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segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A bruxa do Ribeirão da Ilha

Quando a ilha de Florianópolis era Desterro, as bruxas costumavam visitar os cemitérios, especialmente no interior e somente à noite.
No século XIX a ilha se revela calma e tranquila. Ilha de Santa Catarina de Alexandria, que preferiu morrer a deixar de lado suas crenças e convicções. Mas, naqueles tempos de uma capital serena e bem provinciana, vez por outra, fatos estranhos costumavam acontecer, parecendo agora que a modernidade acabou com eles.

Manoel, de apelido Bieli, é um pescador do Ribeirão, comunidade açoriana da parte sul da ilha. Tira do mar o sustento, ajudando o pai na pesca dos peixes dadivosos da baía, engastada entre o continente e os morros ilhéus. Usa da tarrafa para trazer à terra saborosos camarões, como também auxilia a família na beira do mar, principalmente as mulheres, na faina trabalhosa da catar berbigões. Pecador solteiro, na juventude de seus vinte e cinco anos, gosta de usar os domingos para esquecer o mar e tentar algum namoro com as moças casadoiras da freguesia.

Numa tarde de domingueira conheceu Nina, morena clara, baixinha, longos cabelos anelados, bem feita de formas, pernas roliças e firmes escondidas dentro do vestido de chita, que melhor se delineavam cada vez que se sentava no banquinho da praça, em frente à igrejinha de estilo português. Uma pequena berruga na testa, julgava Bieli, fazia com que ela parecesse mais bonita e interessante, adereço ilhéu tão comum naquela gente açoriana. Ele, num sábado, quando a missa da boquinha da noite terminava, se declarou a ela na escadaria de pedras irregulares e largas, passadiço que levava os fiéis à reza na igrejinha simples.

Ela o olhou com candura e declarou o seu sim, o que fez o venturoso Bieli catar estrelas ao invés de berbigões. Apesar do firmamento carregado de nuvens escuras, ele relembra aquela noite com emoção e afirma que as estrelas e meteoros nunca se fizeram tão brilhantes, um imaginário luar de contornos prateados e suaves.

E voltou ele ao mar na segunda, com vontade redobrada de mais peixes tirar da baía, já pensando em viver com a amada num ranchinho próprio.

Na outra semana, numa sexta-feira, ele vai com o amigo Édi, assim chamado por ser muito trabalhoso falar Edeclésio, para a região de Naufragados, no extremo meridional da ilha, em busca de peixes maiores que aumentam também a renda suada.

No meio da pesca o vento nordeste começa de mansinho, paa em seguida aumentar e não lhes permitir a volta. A frágil embarcação, movida a remo e verga de bambu, não conseguiria retornar ao ninho. Eles evitam a briga com o mar e se deixam levar à terra no sentido inverso, aportando bem perto da saída das águas para o mar do oceano. Estão em Naufragados, região erma e desabitada, de muitas histórias de tormentas e naufrágios.

Escondem a canoa e procuram abrigo. Por sorte, levaram pão e água, que faz enganar a fome. Os peixes eram poucos e a noite começava com um negrume maior que o normal. Eles se acomodam num canto de mato, pensando em ali passar a noite e voltar no outro dia costeando as margens da ilha, se o vento nordeste não arrefecer.

De repente. o Édi aponta na direção do sopé do morro. Vira ao longe uma luzinha bruxuleante que acendia e apagava. Bieli também divisa o estranho e fugidio vaga-lume, formado pelos açoites do vento na galharia. Resolvem se dirigir para lá. Talvez consigam uma refeição um pouco melhor, um calor de fogo que lhes retempere o ânimo. Perdem muito tempo andando, pois a escuridão é quase total.

Em determinado momento da caminhada começam a ouvir um canto. Um refrão repetitivo de vozes estridentes e femininas, palavras ininteligíveis e gargalhadas, talvez uma outra língua. Eles seguem adiante, já com certo medo. O clarão de fogo começa a aumemtar e melhor se delineia no escuro de uma noite sem lua e sem estrela.

E, como por encanto, abre-se uma clareira e eles, mudos, petrificados, amparados pelo negrume da noite, veem à sua frente um espetáculo dantesco. Na clareira, iluminada por uma grande fogueira no centro, estão a dançar umas vinte, talvez trinta mulheres encarquilhadas e horríveis. Vestem longas túnicas negras, grossas sobrancelhas e rostos angulados, narizes pontudos.

Apertam vassouras de mato nas mãos nodosas e de longas unhas, algumas de chapéu cônico, outras de coques que quase escondem o cabelo cor de galho seco, acinzentado. O vento nordeste sibila insistente, mas nada se remexe na clareira. Parece que ali o vento não entra.

