terça-feira, 18 de setembro de 2012

O cafajeste não viaja

Qualquer um pode viajar, menos o brasileiro. O inglês pode ir para a China e jamais será mandarim. Do mesmo modo, a inglesa. Uma inglesa, em Tóquio, não será jamais uma madame Butterfly. E assim o francês, ou o alemão, ou a alemã. Ao passo que o brasileiro, a partir do Méier, começa a usar os sotaques do seu itinerário turístico. E, por vezes, não é preciso nem a viagem. Basta um telegrama.

Recentemente, os estudantes franceses fizeram uma singular revolução francesa. Tudo consistia em arrancar paralelepípedos e virar carros. Foi talvez a primeira revolução feita sem uma única idéia. Os jovens arrancavam os paralelepípedos, viravam os carros e nada mais. Exatamente: — nada mais.

E houve um momento em que o poder ficou vago. A história pensou: — "Vem por aí um novo De Gaulle". E o velho De Gaulle não moveu uma palha, não tirou uma cadeira do lugar. O poder estava lá, nas alegres barbas da "jovem revolução" e repito: — o poder oferecia-se como um fruto maduro, próximo e indefeso. Bastava o simples gesto de colhê-lo. E ninguém fez esse gesto. Nem estudantes, nem socialistas, nem comunistas, nem intelectuais, nem operários. Ninguém.

Um conhecido meu abria os braços e perguntava: — "Mas como? Uma potência espiritual, como a França, não tinha ninguém?". Era a humilhante verdade: — ninguém. Ou por outra: — tinha o velho De Gaulle e só De Gaulle. E, portanto, foi o Herói que, com o seu tédio sardônico, ficou com o poder não possuído por ninguém.

Mas não era isso que eu queria dizer. O que eu queria dizer é que os nossos jovens se embebiam das notícias de Paris. Vejam vocês: — é possível, pelo telégrafo, mudar as nossas idéias, sentimentos, valores.

E, então, começou aqui uma efervescência feroz. Também carros virados. Ninguém arrancou os paralelepípedos, porque somos uma cidade asfaltada.

Fez-se uma "jovem revolução" liderada por telegramas. Pode-se dizer que tudo era apócrifo. Aqui, ninguém teve um gesto próprio, uma fúria autêntica, um palavrão original e profundo.

Imaginem agora o brasileiro que sai de sua rua, de sua paisagem, de sua cidade e de seu idioma. Como reagirá ele, em Paris, Londres, Berlim ou Nova York? Está lá submetido a pressões insuportáveis.

Bem me lembro do meu amigo Otto Lara Resende. Passou dois anos na Europa. E, quando voltou, era outro Otto. Fomos passear em Ipanema. Diante do poente do Leblon, inaugurou ele uma de suas frases máximas: — "Paisagem é verba!".

Insinuei que o nosso poente não faz vergonha. Mas ele insistiu: — "Poente é verba!".

E, mais uma vez, verifiquei que raríssimos brasileiros podem viajar além de Bangu.

O outro caso. Há três ou quatro meses, o meu amigo Carlos Heitor Cony bateu-me o telefone:

— "Nelson, vim me despedir". Como seu tom era meio lúgubre, ainda brinquei: — "Vais te matar?". Respondeu: — "Ainda não. Vou viajar". Protestei: — "Não faça isso".

Conversamos uma meia hora. Insistia eu: — "O brasileiro que viaja volta mais burro". Jurei: — "Não conheço um brasileiro que não voltasse mais burro". Ele resistiu até o fim: — "Você exagera. Não é nada disso". Quanta coisa ouviu o Cony de mim! Cheguei a dizer-lhe que ele precisava ser o cafajeste total. Não exagerava. De fato, um maravilhoso cafajeste está inserido nele, está enterrado nele como um sapo de macumba. E o cafajeste não viaja.

O pior é que a viagem ia ser imensa. Passaria por Berlim, Paris, Moscou, Londres e, até, Pólo Norte. Imaginei que voltaria um ex-Cony, um anti-Cony. E me preocupava também o destino do seu riso. O meu amigo tem uma gargalhada absurda. Sim, ele ri como os antigos sátiros vadios. Imaginei que a viagem pudesse emudecer-lhe o riso.

E o Cony partiu. Três meses de ausência densa, cruel, desesperadora como a morte.

