, por isso a importância do acompanhamento diário da previsão do tempo.

Fonte: Prefeitura Municipal de Itajaí - SC.
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segunda-feira, 23 de maio de 2011

Liberdade! Liberdade!

Andando nu pelo apartamento já gozava a sen­sação de liberdade tantas vezes sonhada. Entrou no ba­nheiro e meteu a mão dentro da banheira, sentindo a tem­peratura da água. Estava tépida, acariciante como espuma de sabonete em anúncio de televisão.

Fechou as torneiras e foi se enfiando na banheira devagarinho, prolongando o prazer. A água, por causa daquela lei de Arquimedes que muitos pensam chamar-se "Eureka", começou a transbor­dar e a molhar o chão.

Dane-se! Que tudo se molhasse à vontade; estava sozinho em sua casa, podia fazer o que quisesse.

Puxa vida! Solteiro outra vez!

Sorriu satisfeito e ficou olhando o próprio umbigo.

Onde estaria aquela chata agora? Bem... não teve tem­po de ir muito longe. Provavelmente na casa da mãe, aquela velha cretina. Laurinha, nas brigas que tiveram ao lon­go daqueles seis anos de casamento, sempre ia para a casa da mãe.

Pouco importava para onde tinha ido. Ah... esta ti­nha sido a briga definitiva. Enfim, só! O homem, quando casa, tem duas alegrias: na primeira noite, em companhia da mulher, quando murmura carinhoso "enfim, sós!", e na primeira noite depois que a mulher se mandou, quan­do murmura aliviado "enfim, só!".

Achou o pensamento um bocado filosófico e voltou a se interessar pelo umbigo, testemunha muda, constante e próxima de sua vida conjugai:

— Quanta chateação, hem, compadre? — perguntou ele ao umbigo, falando alto, assustando-se com o som da própria voz. Epa, assim, não! Falando sozinho iam pensar para que era maluco. Ora, mas não havia mais ninguém ali para achar qualquer coisa a seu respeito. Se houvesse alguém já tinha dado o teco. E lembrou-se que nunca demorava assim no banho como estava demorando agora, porque a voz esganiçada de Laurinha viria lá do corredor, pra chatear:

— Vai ficar morando no banheiro, vai?

De repente começou a fazer planos. Laurinha tinha se mandado de vez — isto era ponto pacífico. Arrumaria o apartamento a seu modo. Contrataria um mordomo; sem­pre achou o detalhe bacanérrimo. Um cara que cuidasse de suas roupas, seus compromissos sociais, que nem na­quele filme do Jack Lemmon, que o mordomo se interes­sa até pela comida que o patrão comia.

O umbigo estava estufado, olha só... andava comen­do demais. Também, com aquela vida chata que estava levando, emagrecer pra quê? Mas contrataria um cara pri­meiro time, desses que se orgulham de servir um patrão alinhado, como ele. Em primeiro lugar, mandaria fazer uns ternos novos, organizaria um barzinho na varanda, cheio de bossinhas, para receber os amigos. Os amigos e as amigas. Garotas bem desinibidas, indo à cozinha pre­parar canapés. Ia ser o máximo.

Saiu do banho e imaginou-se sendo enrolado, pela solicitude do mordomo, numa tremenda toalha felpuda de cores berrantes. Atravessou o corredor molhando o tapete. Azar o dele... e entrou no quarto. A cama poderia ser a mesma, com outro espaldar de cabeceira, madeira trabalhada, antigão... móvel antigão. O armário de Lauri­nha saindo dali, ia ficar espaço para uma escrivaninha legalzinha, com muitos objetos masculinos espalhados: ca­chimbo, binóculo, essas bossas.

Acabou de se enxugar e atirou a toalha em cima da cama. Num reflexo condicionado, já ia apanhar a toalha e pendurar, como fazia sempre, mas conteve-se. Precisava ir se acostumando a ser servido. Breve teria empregados para fazer as coisas chatas que Laurinha o obrigava a fa­zer.

Essa noite jantaria fora: num desses restaurantes so­fisticados. Talvez depois desse uma esticada pelos bares, flertar com uma grã-fina qualquer. Quem sabe, trazê-la até ali para... claro, era preciso começar vida nova. A vida que ele merecia.

Caminhou sorrindo para a sala e estava servindo um drinque, assobiando "These foolish things", quando a cam­painha tocou. Outra coisa que iria mudar: aquela campai­nha estridente, antipática, por uma dessas que fazem "bim bom".

Acabou de servir a bebida e fechou a garrafa de cris­tal. A campainha tocou outra vez. Caminhou tranqüilo para ver quem era. Laurinha, com voz choramingosa, de olhar baixo e toda encolhidinha, perguntou:

- Posso entrar, Neném?

É... quem nasce pra cavalo vai morrer pastando. Que entrasse logo. E pensou: - Pelo menos, durante as próxi­mas 24 horas, ela não será tão chata.
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Por: Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).

Fonte: FEBEAPÁ 1: primeiro festival de besteira que assola o país / Stanislaw Ponte Preta; prefácio e ilustração de Jaguar. — 12. ed. — Rio de Janeiro; Civilização Brasileira, 1996.
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