Executam elas uma dança tétrica em torno do fogo. A roda que formam ora segue para um lado, ora para o outro. Ao lado do fogo, numa pedra lisa que mais parece uma mesa, com um tipo rústico de toalha feita com pequenos pedaços quadrados de tecidos das mais diversas cores, estão alguns objetos em metal e pedra, amuletos sinistros, dentre os quais se destacam um enorme novelo de corda e a estatueta de um abutre querendo alçar voo. Comentários havia em toda a ilha faceira a respeito desses horrores. Agora, porém, os dois pescadores adquirem a certeza de que naquele lugar de pesadelo há uma reunião de bruxas, talvez um sabá que tenha até a presença do Tibinga, o capeta ilhéu.

E elas continuam cantando sem cessar a estranha melodia, antes bem fraca e agora ensurdecedora, pontilhada de gritos e risadas macabras. Um caldeirão a exalar vapor ou fumaça assoma em seu aço de um negro brilhante, que uma delas remexe metodicamente. Pegam elas canecas de barro e provam do estranho preparado, que parece fazer com que voltem à roda com mais vontade e fervor, continuando o canto sibilante e histérico. Eles permanecem na treva, olhos arregalados, mudos e paralisados de pavor.

De repente uma delas pára o canto esganiçado, sai da roda, volta-se para eles e lhes aponta o longo dedo indicador. O ohar que despeja é terrível. Parece penetrá-los, possui-los, fazendo com que permaneçam quais estátuas de pedra e medo ante a terrífica medusa. Ela ri uma risada horrenda, o olhar penetrante lhes atravessa a alma. As outras, ao notar que a companheira parara, param também e se voltam na mesma direção. E os dois homens, apavorados, têm a fitá-los não um daqueles olhares terríveis, mas todos os olhares macabros do mundo.

Elas param a dança, as feições maléficas na direção da sombra, uma risada em coro que finalmente tem o condão de lhes despertar do torpor. Bieli e o amigo voltam a si e disparam em desabalada carreira na direção do mar, pois nas histórias de roda de fogo tinham ouvido dizer que as bruxas detestavam água.

Elas não os seguem e retornam ao canto, mas, para eles, todas as bruxas da terra estão ali atrás. Ao chegar à praia, fazem retornar a canoa à baía com todo desespero que as forças permitem. Arquejantes, lançam-se ao mar e passam uma noite diabólica, brigando com o vento e as ondas.

É de manhã quando aportam na freguesia. E contam para todos a aventura da véspera, sendo recebidos com o riso de muitos e a dúvida de poucos.

No domingo, Bieli encontra a sua Nina e lhe conta o ocorrido. Ela o ouve de olhos baixos, tranquila. Quando ele termina, estranha a placidez da amada.

Neste momento, ela levanta os olhos para ele e Bieli tem um frêmito de pavor. E sabe, com aterradora certeza, que já vira antes o olhar da namorada, o mesmo olhar da bruxa que primeiro descobrira os dois intrusos.

Desta vez não foge, pois sabe que não adiantaria. Já está inexoravelmente dominado. Ela pega a mão gelada do pescador e eles começam a passear em torno da praça.

Nina irá conduzi-lo pelo resto da vida.
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Da Série "Recordações Açorianas X".
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quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Cascaes e o imaginário popular

Franklin Cascaes nasceu a 16 de outubro de 1908 em Itaguaçu, município de São José (SC). Faleceu a 15 de março de 1983, em Florianópolis. No decorrer de sua vida expressou em forma de arte os estudos que realizou sobre a cultura açoriana na Ilha de Santa Catarina, seus aspetos folclóricos, culturais, suas lendas e superstições como se fora um ritual abstrato que atingisse a estrutura vital do mito.

E fê-lo soberbamente, já que da pesca da tainha a cerâmica,dos cantos aos engenhos de farinha e açúcar, aprofundou sobretudo o estudo que trata das lendas através de um desenho fantástico, cujo sentido mítico dimensiona uma criatividade genuína e profunda.

Para Cascaes mito é a possibilidade de primordial, a realidade inteligível que estabelece de modo único, numa pré-figuração do mistério que antecede a revelação. A força criativa de Cascaes encontra-se, ainda, na capacidade de sua imaginação, a ponto de acrescentar elementos atuais às lendas da Ilha de Santa Catarina.

Tinha uma personalidade muito forte e curiosa e isto pode ser percebido no seguinte agradecimento: "aos que me contaram estórias e histórias; aos que me acolheram com o valor cultural do calor humano; aos que me hostilizaram, a todos enfim o meu obrigado".