Outro dia, paro num sinal fechado. Estou em cima do meio-fio, esperando, quando um automóvel encosta e alguém anuncia: — "O Cony chegou! O Cony chegou!".

Pouco depois, entro na redação e ligo para o amigo. Ia perguntar-lhe: — "Como é? Ficaste mais burro?". Mas não estava. Deixei o meu nome. E esperei em vão que me telefonasse. Nada. No dia seguinte, ligo outra vez. Também não estava. Liguei outras vezes. Nunca estava. Ele, aqui, a dois passos, parecia longínquo como se ainda existisse entre nós dois a distância que vai de Ipanema ao Pólo, do Castelinho a Cingapura.

Sou um pessimista e logo imaginei: — "É outro Hélio Pellegrino".

Já falei do abismo ideológico que se cavou entre mim e o Hélio. Tenho escrito sobre passeatas, d. Hélder e dr. Alceu. Em confissões sucessivas, acusei as esquerdas de uma alienação monstruosa etc. etc. O Hélio não gostou. Dizia-me com a sua bela voz de Paul Robeson branco: — "Não é o momento! Não é o momento!". Enquanto o Hélio falava assim, em arroubos, eu pensava nos meus mortos e nos meus vivos; sofri demais por uns e por outros. Ferido como estou, não ouso trapacear comigo mesmo e com os demais. Digo o que sinto e o que penso. Apenas.

Todavia, na véspera dos meus anos, o Hélio ligou para mim. Ninguém mais doce: — "Pode dizer nos seus artigos que você é dos meus amigos fundamentais". Dias antes, de público, eu o desafiara a jantar comigo no meu aniversário. E o Hélio explicava: — "Mas não posso jantar contigo amanhã, porque vou sair do Rio". Era o décimo encontro que ele adiava. Jurou, porém: — "Janto contigo na semana que vem". Isso foi no dia seguinte. Não me concedeu um mísero telefonema. Se eu fosse esperar por ele, e seu prodigioso jantar, estaria morto de fome.

E já me parecia que, como o bom Hélio Pellegrino, o Cony fugisse de mim. Não queria, decerto, conspurcar-se com o meu "oba" ou com o meu aperto de mão. Pois bem. Até que há o temido encontro.

A coisa ocorreu no Museu da Imagem e do Som. Ele ia depor sobre a figura e a obra de Mário Filho. Assim que o vi, e ele me viu, houve o suspense de um ou dois segundos. Em seguida, veio o abraço desesperado, o riso violento e recíproco e a certeza de que éramos amigos para sempre. Disse-me Cony: — "Recebi o teu recado. Mas não telefonei, de propósito. Não queria ver ninguém. Por enquanto, não".

Foi aí que eu reparei: — era um outro Cony que estava na minha frente, talvez mais atormentado e talvez mais puro. Sim, um Cony trabalhado pela solidão, um Cony de uma outra densidade. Perguntei, aflito: — "E a viagem? E a viagem?". Varara o mundo e fora até ao Pólo Norte. E eu: — "Que tal? Que tal?".

Respondeu sério, cruel: — "Tudo a mesma coisa! Tudo a mesma coisa!". Vira a Vênus de Milo: — "Tem erisipela". E da Gioconda: — "Tem mau hálito". "O Louvre, uma impostura." Estava triste e exausto de tudo o que vira. Passara na Rússia, na França, na Inglaterra, na Tchecoslováquia.

E, por fim, fez um resumo desesperado de tudo: — "O homem fracassou".

[18/9/1968]
______________________________________________________________________
A Cabra Vadia: novas confissões / Nelson Rodrigues; seleção de Ruy Castro. — São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

Os dois namorados

Há coisas que um grã-fino só confessa num terreno baldio, à luz de archotes, e na presença apenas de uma cabra vadia.

Lembro-me de uma festa na casa não sei de quem (só sei que era grã-fino). Na altura das três da manhã, o dono da casa põe mais gelo no uísque e diz: — "Na minha casa só as criadas vêem televisão". Os circunstantes concordaram em que a televisão é uma ignomínia.

E, no entanto, vejam vocês: — o anfitrião estava bêbedo da cabeça aos sapatos. Mas o grã-fino preserva, ainda no pileque, uma série de poses fundamentais. Uma delas é o falso desprezo pela TV e seus programas. Disse eu que o grã-fino só diz certas coisas num terreno baldio etc. etc. Já retifico. Nem no terreno baldio. Ele só dirá que gosta de televisão ao médium, depois de morto.