Retratos do imaginário popular

Cascaes retratou por meio da escrita, desenho, escultura e artesanato a Ilha do Desterro, com uma percepção apaixonada e sensível, capaz de captar, absorver e interpretar o que estava diante dos olhos e o que lhe chegava aos ouvidos. A vida do folclorista se confunde com a própria cultura das comunidades litorâneas catarinenses.

Desde criança circulava nos engenhos de farinha, ouvia histórias dos pescadores e confeccionava utilitários, como balaios e louças de barro. Foi descoberto pelo professor Cid Rocha Amaral, diretor da Escola de Aprendizes e Artífices de SC, aos 21 anos, esculpindo na praia de Itaguaçu. Os primeiros registros artísticos de Cascaes são de 1946, quando tinha 38 anos.

O saber fazer, procissões, pesca , lavoura, causos, folguedo, cantorias noturnas, religiosidade, brincadeiras, lendas, literatura oral, enfim, todo o fabulário popular da ilha fez parte do seu dia-a-dia e tornou-se objeto de pesquisa e estudo para o artista. Seus cadernos de anotação eram diários de campo, onde coletava desde receitas até crenças e rezas populares, subvertendo os modelos acadêmicos de pesquisa.

Diferentes aspectos da vida cotidiana do imigrante e seus descendentes, suas formas de organização social, subsistência, natureza e imaginário foram registrados. Cascaes queria divulgar a cultura açoriana para as próximas gerações e principalmente, para seus próprios protagonistas, chamados de "colonos anfíbios", por lidar com terra e mar.

O calendário cultural da cidade e o caráter religioso das manifestações populares criava um universo de sincretismo onde sagrado e profano conviviam. Tanto as festas de padroeiros quanto as rezas bravas pra afastar bruxas interessavam o folclorista. As histórias dos seres fantásticos presentes no folclore catarinense, como bruxas, lobisomem, vampiros e assombração, resultaram no realismo fantástico ilhéu. Logo, Florianópolis passou a ser conhecida como ilha de Cascaes, da magia ou das bruxas.

"Seu Francolino", como era carinhosamente chamado, passava temporadas imerso em comunidades de pescadores e pequenos agricultores ouvindo estórias, com um o interesse quase antropológico em desvendar a identidade daquela cultura. Depois de muitas anotações e desenhos em nanquim, organizava uma exposição com o que havia produzido sobre o cotidiano da comunidade, devolvendo para aquele espaço o que foi com ele compartilhado.

— Franklin Cascaes é um fenômeno , até hoje imcompreendido. Ele registrou o folclore vivaz e a alma da nossa gente. Tinha uma fala muito intensa com os trabalhadores e conhecia o calendário cultural das comunidades, onde tudo era feito com muita fé e alegria, cantorias e comilança. Foi criado nesse meio, era também um portador dessa cultura — comenta Gelci José Coelho, o Peninha, ex-diretor do Museu Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina(Ufsc) e maior pesquisador da vida e obra do artista.

Personagens do cenário insular, do manezinho às figuras políticas, foram moldados em argila. Pequenas esculturas de bruxas, reproduziam as descrições dos antigos moradores do interior. Essas histórias, causos e conhecimentos, que eram repassados de boca à boca, transformavam-se em arte.

O olhar atento de Franklin Cascaes teve uma importância política fundamental. O artista dedicou toda a vida para registrar as lendas, histórias e costumes, pressentindo angustiado a perda dos traços culturais das comunidades litorâneas, com os ventos da modernidade.

Um ambientalista precoce, na contramão da história

Quando ninguém falava de ecologia, Franklin Cascaes já tinha um discurso crítico, alertando para as consequências da modernização.

A partir de 1950, época em que a sociedade florianopolitana almejava a modernidade do Rio de Janeiro e São Paulo, Cascaes agiu na contramão da história. Além de resgatar as tradições seculares, estava atento às questões ambientais, que começavam a ser suplantadas com o "desmonte" da cidade.

— Enquanto as elites locais se deslumbravam com as mudanças que estavam chegando porque eram sinônimos de progresso, Cascaes as pensava de modo crítico, antecipando uma leitura de cunho ecológico, pois observava o impacto da especulação imobiliária não apenas na vida cultural local, mas também no meio ambiente— comenta a professora Aglair Maria Bernardo, na palestra proferida no Museu do Mar em comemoração ao centenário do artista.

Em um dos seu manuscritos ele afirma: "O progresso, senhor mui poderoso e soberano terráqueo, mandará tudo destruir sem técnica, dó, nem piedade, como já o fizeram os homens lá das outras bandas da Terra, das Oropas. Infelizmente não fui mau profeta como teria desejado sê-lo".

Cascaes denunciava as agressões ao meio ambiente em suas poesias, esculturas, desenhos e manuscritos, na ânsia pela preservação do patrimônio histórico e natural da cidade. Foi um visionário, por isso seu discurso permanece tão atual.

— A obra de Cascaes é uma referência fundamental para todos que reconhecem a singularidade do nosso lugar. Não é possível fazer uma ponte com o local sem beber na fonte do Franklin, o maior pesquisador da cultura popular do litoral de Santa Catarina — afirmou a produtora cultural e jornalista Bebel Orofino, que preside a Associação dos Amigos do Museu Universitário.

Qualquer leitura sobre as comunidades litorânea passam necessariamente pela produção de Cascaes, que cantou a sua aldeia e foi universal, fundindo o passado da cultura ilhoa com reflexões sobre o presente.


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terça-feira, 14 de junho de 2011

Mercado Público de Florianópolis

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O prédio que hoje abriga o Mercado Público da capital catarinense, foi construído em frente à Alfândega no ano de 1898, em substituição ao antigo mercado, o qual foi demolido em 1896 após 45 anos de funcionamento.

O antigo mercado teve sua origem em barracas e quitandas construídas pelo governo da Capitania de Santa Catarina, provavelmente no fim do século XVIII. Estas barracas e quitandas eram alugadas por pequenos comerciantes. O aluguel era recebido primeiramente pelo governo da capitania, e após a Independência do Brasil, pela governo da Província.

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O Mercado Público era o local onde os pequenos comerciantes da ilha de Santa Catarina, e litoral próximo (São José da Terra Firme e São Miguel da Terra Firme), vendiam peixe, carne de sol, feijão, arroz, mandioca, hortaliças, drogas do sertão, comidas preparadas na hora, dentre outros produtos.

As pessoas que vendiam produtos eram em sua maioria escravos de ganho, forros e brancos pobres. Os principais freqüentadores do comércio eram escravos, forros, marinheiros, militares, viajantes e a população local, em geral.

Em 1838, o governo da província autorizou a construção de uma Praça de Mercado, que deveria ficar entre as ruas Livramento e Ouvidor, em um local de terreno de marinha, fora do Largo da Matriz.

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Dois grupos políticos locais entraram em disputa pela escolha do local que o Mercado Público deveria ser construído. Por um lado, os grandes comerciantes locais queriam que as barracas continuassem no Largo da Matriz. O motivo era que a localização das barracas e quitandas atraia clientes para suas lojas, que ficavam na rua do comércio, atual Conselheiro Mafra. A maioria destes grandes comerciantes tinhas familiares em todas as irmandades religiosas encontradas na Ilha de Santa Catarina.

O outro grupo político era formado por pessoas que moravam em outros lugares da Ilha, de outras províncias, ou mesmo de outros países. Muitos pertenciam a loja maçônica Concórdia, e a Sociedade Patriótica, ambas fundadas por Jeronymo Coelho em Desterro. Estes desejavam instalar as barracas e quitandas fora do perímetro urbano, próximo a Ponte do Vinagre.

Em 1845, a visita de Dom Pedro II e do Bispo do Rio de Janeiro levou a Câmara de Desterro a aprovar a mudança de lugar das barracas e quitandas. O centro urbano foi higienizado, e as barraquinhas foram removidas para as proximidades do Largo Santa Bárbara, junto à Ponte do Vinagre, fora do perímetro urbano.

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Os grandes comerciantes desejavam que as barracas e quitandas voltassem para o Largo da Matriz, enquanto os maçônicos e a Sociedade Patriótica desejavam que continuassem perto da Ponte do Vinagre.

Esta disputa, por fim, deu origem ao Partido Conservador catarinense, dos grandes comerciantes locais, e o Partido Liberal catarinense, que pertencia principalmente aos maçônicos e aos grupos associados na Sociedade Patriótica.

Por fim, o primeiro prédio do Mercado Público foi construído em 1851, situava-se ao sul do Largo da Matriz, junto ao mar. Em 5 de fevereiro de 1899, o prédio foi transferido para a localização atual, na época também à beira-mar, possuindo apenas uma ala.

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A segunda ala só veio a ser entregue em 24 de janeiro de 1931, construída sobre um aterro, assim como as pontes de ligação e o vão central. O conjunto arquitetônico tem a sua configuração atual desde 1932, com a reinauguração da primeira ala. Atualmente, devido à construção de uma grande aterro na Baía Sul, o edíficio encontra-se longe do mar.