É, repito, uma pose. Na verdade, o meu anfitrião não perdia uma da Dercy, uma do Chacrinha, uma do Raul Longras. Quanto a mim, sou franco: — não preciso do terreno baldio, nem do médium. O fato de ser apenas um pequeno-burguês, sem nenhum laivo de grã-finismo, dá-me descaro bastante para confessar, aos quatro ventos: — vejo televisão e, pior, gosto de televisão.

Dirá um intelectual ou um grã-fino: — "Mas, e o nível? O nível?".

Ao que eu responderia, com a mais límpida e casta objetividade, que o tal nível, que se atribui às nossas TVs, é muito relativo. Acusamos o nível das emissoras e ninguém fala do nosso. Há uma reciprocidade de níveis. A televisão é assim porque o telespectador também o é. Uma coisa depende da outra e as duas se justificam e se absolvem.

Muitos abominam o Chacrinha e adoram d. Hélder. E há coisas que d. Hélder faz e que o Chacrinha jamais ousou.

Por exemplo: — um dia, abro O Jornal e vejo na seção "Eles disseram" algumas declarações do grande arcebispo. Dizia ele, em resumo, que era perfeitamente legítima a "missa ao som de cuíca, tamborim, reco-reco", etc. etc. Um católico e, ainda mais, um sacerdote propunha a "missa de gafieira". Portanto, é lícito dizer-se que certas posições de d. Hélder estão abaixo do nível do Chacrinha. Mas falo, falo, e esqueci o meu assunto.

Vou falar, hoje, do padre Ávila. (Se não me engano, é da PUC). Mas, vejam vocês: — o nosso Ávila, além de ser padre, é sociólogo. Há um ano, um ano e pouco, estava eu assistindo a um programa de TV. E eis que aparece quem? Justamente o padre-sociólogo.

É um sociólogo que está radiante de o ser. E ele não diz um "oba" sem lhe pingar sociologia. No programa referido discorreu, exatamente, sobre o jovem. Que dizia o padre e que dizia o sociólogo? Não me lembro textualmente de suas palavras. Mas o padre Ávila começou dizendo, se não me engano, que "os tempos estão duros".

Até aí concordei. De fato, acontecem coisas, em nossa época, que desafiam toda a nossa experiência e todo o nosso raciocínio. E, a propósito do jovem, ele referiu um episódio muito curioso. Certo rapaz cometeu, contra um amigo, um ato de extrema vileza. Pouco depois, o padre Ávila conversou com o culpado. Perguntou-lhe: — "Você não acha que foi uma deslealdade com o seu amigo?". O rapaz, mascando goma, saiu-se com esta: — "E é preciso ser leal?".

O padre não se espantou. Um sociólogo não se espanta. Se lhe servirem, no jantar, um ensopadinho de abóbora com ratazana, ele não concederá ao fato um único e reles ponto de exclamação.

Pois bem. Até aquele momento não entendera o gesto do jovem. E transmitiu ao telespectador a sua perplexidade. Nem o entrevistado, nem o público perceberam o óbvio ululante. Quem se escondia, ou por outra, quem não se escondia por trás do ato vil era um velho conhecido nosso — o pulha.

Mas, pergunto: — por que o nosso Ávila não reconheceu a vileza como tal?

É sacerdote e, ao mesmo tempo, um sábio e, ao mesmo tempo, um professor e, ao mesmo tempo, um sociólogo. E não sabe que a infâmia é infâmia, que a indignidade é indignidade, que o cinismo é cinismo. Diante da evidência espetacular, faz-se de cego. E o padre Ávila não será o único.

Há milhares, há milhões de ávilas. Por toda parte, e a começar na família, só esbarramos e só tropeçamos em ávilas de ambos os sexos. Os pais são ávilas, as mães são ávilas, e as tias, e as cunhadas. Todos são ávilas sem batina, sem sociologia etc. etc. Também nas escolas, nas universidades, nos escritórios, nas redações os ávilas são a maioria, quase a unanimidade.

O dr. Alceu fala, sem rebuços, na razão da idade. É um ávila. E como existem alceus e ávilas em todos os idiomas, ninguém julga o jovem, Não ocorre a ninguém que o jovem pode ser um santo, um herói, um justo e, também, um canalha. É um crime dar-lhe uma razão absoluta, isto é, dar razão a quem não a tem. E assim se criou uma figura sinistra, difusa, irresponsável, que ninguém ousaria julgar.