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Em 19 de agosto de 2005, uma fritadeira elétrica com óleo vegetal deu início à queima de toda a ala norte do Mercado Público de Florianópolis. Os bombeiros foram acionados e em cinco minutos estavam no local, mas não foi possível salvar a ala, que foi reformada por um consórcio entre a prefeitura e o governo do estado e está em uso novamente.

O mercado já havia sofrido um incêndio em 6 de junho de 1988, ocasionado por um vazamento de gás, durante um processo de reforma.
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Fontes: Wikipédia; Guia Floripa - Referências: CABRAL, Oswaldo R. História de Santa Catarina. 3ª ed, Florianópolis; Lunardelli, 1987; COELHO, Joaquim D´Almeida. Memória Histórica da Província de Santa Catarina. 2ª Ed., Desterro. Tipografia de J.J. Lopes, 1877; DIAS, Thiago Cancelier. Questão Religiosa Catarinense: as disputas pelos direito de instruir (1843-1864). Florianópolis; Dissertação (UFSC), 2008; LANER, Carla. Emanações Perniciosas Moralidade Corrosiva: Os desdobramentos do discurso científico no centro urbano de Nossa Senhora do Desterro. (1831-1864). Florianópolis; Dissertação (UFSC), 2006; MESQUITA, Ricardo Moreira de. Mercado: do Mané ao Turista. Ed. do autor, 2002; Piazza, Walter: Dicionário político catarinense. Florianópolis: Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina, 1994.
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sábado, 23 de abril de 2011

Os fantasmas de Anhatomirim

Florianópolis - O nome

Uma das dezenas de ilhotas ao redor da Ilha de Florianópolis, principal pólo turístico do sul do Brasil, esconde no cenário paradisíaco pintado com cores naturais pelo azul do mar e realçado pelas marcas irretocáveis do tempo uma história de fantasmas daquelas de arrepiar.

O palco principal é a Fortaleza de Santa Cruz. Nela ainda há quem escute o arrastar de correntes dos 185 homens fuzilados, degolados ou enforcados em abril de 1894 acusados de conspiração contra o presidente Floriano Peixoto no episódio que pôs fim à Revolta da Armada.

Os funcionários da Universidade Federal de Santa Catarina, que cuidam do lugar, são testemunhas. O zelador Amílton dos Santos, o "Nino", de 38 anos, já cansou de sair da cama para conferir sons que pareciam passos nos assoalhos. São doze anos de madeira rangendo, correntes sendo arrastadas - além do barulho das ondas que quebram no mar. O nome do lugar não ajuda em nada. Anhatomirim significa, em tupi-guarani, Pequena Ilha do Diabo.

"Algumas vezes os ruídos pareciam tão reais que tive certeza de que encontraria alguém, vivo ou morto", conta Nino. Sem desdenhar da possibilidade de Anhatomirim ser um lugar carregado - "Se eu disser que assombração não existe, elas podem aparecer só para provar o contrário" -, ele ensaia uma explicação racional. "A madeira pega sol durante o dia e trabalha à noite, estalando. E às vezes trabalha tanto que arrebenta os pregos enferrujados. Daí o barulho que lembra o de correntes sendo arrastadas."

A bem da verdade, os fantasmas de Anhatomirim estão mais vivos do que nunca na memória de uns tantos manezinhos da ilha - como são conhecidos os nascidos na parte da capital de Santa Catarina cercada por algumas das praias mais belas do litoral brasileiro e enfeitada pela Lagoa da Conceição.

Banidos da História

Só os turistas que lotam hotéis e pousadas não chegam a perceber a reação dos moradores ao nome da cidade. Anhatomirim virou atração depois que a Universidade Federal de Santa Catarina reformou os dez prédios que compõem a fortaleza erguida entre 1739 e 1744. Só no ano passado recebeu cerca de 100 mil visitantes - que chegam até ela de escuna, num passeio com duração de 40 minutos e parada para banho em alto-mar, por R$ 35,00 mais R$ 4,00 pela entrada na ilha. A maioria sai de lá sem saber da ligação entre o lugar e a origem do nome Florianópolis, pois os fuzilamentos e enforcamentos são citados apenas de passagem pelos guias turísticos.

Fortaleza na Ilha de Anhatomirim - Pórtico de Entrada - Fpolis.
No Mercado Público e nas rodas de dominó da Praça 15 de Novembro, no entanto, não é difícil encontrar quem se recuse a escrever ou até mesmo pronunciar a palavra maldita: "Florianópolis". Não vai tão longe assim o tempo em que essa resistência chegou a gerar movimentos articulados que pregavam um rebatismo. Ajudam a manter indelevelmente acesa a chama da mudança às lembranças da Chacina de Anhatomirim, uma história banida do ensino oficial, mas repassada de geração em geração há 110 anos.

Os fantasmas de hoje eram os rebelados de ontem. Faziam parte do grupo de revoltosos da Marinha que, nos turbulentos anos que se seguiram à Proclamação da República, se insurgiram contra o governo do Marechal de Ferro e tentaram tirá-lo do poder. Enquanto a revolta era combatida no Rio de Janeiro, seis navios sob comando dos rebeldes seguiram rumo ao Sul. No final de setembro de 1893, a Ilha do Desterro - primeiro nome dado ao acidente geográfico batizado de Ilha de Santa Catarina, que forma hoje, com a parte continental, a capital Florianópolis - foi invadida e declarada Capital Provisória da República.

Com apenas 20.000 habitantes, o lugarejo - que sequer tinha ligação com o continente, já que a primeira das três pontes do arquipélago seria inaugurada três décadas depois - não teve como resistir à invasão. Quando os navios República e Palas se aproximaram da ilha, a instauração do governo provisório foi simplesmente comunicada às autoridades locais e posta em prática sem violência. Três meses depois, o encouraçado Aquidaban, à época o maior navio da Marinha do Brasil, trazia o líder da revolta: Custódio de Melo.

Enquanto isso, o marechal Floriano Peixoto organizava uma nova frota, comprada às pressas no exterior e enviada a Ilha do Desterro, em abril de 1894, com quinhentos homens liderados pelo coronel Moreira César, para reconquistar a cidade. Levados a Anhatomirim, os prisioneiros passaram por humilhações e tortura antes de executados sem julgamento. Entre eles estavam dezenas de moradores acusados de colaborar com os revoltosos. Gente que fazia parte da elite social e intelectual da cidade - como o juiz Joaquim Lopes de Oliveira e o comerciante Caetano Nicolau de Moura - e militares - como o marechal Manoel de Almeida Gama d'Eça, o Barão do Batovi, um herói da Guerra do Paraguai.

Oportunismo e humilhação

A Ilha do Desterro foi, então, rebatizada por um desses oportunismos políticos. O deputado Genuíno Vidal propôs, em outubro de 1894, que a vitória do presidente fosse eternizada com a troca do nome da cidade para Florianópolis. Com o marechal ainda no poder, ninguém se atreveu a contestar a idéia. Só dois anos depois, quando os jornais de oposição voltaram a circular, foram registrados os primeiros protestos. Em editorial na edição de 3 de julho de 1896, o jornal "O Estado" deu o tom: "O tal nome, semelhante a um escarro cuspido em nossa capital, bateu na lâmina limpa de sua cútis, escorreu para baixo e veio emporcalhar aquele que o cuspira."

Florianópolis virou uma humilhação. Não foi por outra que, há uma década, o movimento Cem Anos de Humilhação reuniu historiadores, advogados e jornalistas em defesa da substituição do nome. A articulação esbarrou na Lei Orgânica do Município, que estabelece que isso só pode ser feito por plebiscito convocado pela Câmara de Vereadores.

Como o nome original, Desterro, poderia espantar os turistas, o movimento admitia algumas alternativas. Ilha de Santa Catarina, Ondina, por sugestão do poeta Virgílio Várzea, Meiembipe, nome dado à ilha pelos índios carijós e que significa Montanha Dentro do Mar e, até mesmo, a oficialização do apelido Floripa, que para muitos seria suficiente para desvincular a imagem da cidade da de Floriano Peixoto.

A proposta de submeter à população a escolha de um novo nome para a capital catarinense conquistou a simpatia de uns poucos vereadores dos partidos de esquerda, mas não seguiu adiante na Câmara de Vereadores. Quatro anos antes, a vereadora Jalila El-Achkar, do Partido Verde (PV), teve uma decepção ainda maior ao apresentar o mesmo projeto: nenhum colega a apoiou.

"O assunto foi tratado com desdém, como uma idéia exótica de uma vereadora de um partido exótico", lembra Jalila, hoje dona de uma imobiliária. "A troca do nome só será possível quando a população realmente desejá-la, mas enquanto a história da chacina de Anhatomirim não for contada de verdade nas escolas não haverá a menor chance."

Os fantasmas do general

Os maiores críticos da proposta de trocar o nome da cidade são os empresários ligados ao turismo. "Mesmo que Floriano Peixoto tenha sido um sanguinário, não se pode abrir mão de uma grife conhecida no

mundo inteiro em função do que ocorreu há mais de cem anos. Isso traria enormes prejuízos à cidade", diz o presidente da seção catarinense da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis, João Eduardo Amaral Moritz. Mesmo os que sabem da Chacina de Anhatomirim acham que o prazo de validade do revanchismo já está vencido.