Realmente, o jovem está diante de nós sagrado, intangível.

Um coroinha julga o papa. O padre de passeata condena 2 mil anos de cristianismo. Todos os valores são questionados, refutados. Só ao jovem tudo é permitido. Há coisas, porém, que justificam a nossa desesperada meditação. Quero falar de um fato concreto.

Para evitar que se identifiquem as vítimas, não direi nem quando, nem onde ocorreu. Foi numa universidade que o leitor não saberá se daqui, de São Paulo, Brasília ou Belo Horizonte. Imaginem um casal de namorados de menos de vinte anos, estudantes e católicos. Um dia, o rapaz e a menina são cercados por um bando de colegas marxistas (digamos, marxistas de galinheiro). O que estes exigem dos namorados é um atestado de ideologia.

Para não tomar o tempo do leitor, direi que o primeiro a ser agredido, por uns oito ou dez, foi o rapaz. A namorada, na sua desesperada fragilidade, quis socorrê-lo. Foi logo agarrada, imobilizada. Apanhou na boca. E quase mataram o namorado, a socos, pontapés, chutes. Já sem sentidos, levou o último pé na cara. Mas não foi tudo. Lá estava o rapaz, quase morto. E, então, os outros arrastaram a menina. Também a socos, a patadas. Ah, eu sei que tudo se publica.

Mas o que fizeram com a adolescente não pode ser impresso em idioma nenhum. Muito tempo depois, alguém descobriu os namorados, ainda desmaiados. Uma ambulância, ou táxi, sei lá, os levou. O crime não mereceu nenhuma imprensa e explico: — os bandidos tinham a razão da idade. O jovem estupro, por ser jovem, está acima do bem e do mal.

Mas há de chegar um dia em que a juventude será julgada.
[19/9/1968]
______________________________________________________________________
A Cabra Vadia: novas confissões / Nelson Rodrigues; seleção de Ruy Castro. — São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

O abacate tira a barriga

O abacate é rico em gordura e, consequentemente, tem muitas calorias (160 em 100 gramas). Por isso nem pense em exagerar. Você deve, sim, incluí-lo no cardápio com frequência e em doses moderadas, sozinho ou em receitas leves. Esse é o segredo para ajudar a secar a barriga - poder que vem (adivinha!) da gordura, segundo estudo da faculdade de medicina da Universidade Harvard.

Formada basicamente de ácido oleico (a mesma substância anti-inflamatória do azeite de oliva), a gordura do abacate reduz o risco de síndrome metabólica - desordem no metabolismo capaz de desencadear diabetes e ganho de peso.

Redutor de cortisol

Outro componente da fruta que favorece o emagrecimento é a glutationa. "Essa substância, presente naturalmente no organismo, é reforçada pelo o abacate. Resultado: maior controle nos níveis de cortisol, o hormônio do stress que, em excesso no organismo, dificulta a perda de peso", explica Daniela Jobst, nutricionista da Nutrijobst, em São Paulo.

Pior: faz você acumular gordura especialmente na barriga. A glutationa ainda tem ação detox - ou seja, contribui com o fígado na eliminação das toxinas.

Bloqueador de inflamação

Mais uma substância do fruto do abacateiro, o beta-sitosterol age como um anti-inflamatório, fazendo com que as células do organismo exerçam melhor suas funções. Isso não só facilita a dieta como diminui o aparecimento de rugas precoces e celulite. A pele também fica mais bonita porque o abacate tem substâncias antioxidantes como as vitaminas A, C e E.

Inibidor de apetite

A gordura da fruta ainda aumenta a sensação de saciedade e adia a fome. Para obter esse efeito (lembre-se!), basta uma porção moderada - uma fatia fina na salada, por exemplo. Quando você acrescenta o abacate na refeição tem mais uma vantagem: aumenta a absorção do licopeno, famoso antioxidante presente principalmente no tomate. E quanto mais suprir seu organismo dessas substâncias, mais fácil aparece o resultado da dieta - e mais chapada fica a barriga!

Fonte: Boa Forma/ M de Mulher (Texto: Marcia Di Domenico, Nádia Tamanaha e Eliane Contreras).