A antigüidade do nome é um argumento usado com freqüência para defendê-lo, mas quem prega a substituição lembra que a denominação anterior tinha mais de dois séculos. Desterro era uma simplificação de Nossa Senhora do Desterro, escolhida para padroeira da povoação fundada pelo bandeirante paulista Francisco Dias Velho em 1675.

O desterro de Nossa Senhora deu-se quando Herodes decretou a morte de todas as crianças com menos de dois anos e Maria fugiu para o Egito para salvar Jesus. Na campanha pela adoção da homenagem a Floriano, Genuíno Vidal afirmava equivocadamente que o nome Desterro se originara do fato de a ilha ter sido usada como prisão para criminosos portugueses.

Pelo menos um companheiro de farda do marechal sentiu a reação dos manezinhos toda vez que seu nome é evocado. Foi o inesquecível presidente João Figueiredo. Em meio a uma campanha de popularização do último governo militar, ele resolveu visitar a ilha em novembro de 1979 para inaugurar uma placa em homenagem a Floriano Peixoto na Praça 15 de Novembro. Pra quê?

Depois de apedrejar o palácio do governo estadual e atacar os carros oficiais, estudantes conseguiram arrancar a placa e queimá-la no meio da praça. De quebra, provocaram uma das reações mais bizarras da história republicana brasileira.

Conhecido pelo destempero emocional, Figueiredo reagiu às provocações, trocou desaforos com os estudantes e quis partir para a briga no corpo-a-corpo. Teve de ser contido pelos seguranças. Dizem que o vexame foi coisa dos fantasmas de Anhatomirim.
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Fonte: "A mudança de nome da capital, de Nossa Senhora do Desterro para Florianópolis" - Mensagem original de: Dom Paulo [mailto:jairpaulo@terra.com.br] - Enviada em: sexta-feira, 21 de janeiro de 2005 00:01 - Para: Gen Santa Catarina; Origens; GenealBR - Assunto: [GBr] Historia que não ensinam na escola - site: http://sites.google.com/site/monarquiasempre/historia-do-brasil/historia-do-brasil---o-inicio-da-republica-em-santa-catarina/a-mudanca-de-nome-da-capital-de-nossa-senhora-do-desterro-para-florianopolis
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quinta-feira, 21 de abril de 2011

Requisitos para ser um manezinho da Ilha

Manezinho da Ilha – Em tempos idos era uma designação pejorativa. Hoje define quem nasceu ou vive na Ilha de Santa Catarina e se identifica com as suas belezas naturais, tradições, peculiaridades e com a maneira de ser de seu povo: jocoso, gozador, nostálgico e contemplativo (afinal, são duas baías para se contemplar todos os dias).

Para ser um verdadeiro Mané tu precisas preencher, pelo menos, 80% dos requisitos abaixo enumerados, caso contrário não adianta receber troféu de Mané e nem freqüentar o Mercado Público todos os dias por cinco anos seguidos, muito menos, morar no Ribeirão da Ilha e se esforçar para falar com sotaque manezês.

Para ser um autêntico Mané tu precisas, ô istepô:

01) Antes de qualquer coisa, ter nascido na Ilha de Santa Catarina, seja na Carmela Dutra, na Carlos Correia ou mesmo de parteira, ou no continente (leia-se Estreito, ou em puro manezês Streitcho). Não adianta vir com essa história que nasceu fora e veio morar aqui pequenininho;

02) Falar manezês fluente, tão rápido que deixa o cristão que te ouve meio tanso

03) Falar 60% das palavras no diminutivo (Vash querê um cafezinho com pãozinho ou com bolinho de chuva?);

04) Gostar do cheiro das bancas de peixe do Mercado Público. Nada de tapar o nariz pra comprar camarão;

05) Ter assistido um Avaí e Figueirense no Adolfo Konder e, de preferência, ter fugido com a bola quando essa era chutada pra fora do campo;

06) Ter, pelo menos uma vez na vida, subido a Avenida Tico-Tico (Rua Clemente Rôvere);

07) Ter ajudado a fazer ou ter dançado no boi de mamão;

08) Ter participado da farra do boi ou, pelo menos, ter fugido em carreira, todo borrado com medo do pobre animal;

09) Ter se vestido de mascarado e corrido atrás das raparigas nas noites de verão;

10) Ter tomado banho na Lagoa da Conceição sem medo de pegar pereba;

11) Ter comprado empadinha na Confeitaria Chiquinho;

12) Ter tomado picolé de coco ou sorvete de butiá nas sorveterias Satélite ou Ilhabela;

13) Ter saído em bloco de sujo no carnaval, vestido de mulher e continuar gostando de rapariga;

14) Ter guardado no rancho: caniço, tarrafa, puçá, coca, jereré e pomboca ("Prá mó di pega uns sirizinho, uns camarãozinho, uns peixinho...");

15) Ter comprado na Venda: bala azedinha; pé de moleque; quebra-queixo; Maria mole, pirulito açucarado em forma de peixe, Bala Rococo, Tablete Dalva, Guaraná Pureza ou refresco da Max William.

16) Acreditar em bruxas e ter ouvido pelo menos uma história de Franklin Cascaes;

17) Ter assistido na TV Cultura um filme na Poltrona 6 e, para as senhoras, o programa Celso e a Sociedade (a Metralhadora Platinada);

18) Entender tudo o que o Miguel Livramento fala;

19) Não aceitar nada do que o Paulo Brito diz;

20) Tentar descobrir para qual time da Capital o Roberto Alves torce e não acreditar naquela história de que ele ainda é torcedor do Paula Ramos;

21) Ter ouvido o programa do Jorge Salum e ter tentado ganhar uma caixa de maçãs respondendo perguntas sobre conhecimentos gerais;

22) Sentir enorme prazer ao comer uma boa posta de tainha frita, com "pirão de nailo", ou então, aquele berbigãozinho ensopadinho derramado sobre um pirãozinho de feijão;

23) Ter curtido um baile de carnaval no Lira, no LIC, no Doze ou no Limoense;

24) Ter assistido desfile de escola de samba e de carro alegórico ao redor da Praça XV;

25) Ter participado de alguma turma da cidade (do muro da Mauro Ramos, do Quiosque, da Marquise etc);

26) Ter dado um tapa na orelha do César Cals na Novembrada e ter chamado o General Figueiredo de .... (Tu sabes o que);

27) Defender a mudança do nome da Cidade para Nossa Senhora do Desterro;

28) Ter passado pela Ponte Hercílio Luz e não entender a incompetência de nossos governantes que até agora não conseguiram recupera-la;

29) Ficar horas no Ponto Chic, tomando cafezinho e discutindo sobre política, futebol e mulher (não obrigatoriamente nessa ordem);

30) Ser Figueirense e secar o Avaí;

31) Ser Avaí e secar o Figueirense;

32) Falar mal de qualquer árbitro que apite um Clássico;

33) Ter andado em ônibus da Taner ou da Trindadense;

34) Ter ouvido a Neide Maria Rosa no "Amarelinho";

35) Ter comprado um bilhete de loteria federal da Lurdes (com redinha na cabeça e tudo);

36) Ter chorado a morte do Zininho e do Aldírio;

37) Ter conhecido o Bataclan;

38) Ter ouvido as histórias do Capa Preta;

39) Ter ouvido previsões do A. Seixas Neto;

40) Ter freqüentado, ou apenas conhecido, o Miramar e lamentar, profundamente, a burrice daqueles que permitiram a demolição de um dos principais marcos culturais na nossa cidade;

41) Ter entrado como "piru de fora" em festa de 15 anos, baile de debutante ou casamento de "granfino";

42) Ter comprado na Modelar, no Ponto 75, na Grutinha (êta nome sugestivo); nas Casas Coelho; na A Capital; nas Casas Macedônia; no Beco; no Saco e Cuecão; na Aki Calças e Aki Camisas e, é lógico, na Miscelânia, que era o paraíso da criançada.

43) Ter assistido, na sessão vespertina, a um filme no Roxy, no São José, no Ritz, no Glória, no Jalisco, no Carlitos ou no Cecontur;

44) Ter assistido peça teatral no Álvaro de Carvalho;

45) Ter visto carnaval com o Rei Momo Lagartixa;

46) Ter "melado a cueca" na boate do Doze, do Lira, na Dizzy etc;

47) Ter dado "uma sarradinha" de madrugada no "Kuxixos";

48) Ter ido a um baile de formatura no Clube do Penhasco;

49) Ter ouvido muitas histórias dos bailes no Clube Quinze;

50) Ter visto a procissão do Senhor dos Passos descer a Rua Menino Deus;

51) Se emocionar ao ouvir o Rancho de Amor à Ilha e cantar baixinho como se fosse uma oração;

52) Reverenciar todas as manhãs a Figueira da Praça XV e ter nela o marco inicial do amor que temos por nossa terra;

53) Adorar vento sul;

54) Amar o verão, pegar tainha no inverno, ver Garapuvu florido e rezar a Nossa Senhora do Desterro pedindo proteção para que o progresso desordenado não destrua nossos últimos valores.

Fonte: FloripAventura - Pequeno dicionário Ilheu
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